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Troféu Valkirias de Melhores do Ano: TV

Nunca ficamos tanto tempo dentro de casa — e nunca precisamos tanto viajar para outros mundos, metaforicamente falando, quanto em 2020. Nunca se acessou tanto os serviços de streaming e é graças a eles que conseguimos desligar a mente dos problemas por um tempo, viajando para galáxias muito distantes, torneios de xadrez, mundos distópicos ou simplesmente para um mundo pré-pandemia, ainda que dê um pouco de calafrios ver personagens se aglomerando em festas, trocando beijos e andando por aí sem máscara e álcool em gel a tiracolo. No Troféu Valkirias de Melhores do Ano na categoria TV, temos episódios para todo o tipo de telespectador. Vem com a gente!

3% (Quarta Temporada), Netflix

Por Fernanda

Primeira série original brasileira da Netflix, 3% chegou ao fim em sua quarta temporada em agosto desse ano como uma série muito mais interessante do que era quando começou. Se a primeira temporada se parece muito como uma espécie de Jogos Vorazes tupiniquim, ainda que seu pano de fundo calcado em desigualdade econômica e social extrema falem muito diretamente com a nossa realidade, com o passar dos anos a narrativa criada por Pedro Aguilera foi se tornando muito mais envolvente, fechando seu ciclo muitíssimo bem e sem se estender além da conta. Depois de uma primeira temporada que introduziu o Processo, de uma segunda temporada que explorou as absurdas diferenças entre a vida no Maralto e no Continente e de uma terceira temporada que trabalhou a ideia de um terceiro espaço com a Concha fundada por Michele (Bianca Comparato), que funciona como via alternativa por algum tempo, a quarta temporada trouxe o esperado clímax numa narrativa calcada na premissa de que a 3% da população tudo é dado, enquanto os outros 97% são abandonados à própria sorte: a busca por implodir o sistema de uma vez por todas.

3%, que como toda narrativa de traços distópicos extrapola tendências contemporâneas, refletindo de forma distorcida nossa própria realidade, acompanhou o pano de fundo cada vez mais conturbado que vive o Brasil desde 2016 — e a terceira temporada deixa especialmente evidentes os paralelos com o lado de cá — ainda que a série não carregue, para além da trilha sonora, muitas marcas que a identifiquem como particularmente brasileira por conta do cenário de futuro imaginado. Pensando nos tempos em que vivemos, é muito significativo que a série busque reafirmar até o fim que a esperança é possível, importante e acima de tudo necessária, ainda que não seja simples ou fácil. Embora seja Michele — que começa a trama como membro da Causa em busca vingança contra o condutor do Processo — a protagonista da série, é de Joana (Vaneza Oliveira) o arco mais bonito, indo do não envolvimento à decepção com os métodos da Causa ao cinismo renovado e, enfim, à convicção nos próprios ideais que a tornam uma importante agente de transformação. Talvez um mundo melhor não seja possível, mas ele definitivamente nunca será possível sem o nosso envolvimento. Que belo exemplo nos dão 3% e Joana.

Para saber mais: 3% e o poder de uma distopia tão brasileira

BoJack Horseman (Sexta Temporada), Netflix

Por Carol Alves

Em 2020, uma das melhores séries da Netflix (se não a melhor) chegou ao fim. É difícil acreditar que a última parte de BoJack Horseman foi ao ar no começo do ano porque tanta coisa aconteceu desde aquela época que a série sobre o cavalo parece quase perdida no limbo.

Mas acompanhar a jornada de BoJack foi uma das experiências mais satisfatórias e complexas que a TV proporcionou nos últimos anos e, por isso, citá-la é fundamental. Criada por Raphael Bob-Waksberg, durante seis temporadas o seriado apresentou críticas bem amarradas em piadas pertinentes, ao mesmo tempo que criou um arco espetacular para todos os seus personagens. No centro de tudo isso, era praticamente impossível prever onde a história do protagonista iria finalizar, e como. Mas entre episódios como “The Look From Halfway Down” fica claro que a jornada sempre foi mais inteligente e especial do que as pessoas deram crédito. BoJack Horseman com certeza vai fazer falta.

Para saber mais: “Back in the 90’s I was in a very famous TV show”: BoJack Horseman

Crash Landing on You (Primeira Temporada), TVN

Por Carol Alves

Procurando por um escapismo e uma forma de deixar as obras “niilistas” um pouco de lado, finalmente entrei no mundo dos doramas. E apesar do meu conhecimento nas produções ainda ser bem limitado, fico feliz de ter começado com Crash Landing on You.

A série acompanha a história de Yoon Se-ri (Soon Ye-jin), uma CEO que acabou de herdar o império do seu pai. Após um acidente, ela vai parar na fronteira com a Coreia do Norte e conhece o capitão do exército Ri Jung Hiuk (Hyun Bin). Enquanto ele tenta protegê-la do governo, os dois acabam se aproximando e criando uma relação que é pautada em cuidados, lealdade e o fato de que, eventualmente, eles não vão poder ficar juntos. Afinal, ambos vêm de contextos e culturas completamente diferentes (algo que a série explora com humor e um toque de sensibilidade).

Dare Me (Primeira Temporada), USA Network

Por Ana Luiza

Lançada oficialmente em dezembro de 2019, Dare Me (ou Não Provoque, na tradução para o português) chegou ao Brasil no início de 2020 pela Netflix e fez tanto sucesso quanto seria possível esperar da união entre a narrativa adolescente e o suspense. Mais do que a rotina de cheerleaders problemáticas e uma trama de assassinato, a série surpreende ao trabalhar as relações entre essas garotas, o mundo e as pessoas que as cercam, de maneira profunda e brilhante, evidenciando a complexidade de suas experiências e sentimentos.

Addy (Herizen F. Guardiola), Beth (Marlo Kelly) e Colette (Willa Fitzgerald), as três protagonistas, envolvem-se de maneira igualmente complexa: o que tem início como uma relação entre treinadora e alunas, logo se transforma em uma dinâmica difusa, que desconhece limites, e tanto as distancia quanto aproxima. No fim das contas, o grande triunfo da série não está em apontar culpados para supostos crimes ou mesmo em suas cenas mais sangrentas, mas no que existe de semelhante entre mulheres aparentemente tão diferentes, que vivem vidas tão distintas e que, no entanto, continuam a ter as mesmas dúvidas, cometer os mesmos erros, adentrar os mesmos terrenos escorregadios. Como é o caso de outras ótimas produções que tiveram uma vida curta, Dare Me foi cancelada precocemente, com apenas dez episódios, apesar do sucesso inegável entre o público e a crítica. Seu pequeno legado, no entanto, permanece, inesquecível e tão desafiador quanto suas personagens.

Para saber mais: Dare Me: uma obra sobre os sacrifícios e as dores da adolescência

Dark (Terceira Temporada), Netflix

Por Debora

O tempo é cruel e inexorável, e se não nos dávamos conta disso antes, 2020 certamente nos fez aprender esta lição. Ter o encerramento de uma série que tem como tema central o pulsar incessante e avassalador do tempo, como Dark neste ano, foi algo significativo e que me marcou muito. No ano final da série que se consagrou como um das melhores da Netflix, somos introduzidos ao conceito de outros universos, Gato de Schrödinger e sobreposição quântica, e acompanhamos a jornada incansável de Jonas (Louis Hofmann), e Martha (Lisa Vicari), para tentar impedir o apocalipse e as causas de toda sua dor e daqueles que os cercam.

Em um novelo que se emaranha cada vez mais antes de encontrar seu desenrolar, somos conduzidos por episódios que nos lembram porque nos apaixonamos nos dois anos anteriores pela história criada por Baran bo Odar e Jantje Friese, com muitas reflexões filosóficas e relações humanas complexas cheia de nuances nos mostrando todas as implicações do que é ser humano e como amor, juntamente com o tempo, é o fio condutor de nossa existência, seja para o bem ou para o mal. Em suma, a terceira temporada de Dark completa um ciclo de forma impecável, nos dando uma produção a qual admirar quase que incondicionalmente.

Para saber mais: Dark: uma história sobre amor, perda e a inevitabilidade do tempo

Grey’s Anatomy (Décima Sétima Temporada), ABC

Por Paloma

Grey's Anatomy - temporada dezessete

A nova temporada de Grey’s Anatomy ainda está longe do fim. Muito pelo contrário, ela acaba de começar. O primeiro episódio da temporada dezessete foi ao ar em 12 de novembro, após a temporada anterior ter sido encurtada por conta da pandemia. Ainda assim, essa temporada não podia deixar de fazer parte dessa lista pela potência e pelo retrato intenso (e desesperador) do momento que estamos vivendo.

Se a intenção for esquecer da realidade, essa definitivamente não é uma boa pedida. Ao invés de continuar de onde parou e fingir que nada estava acontecendo, os produtores de Grey’s Anatomy fizeram o que precisava ser feito: pularam de cabeça na pandemia. E, em se tratando de uma série médica, vocês podem imaginar o que isso quer dizer. Os primeiros episódios dessa temporada são angustiantes ao ponto de nos fazerem perder o ar pela realidade cruel da situação retratada. A arte por vezes retrata a vida e o que vai ficar imortalizado na décima sétima temporada é o mesmo que vai ficar imortalizado em todos nós que estamos passando por esse momento. Para quem fica aflito de acompanhar produções que fingem que a pandemia nunca aconteceu, Grey’s Anatomy está aí representando o extremo oposto.

High Fidelity, Hulu

Por Carol Alves

De muitas formas, Alta Fidelidade, filme dos anos 2000 estrelado por John Cusack, se tornou um clássico. Amante de música, dono de uma loja de vinil em Nova York e com o coração recém quebrado por sua ex, o protagonista leva o público em uma viagem sobre os seus piores términos de relacionamentos. E por ser algo que trata de assuntos tão universais como amor e inseguranças, com a música como pano de fundo, o filme foi aclamado e amado com o passar dos anos. A série High Fidelity, que adapta o livro homônimo de Nick Hornby, no entanto, faz melhor: ao colocar Zoë Kravitz como a protagonista Robyn Brooks o seriado não só pega o melhor dos elementos presentes no filme, como também cria uma personagem central muito mais interessante e complexa do que na obra original.

A jornada de Robyn é para entender porque, afinal, seus relacionamentos não dão certo. Enquanto na obra original o protagonista parecia quase obcecado em entender suas falhas de forma narcisista, a personagem vivida por Kravitz tenta entrar em contato com seus sentimentos e suas inseguranças para captar a essência da sua solidão — entrando um pouco em pautas como a solidão da mulher negra. E não me entenda errado, a própria Robyn diz, mais de uma vez, que ela era uma idiota. Mas por causa do retrato mais profundo e cuidadoso que a série tem a oportunidade de fazer, ela fica mais complexa do que apenas o superficial. Infelizmente, High Fidelity não foi renovada para uma segunda temporada, se tornando simultaneamente um dos maiores ganhos e perdas da televisão em 2020.

Para saber mais: High Fidelity, primeira temporada: uma visão feminina para a história clássica

Hunters (Primeira Temporada), Amazon Prime

Por Ana Luiza

75 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, Hunters vem na esteira de outras produções centradas no tema, e se utiliza do conflito (e/ou das consequências deste) para discutir temas como racismo, antissemitismo, ódio e memória a partir das experiências de um grupo de personagens que, por motivações pessoais ou não, tomam a frente na caçada por nazistas que permaneceram impunes por seus crimes mesmo depois da guerra — daí o título. Embora seja uma obra de ficção, a série utiliza fatos reais como base para seus acontecimentos, dentre os quais é possível destacar a Operação Paperclip, que possibilitou a entrada sigilosa de inúmeros nazistas nos Estados Unidos, sobretudo atuantes nas áreas de ciência e tecnologia.

Se hoje a Operação Paperclip já não é um segredo, na época em que a série se ambienta (o final da década de 1970), seu conhecimento estava restrito a determinados membros da NASA e do governo norte-americano, e é interessante perceber como alguns de seus personagens, confrontados pela realidade da operação pela primeira vez, reagem a ela — resposta essa que também indica quão complexa é a discussão a qual a série se propõe. Com um elenco impecável, texto afiado e reflexões que continuam atuais, Hunters é a prova que o audiovisual pode ser muito mais do que mero entretenimento.

I May Destroy You, HBO

Por Carol Alves

Criada, escrita e dirigida por Michaela Coel, nada em 2020 foi tão bom ou impactante na TV quanto I May Destrou You. A história começa logo após Arabella (Coel) ser dopada e estuprada depois de sair com os amigos para beber um drink ou dois. No começo, ela acha que, mais uma vez, perdeu o controle. Mas à medida que reconstrói seus passos, percebe que existe algo muito errado na forma como as coisas se desenrolaram naquela noite. Os três primeiros episódios acompanham a protagonista tentando entender seu abuso e aceitando o que de fato aconteceu com ela, enquanto os outros focam na maneira como lida com os traumas e outras formas de assédio que sofreu durante a vida.

Para isso, Arabella conta com a ajuda de seus dois amigos, Kwame (Paapa Essiedu) e Terry (Weruche Opia), que, por sua vez, também carregam traumas e abusos próprios que, impulsionados pelo o que aconteceu com Arabella, têm que lutar para entender e entrar em contato com seus sentimentos. I May Destroy You é tão inteligente e sagaz quanto uma série de TV pode ser, sendo praticamente impossível captar todas as nuances da obra. Coel não oferece para seus personagens um caminho certo para a superação do trauma, apenas deixa com que eles lidem com isso da forma mais humana e empática possível — o que nem sempre foi possível em produções que abordam crimes como o estupro.

 Para saber mais: I May Destroy You: a minha voz pode ajudar seus gritos silenciosos?

Little Voice (Primeira Temporada), Apple TV

Por Debora

Um sopro de ar fresco e um facho de esperança: é assim que me senti ao terminar de assistir a primeira temporada de Little Voice, série com apenas nove episódios de cerca de 30 minutos cada. Criada e produzida por Sara Bareilles e Jessie Nelson, a produção conta a história de Bess (Brittany O’Grady) e sua jornada para reencontrar sua voz no meio artístico e seu caminho também na sua vida pessoal. Com uma trilha sonora espetacular, que usa mão das composições de Bareilles, e ganha ainda mais beleza com as interpretações de Brittany O’Grady, a série não vira a cara para abordar o cotidiano e diversos termas importantes, como homofobia, imigração, codependência e afins, tudo sem perder a delicadeza, leveza e a capacidade de mostrar que nos momentos mais ordinários pode se encontrar o extraordinário.

Com uma gama de personagens “gente como a gente”, especialmente sua personagem principal, que se define como uma “bagunça”, Little Voice é capaz de despertar no seu espectador os sentimentos mais puros, enquanto conta uma história cheia de nuances e complexa em sua miríade de emoções.

Para saber mais: Little Voice: uma história sobre encontrar a própria voz em meio ao caos

Lovecraft Country (Primeira Temporada), HBO

Por Carol Alves

No auge das discussões da internet sobre separar o autor da obra, Lovecraft Country chegou na HBO como uma releitura dos universos criados por H.P. Lovecraft, que ficou conhecido por ser o criador do “horror cósmico” e como um homem racista e supremacista. Por isso, a série coloca no centro daquele mesmo universo pessoas que foram excluídas da sua narrativa durante muito tempo.

Protagonizado por Tic (Jonathan Majors) e Letitia (Jurnee Smollett), a história vai no fundo em assuntos como racismo e ancestralidade, além de apresentar um roteiro que é quase episódico. Um capítulo pode ter elementos fortes do horror, enquanto outros podem ser uma história de amor, uma grande aventura no estilo Indiana Jones ou até mesmo uma ficção-científica cósmica e poderosa. Em qualquer outro seriado talvez isso não funcionasse, mas por causa da visão única da showrunner Misha Green, Lovecraft Country se tornou uma das maiores surpresas de 2020, mesmo que tenha tropeçado ao tentar falar de alguns assuntos.

Para saber mais: Lovecraft Country e o terror que é real demais

My Brilliant Friend (Segunda Temporada), HBO

Por Ana Luiza

Adaptação do segundo livro da Tetralogia Napolitana de Elena Ferrante, História do Novo Sobrenome, My Brilliant Friend mantém, em sua segunda temporada, as qualidades que fizeram de seu primeiro ano um sucesso. As nuances da amizade de Lila (Gaia Girace) e Lenu (Margherita Mazzucco) tornam-se ainda mais amplas durante a segunda temporada, quando suas experiências também se tornam mais complexas e amplas. Se ser criança e adolescente em Nápoles era, por si só, um desafio, ser uma jovem mulher não se prova uma tarefa mais fácil; pelo contrário, talvez seja ainda mais difícil.

Casamento, violência e sexo se unem a temas outrora abordados pela narrativa (educação, pobreza, família, etc), em um cenário de pouca gentileza, em que os abusos são uma constante e as chances de escapar dessa realidade — tão bem representada pelo bairro repleto de cinzas e tons terrosos, onde tudo parecer ser visto por uma camada de areia — soa como uma possibilidade abstrata, até mesmo impossível, para muitos. Nesse contexto, os caminhos de Lila e Lenu parecem se tornar também mais distantes — e, no entanto, existe um fio que continua a uni-las, para bem e para o mal. Como poucas adaptações são capazes, a segunda temporada de My Brilliant Friend celebra a qualidade do trabalho de Ferrante, ao mesmo tempo em que reforça que uma boa história continuará a ser uma boa história independente da forma como é contada.

Normal People, Hulu

Por Vivian

Adaptações literárias para o audiovisual são sempre divisores de opinião. Uma parcela dos espectadores ama, por X motivos e outra parcela odeia, por Y motivos, que normalmente tangem a fidelidade à obra original. No entanto, se existe um produto audiovisual que conseguiu transmitir fielmente a atmosfera e o sentimento que o livro traz, esse produto é a adaptação seriada do livro Pessoas Normais. Lançado pela Companhia das Letras no final de 2019, o romance de Sally Rooney virou série pelo serviço de streaming Starzplay (incorporado ao Amazon Prime Video aqui no Brasil). Estrelada por Daisy Edgar-Jones e Paul Mescal nos papéis de Marianne e Connell, respectivamente, os 12 episódios de Pessoas Normais conseguem condensar todos os anseios, inquietações e paixões, não apenas dos protagonistas, mas de uma geração.

Na trama, Marianne e Connell são dois jovens de Sligo, interior da Irlanda, que começam a se encontrar às escondidas no último ano da escola. Ambos mantém o segredo por motivos sociais e pelos vínculos de amizade que possuem (ou não possuem, no caso dela). Entre idas e vindas, o relacionamento estende-se até a graduação na faculdade, com os dois já mais maduros e em posições sociais diferentes. Além do amor, os personagens discutem sobre a entrada na vida adulta, sobre classes e privilégios, sobre estudo e literatura. A série traz muito mais que o típico romance adolescente já esperado. Melancólica e agridoce, os episódios atenderam aos leitores do livro e conquistaram uma nova leva de admiradores. Com um elenco bem escolhido e uma trilha sonora precisa, Pessoas Normais traduz a inabilidade de comunicação, o desenlace em relação ao mundo e uma afetividade pura em imagens e diálogos belíssimos.

Para saber mais: Normal People: sobre todas as coisas que nunca foram ditas

Ratched (Primeira Temporada), Netflix

Por Paloma

Rached

Dúbia, estranha, confusa, intrigante. Existem muitas palavras para descrever Ratched, de Ryan Murhpy. A série conta a história de Mildred Ratched, a enfermeira-chefe de Um Estranho no Ninho (One Flew Ovver The Cuckoo’s Nest), de 1975, dirigido por Milos Forman. Entre outras coisas, Ratched vem para questionar o status da personagem como uma das maiores vilãs da história do cinema.

A história gira em torno da personagem central, a Enfermeira Ratched (Sarah Paulson), e sua relação com um paciente que chega ao hospital psiquiátrico da cidade de Lucia. Ao contrário do que se costuma dizer sobre a personagem original, a protagonista de Murphy não é a encarnação do mal institucional, e sim uma personagem complexa com uma história de vida trágica que faz o que acredita que precisa fazer para se proteger em uma sociedade que já a decepcionou muitas vezes. Existe mais possibilidades na vida do que a divisão bom/mau consegue dar conta, e a série é uma prova disso. Ratched pode não ser para todos os gostos, mas para quem gosta de suspenses sem compromisso com a moral e com uma estética interessante, pode ser uma boa escolha.

Para saber mais: Ratched, primeira temporada: Nada é exatamente o que parece

Schitt’s Creek (Sexta Temporada), CBC

Por Tati Alves

A última temporada de Schitt’s Creek começou logo na primeira semana do ano, quando nós ainda não sabíamos o que ia acontecer com 2020. Ao seu final, o seriado havia se tornado ainda mais como uma boia de sobrevivência no início do caos da pandemia, isolamento social e quarentena. O seriado sempre foi uma válvula de escape e um abraço quentinho para mim, porém tem algo na forma como eu consegui voltar toda a minha atenção aos enredos, aos desenvolvimentos e aos grandes finais de todos os personagens e não me deixar entrar (muito) naquela bola de angústia coletiva que tivemos no início da pandemia que acredito que não teria aguentado aqueles primeiros dias sem Schitt’s Creek para me distrair.

Não é à toa que a série foi o grande sucesso do Emmys esse ano e é muito on brand o fato deles estarem algumas temporadas em campanha para vencerem o Emmy e o ano que isso foi acontecer seja 2020 com as premiações acontecendo de forma virtual. Essa última temporada dá um desfecho para a saga da família Rose e os moradores de Schitt’s Creek, entregando um final feliz e um até logo para todos que acompanharam as seis temporadas.

Para saber mais: O legado do amor em Schitt’s Creek; Best wishes, warmest regards: o mundo aconchegante de Schitt’s Creek

Sex Education (Segunda Temporada), Netflix

Por Ana Luiza

Depois de uma temporada de estreia tão adorável quanto cativante, o segundo ano de Sex Education mantém as características que lhe fizeram uma referência entre narrativas adolescentes, mas dá um passo além ao abordar com maior seriedade temas essenciais. O bom humor permanece uma constante, mas é a delicadeza, sobretudo, do olhar que lança sobre seus personagens, sejam eles novos e antigos, ou aos temas espinhosos que se dedica a discutir (destaque para o assédio e a rivalidade feminina, que ganham episódios memoráveis durante a temporada) que a tornam uma produção tão interessante e, ao mesmo tempo, tão fácil e aconchegante.

Em um momento no qual narrativas sobre ódio e violência parecem se sobressair de maneira geral, Sex Education prova que é possível abordar questões essenciais de maneira despretensiosa, em uma história repleta de cores claras e personagens adoravelmente equivocados, e uma narrativa que captura o universo adolescente com tanta precisão quanto sensibilidade.

Para saber mais: Sex Education, segunda temporada: entre acertos e (alguns) deslizes

Tale of the Nine Tailed, TVN

Por Debora

Minha primeira aventura no mundo dos doramas, Tale of the Nine Tailed foi tudo o que me prometeram, e mais! Com 16 episódios de cerca de 1h10min cada, o dorama me fez ficar obcecada com o destino dos personagens Lee Yeon (Lee Dong-wook) e Nam Ji-ah (Jo Bo-ah) e viver novamente aquele frisson de aguardar os episódios serem lançados semanalmente. Com uma trama que me lembrou em muitos pontos InuYasha, Tale of the Nine Tailed nos apresenta o folclore de uma raposa de nove caudas que se apaixona por uma humana e sofre as consequências deste ato proibido pelo destino. Complementam essa história um meio-irmão amargurado, um melhor amigo atrapalhado e um vilão que tira satisfação apenas em ver o casal principal sofrer.

Pensei, a princípio, que teria dificuldades em me adaptar ao estilo da narrativa e da história, mas nunca estive mais enganada. Em apenas dois episódios, trama, personagens, trilha sonora e direção já haviam me cativado a tal ponto de não saber como pude ficar tanto tempo sem conhecer esse mundo mágico, onde cada episódio contém um nível absurdo dos mais diversos clichês, tudo de forma belamente executada e sem se tornar maçante, a ponto de parecer que foram projetados especialmente para suprir todas minhas necessidades ao assistir um romance e deixar o coração absurdamente quentinho — com, claro, algumas lágrimas de sofrimento também.

Ted Bundy: Falling for a Killer, Amazon Prime

Por Ana Luiza

Na contramão de produções como Conversations With a Killer e Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, Falling for a Killer promove a única discussão que resta, válida, sobre os crimes de Ted Bundy, e faz uma pergunta surpreendentemente livre de precedentes: o que acontece depois? Para responder a essa pergunta, a série vai ao encontro das vítimas sobreviventes, bem como de amigos e parentes daquelas que não estão mais presentes, numa tentativa de desvelar a verdadeira face dos crimes. Pessoal e social convertem para criar uma única narrativa, que estabelece, de forma primorosa, as muitas nuances presentes no caso. Elizabeth Kendall, ex-namorada de Bundy, e sua filha, Molly, guiam a maior parte da conversa que, no entanto, não se restringe a contar uma única história. Somados, os relatos evidenciam quão permanentes são os traumas vividos por essas mulheres e suas famílias, que continuam a reverberar de muitas maneiras no presente, inescapáveis até mesmo aos efeitos do tempo.

Sem a pretensão de encontrar respostas definitivas (até mesmo entre as vítimas e seus familiares não existe um consenso sobre a melhor maneira de lidar com os crimes), Falling for a Killer abre espaço para que essas pessoas compartilhem suas experiências e opiniões, fornecendo importantes insights sobre misoginia, machismo e memória, finalmente elevando vozes que, por quase 40 anos, se mantiveram silenciadas.

Ted Lasso (Primeira Temporada), Apple TV

Por Carol Alves

No geral, tento ficar longe de obras que abordam a vida do homem branco médio. Afinal, quantas histórias já foram contadas por esse mesmo viés? Me parece que, talvez, outras perspectivas sejam mais interessantes de acompanhar. Mas em 2020 aconteceu o que pode ser considerado um pequeno milagre na cultura pop: Ted Lasso. Estrelada por Jason Sudeikis, a série acompanha um treinador de futebol norte-americano que, após ouvir o pedido da sua mulher por um tempo, aceita um emprego para treinar um time de futebol tradicional (daquele que nós temos aqui). Lasso é um homem otimista, com um forte sotaque do sul e que, ainda por cima, é completamente desqualificado para o cargo que ocupa dentro da sua empresa. E mesmo assim, é o protagonista que 2020 precisava.

Muito como Leslie Knope em Parks and Recreation, Ted muda a vida de todos ao seu redor. Se recusando a desistir, ele pega cada um dos jogadores de futebol do seu time e trabalha nas suas inseguranças, ao mesmo tempo que dá suporte para que eles consigam melhorar e crescer não só como jogadores, mas também como pessoas. Por causa dele e do olhar empático que joga sobre as pessoas, os coadjuvantes se tornam figuras complexas e interessantes de acompanhar. E, sinceramente, nem sequer a parte do futebol me incomodou (sendo que não sou nem um pouco fã do esporte).

The Crown (Quarta Temporada), Netflix

Por Ana Luiza

Dentre os muitos fatos que permeiam a história da família real inglesa, nenhum talvez possua tamanha força no imaginário popular quanto a chegada de Lady Diana Spencer e seu conturbado relacionamento com o clã Windsor. Em sua quarta temporada, The Crown acompanha os primeiros anos de uma dinâmica que seria escrutinada pela mídia desde o princípio, e que, ao menos naquele momento, ainda guardava em si mesma a expectativa de um conto de fadas — contos de fadas esse que, no entanto, não demoraria a transmutar-se em pesadelo. De fato, Diana viria a desafiar a tradição (como a série muito apropriadamente anuncia no material de divulgação), mas não seria a única: em uma frente distinta, há Margaret Thatcher, à época primeira-ministra do Reino Unido e catalisadora de desafios que também balançariam a vida outrora tão ordeira da realeza, adicionando camadas de complexidade à narrativa de Peter Morgan.

Unindo um elenco brilhante (destaque para a relativamente novata Emma Corrin, que reluz no papel da Princesa de Gales) a um texto afiado (embora nem sempre historicamente preciso), The Crown imagina como essas transformações impactam a vida da família, e sobretudo de sua protagonista, Elizabeth II (Olivia Colman); como o pessoal facilmente se entrelaça ao político, interferindo no relacionamento de pais e filhos, irmãos e irmãs, esposas e maridos, e como são refletidos na vida pública. Com duas temporadas restantes antes de seu desfecho, não há dúvidas de que a série permanece como uma das melhores produções atualmente no ar, tão bem sucedida quanto fora desde seu ano de estreia.

Para saber mais: Crítica: The Crown, as tradições e as amarras da família real

The Great (Primeira Temporada), Hulu

Por Ana C. Vieira

Divertida e absurda, The Great chegou em junho para me tirar de um marasmo em relação à TV. Sem me empolgar com muitos dos últimos lançamentos e com os episódios das acompanhadas acumulando, com Elle Fanning no papel de Catarina, A Grande (ou em vias de se tornar Catarina, A Grande), a série original do serviço Hulu, com suas cores vibrantes, música dissonante e humor atípico em comparação às clássicas séries de época, é realmente ótima.

Desconheço até que ponto The Great se mantém fiel à verdade dos fatos, até que ponto as brigas e traições são reais, mas acompanhar Fanning e seu parceiro lunático, Peter III da Rússia (Nicholas Hoult) garantem dez episódios de absoluto caos — e de uma maneira que é o puro suco do entretenimento. Os personagens coadjuvantes também não perdem em nada para os principais, com atenção em especial para Marial, interpretada pela ótima Phoebe Fox. A série, que é resultado de Tony McNamara, roteirista responsável por The Favourite, já está renovada para uma segunda temporada.

The Mandalorian (Segunda Temporada), Disney+

Por Thay

The Mandalorian é apenas a ´primeira série do universo expandido de Star Wars a estrear no Disney+, serviço de streaming que chegou ao Brasil em novembro, e certamente não será a última (como ficamos sabendo após o anúncio de pelo menos dez novas produções do universo intergaláctico pela Disney em andamento). Em sua segunda temporada continuamos a acompanhar a jornada de Mando (Pedro Pascal) e A Criança (Baby Yoda para os íntimos) em uma galáxia muito distante. O mandaloriano precisa encontrar um lugar seguro para a criaturinha, mas Moff Gideon (Giancarlo Esposito) tem planos muito diferentes para o destino da dupla.

A segunda temporada dá continuidade ao bom trabalho da temporada de estreia entregando episódios coesos, com uma trama bem amarrada e uma produção de alta qualidade. The Mandalorian não deve em nada para os filmes da franquia que chegam ao cinema e, às vezes, consegue empolgar até mais do que suas contrapartes que estreiam em tela grande. O fanservice dá as caras algumas vezes (e isso não é, definitivamente, uma reclamação) e personagens como Ashoka Tano (Rosario Dawson), Boba Fett (Temuera Morrison) e Bo-Katan Kryze (Katee Sackhoff) surgem nas telas para amarrar ainda mais a trama dessa temporada, alinhando produções diferentes em uma única linha do tempo. Este é o caminho.

Para saber mais: The Mandalorian: esse é o caminho

The Queen’s Gambit, Netflix

Por Thay

Penso que nem mesmo as pessoas por trás da produção de The Queen’s Gambit poderiam imaginar que a minissérie faria tamanho sucesso com a audiência da Netflix. Os sete episódios da temporada estrearam no serviço de streaming no final do mês de outubro e, desde então, só se falou de Beth Harmon, interpretada por uma Anya Taylor-Joy fenomenal, e jogos de xadrez. Prova do sucesso da série é que até mesmo as buscas no Google por termos como “jogada siciliana”, “gambito da rainha” e “jogadas de xadrez” cresceram 300% desde a estreia da produção.

The Queen’s Gambit, baseada no livro homônimo de Walter Tevis, conta a história de Beth Harmon e sua jornada até se transformar uma enxadrista de sucesso internacional. Tornando-se órfã enquanto criança, Beth passou sua infância em um orfanato onde aprendeu a jogar xadrez com o zelador — mas apenas por pura insistência da parte dela, visto que o zelador não parecia interessado em ser incomodado por uma menina teimosa e petulante. Beth compreende o jogo com facilidade e não demora até que ela domine as regras com perfeição. Durante os sete episódios da minissérie, acompanhamos as conquistas e tropeços de Beth em um universo dominado por homens, seu relacionamento com os outros enxadristas e como desenvolve um vício preocupante em medicação e bebidas. The Queen’s Gambit não é 100% perfeita — a maneira como apenas homens orbitam ao redor de Beth a maior do tempo é um incômodo —, mas não deixa de ser uma produção interessante do começo ao fim, e muito disso se deve ao carisma e trabalho excepcional Anya Taylor-Joy como a protagonista.

Para saber mais: The Queen’s Gambit: o estudo de uma pessoa extraordinária

The Undoing, HBO

Por Paloma

The Undoing

Adaptação do livro You Should Have Known (“Você Devia Saber”, em tradução livre), da escritora estadunidense Jean Hanff Korelitz, ainda não publicado no Brasil, The Undoing é uma minissérie de suspense produzida e exibida pela HBO. Com apenas seis episódios de cerca de uma hora de duração cada, The Undoing é uma história envolvente e muito bem contada com a intenção clara de confundir a audiência, de nos fazer duvidar das nossas próprias conclusões. E funciona.

A trama gira em torno da psicóloga Grace Fraser (Nicole Kidman). Logo no primeiro episódio, Grace tem algumas interações estranhas com Elena Alves (Matilda De Angelis), a mãe de outro menino que estuda na escola do seu filho. Alguns dias mais tarde, após voltar de um evento beneficente, Elena é encontrada morta pelo filho em seu próprio estúdio. Rapidamente, as suspeitas se voltam para o marido de Grace, Jonathan Fraser (Hugh Grant), que desaparece no mesmo dia. A partir daí, seguimos a história junto com Grace tentando entender o que aconteceu naquela noite e quem é o assassino de Elena.

Unorthodox, Netflix

Por Fernanda

Levemente baseada no livro de memórias de Deborah Feldman, a minissérie Nada Ortodoxa conta a história da jovem Esty (Shira Haas), que foge da comunidade judaica ultraortodoxa onde cresceu, localizada em Williamsburg, no Brooklyn, para ir atrás da mãe, que também fugira muitos anos atrás, em Berlim. Porque a comunidade em que Esty cresceu é muito fechada em si mesma, parte do atrativo da minissérie é, é claro, apresentar a um público amplo como ela funciona, e por que tanto Esty quanto sua mãe optaram por abandoná-la. Embora os flashbacks ajudem a explicar e evidenciar os muitos motivos por trás do desejo de fuga, um acerto do roteiro é não apresentar os judeus ultraortodoxos de maneira unidimensional, especificamente ao escolheram trazer um retrato mais multifacetado por meio das figuras de Yanky (Amit Rahav), marido de Esty — também ele um jovem inexperiente —, e de seu complicado primo Moishe (Jeff Wilbusch), cujas perspectivas também são exploradas.

Como toda narrativa que se propõe a explorar formas de viver que diferem radicalmente dos costumes amplamente difundidos no mundo ocidental, a minissérie acaba levantando questões importantes sobre o reforço de estereótipos e sobre a responsabilidade envolvida no ato de criar. Na crítica publicada no ValkiriasMariana Motta explora com bastante cuidado as limitações, os erros e os acertos da produção da Netflix nesse sentido, bem como algumas das escolhas narrativas de Anna Winger Alexa Karolinski que acabam sendo um pouco simplistas. Ao fim do dia, o maior apelo de Nada Ortodoxa está em apresentar, sobre um pano de fundo novo, uma trama que já vimos uma porção de vezes antes, mas que continua a carregar uma força inegável: a de uma pessoa ainda em processo de formação que busca trilhar o próprio caminho para além de suas origens — que são, afinal, sempre um recorte muito limitado do mundo. O choque entre realidades que Esty vivencia quando chega em Berlim é tratado com bastante delicadeza, e é complementado pelo maior trunfo da série: a bela atuação de Shira Haas. Com um pouco de reflexão, a minissérie — que explora as experiências específicas de uma mulher em sua comunidade — pode levar com facilidade a reflexões muito importantes sobre como nossos próprios costumes, que acabam por parecer tão naturais porque são aquilo que conhecemos desde sempre, também aprisionam e limitam.

Para saber mais: Crítica: Nada Ortodoxa, Nada Ortodoxa: o valor da memória

Valeria (Primeira Temporada), Netflix

Por Karina

Eu estava procurando uma série leve para passar o tempo quando resolvi dar o play em Valeria, série espanhola da Netflix baseada nos livros de Elísabet Benavent. Foi uma ótima escolha para o momento. De cara, é difícil evitar a comparação com Sex And The City. Assim como a clássica série da HBO, Valeria também traz para as telas um grupo de quatro amigas vivendo suas paixões e decepções na cidade grande — mas, ao invés de Nova York, o cenário é Madri. E assim como Carrie Bradshaw, Valeria (interpretada por Diana Gómez) é uma escritora que passa várias cenas digitando em seu computador. Mas o grande dilema da protagonista é outro: Valeria vive uma crise em seu casamento e um bloqueio criativo na escrita de seu romance. É nesse clima que ela conhece Víctor (Maxi Iglesias), embarcando em um triângulo amoroso cheio de dúvidas e tensão sexual.

Apesar de focar em Valeria e em como ela lida com todas as suas questões, a série também nos mostra as vidas de suas amigas, Lola (Silma López), Carmen (Paula Malia) e Nerea (Teresa Riott). O ponto alto é exatamente a dinâmica do quarteto de personagens principais, e ter essas quatro personalidades diferentes ajuda a trazer uma variedade de dilemas para a trama. São dilemas básicos de millennials na vida adulta que, junto com um humor leve, fazem com que Valeria seja uma boa série para não pensar muito. Não é uma série impecável. Do mesmo modo que outras produções recentes da Netflix, Valeria parece ter sido feita com um pouco de pressa. A impressão que fica é a de que alguns erros poderiam ser corrigidos se fossem pensados com mais cuidado; seja o elenco milimetricamente padrão ou o fato de que Nerea, a única das amigas que não é heterossexual, é a personagem que fica mais apagada. Não é uma série que mudou a minha vida, mas foi envolvente o suficiente para me distrair — e isso já é um grande feito no ano de 2020.

What We Do in the Shadows (Segunda Temporada), FX

Por Carol Alves

Seguindo a linha do mockumentary criado por Taika Waititi (uma espécie de The Office com vampiros), a série What We Do in the Shadows não só foi uma das melhores produções em 2020, com uma segunda temporada redonda e ambiciosa dentro do seu próprio escopo, como também levou uma indicação a Melhor Série de Comédia no Emmy 2020, concorrendo ao lado obras aclamadas e, por vezes, até meio pretensiosas.

A série, que acompanha três vampiros tradicionalistas tentando se adaptar ao mundo moderno, começou apenas como um mockumentary com um público fiel, porém pequeno, e agora é todo um universo expandido, mesmo que a característica de sátira nunca saia do lado das obras. Como episódios como “On the Run”, com a participação de Mark Hamill, fica claro não só o quanto o mundo dos vampiros ainda tem potencial, como também explana o poder de um roteiro simples, porém inteligente e sagaz. Não é atoa que atores como Evan Rachel Wood, Tilda Swinton e até mesmo Wesley Snipes (o próprio Blade) já quiseram fazer aparições na série.

Para saber mais: O fênomeno What We Do in the Shadows

Zoey’s Extraordinary Playlist (Primeira Temporada), NBC

Por Karina

Foi só ver o trailer de Zoey’s Extraordinary Playlist para ficar empolgada. Uma série musical com Lauren Graham cantando? Sim, por favor! O primeiro episódio terminou de me convencer: foram quarenta minutos impecáveis que me fizeram rir, chorar, criar simpatia pelos personagens e cantar junto com os números musicais. A série acompanha a vida de Zoey (Jane Levy), uma jovem programadora que, depois de um incidente durante uma radiografia, acaba com o estranho “superpoder” de ouvir os sentimentos mais profundos das pessoas na forma de números musicais coreografados. Ao longo da primeira temporada, vemos a protagonista mergulhar nos pensamentos musicados de amigos, colegas de trabalho, familiares e desconhecidos, enquanto tenta ajudá-los e surta uns bons bocados.

Apesar de ser uma série com seus clichês, Zoey’s Extraordinary Playlist conseguiu me surpreender — principalmente com as formas diferentes de trazer as partes musicais para dentro da trama. Está certo que as chances de que eu, pessoalmente, enjoasse de ver personagens expressando seus sentimentos através de músicas pop em uma espécie de suspensão temporal eram bem baixas. Mas, ainda assim, é ótimo poder contar com experiências diferentes ao longo dos episódios. Também gostei de como a série trata de seus principais temas na temporada de um jeito leve, mas sensíveis: luto, morte, relacionamentos complicados, amizade, trabalho. Dá para se emocionar e dá para se divertir. Para mim, foram episódios inteiros de um entretenimento perfeito. E Lauren Graham cantando Wrecking Ball pode sim contar comigo para tudo. Zoey’s Extraordinary Playlist já foi confirmada para a segunda temporada e a primeira está disponível no Globoplay.

Para saber mais: Zoey’s Extraordinary Playlist: estamos todos cantando por dentro

We Are Who We Are, HBO

Por Ana C. Vieira

Luca Guadagnino retorna ao interior da Itália para, no curso de oito episódios, fazer poesia em forma de TV. Com We Are Who We Are, Luca deixa de lado fórmulas lineares de se contar sobre a adolescência e permeada de fluidez, desejo, ambiguidade e inquietação, oferece uma obra lenta e contemplativa. Ambientada no interior de uma base militar dos Estados Unidos nos confins da Itália, a série acompanha a incoerência, típica de um processo de autoconhecimento, de Fraser Wilson (Jack Dylan Grazer) e Caitlin Poythress (Jordan Kristine Seamón), e de como estes lidam com a dor, rejeição, inadequação, laços de amizade e a própria identidade e sexualidade.

Apesar de nomes como Kid Cudi, Chloë Savigny e Alice Braga no elenco, que interpretam pais e militares com seus próprios dramas e nuances para dar conta, é sob os personagens adolescentes e jovens adultos que a série se edifica. We Are Who We Are é um convite para o desacelerar; um convite aberto para o sentir. É o mundano, o belo e o íntimo — e nessa busca incansável e inerente por algum tipo de liberdade, a série acerta.