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Mesa Redonda Oscar 2018: sentimentos são os únicos fatos

A indústria do cinema é feita de sonhos, que constroem histórias que nos transportam para mundos passados ou futuros, colocando-nos na pele de outras pessoas em outras épocas. Ao mesmo tempo em que constrói e molda nosso imaginário, o cinema é feito de pessoas comuns que buscam colocar um pouco de magia em nossas vidas: pense na história de amor entre uma mulher muda e uma criatura fantástica ou na ambição desmedida de uma menina adolescente; ou, ainda, na história de uma patinadora artística incrivelmente talentosa que precisou lidar com agressões e abusos a vida inteira, mas não desistiu do sonho de ser tornar vencedora. Pense e sinta a brisa preguiçosa de um verão na Itália e no desejo incontido entre dois rapazes; pense, também, nas vidas quebradas de duas famílias que se encontram na lama e na chuva do Mississipi.

Os sonhos são vastos e as histórias a serem contadas, também. A 90ª cerimônia do Academy Awards chega com a promessa de novos tempos e novos ares, ainda que algumas coisas permaneçam iguais. Embora seja uma fábrica de sonhos, Hollywood escondeu, por muitos anos, casos de abuso e assédio sexual dos mais diferentes níveis; a sujeira era varrida para debaixo do tapete sem cerimônias, porém, não mais. Aos poucos, vozes se levantam e clamam por justiça — no tratamento no ambiente de trabalho, na igualdade salarial dos trabalhadores, na diversidade de histórias e personagens —, e isso se reflete, também, na maneira como consumimos o que por eles é produzido. Nessa mesa redonda especial, discutimos um pouco de tudo: os filmes que estão entre os mais prestigiados do último ano, as atrizes incríveis e as mulheres que fazem história, mas também sobre os famigerados embustes e de nossas esperanças para o futuro da cultura pop.

***

THAY: Oscar está aí, batendo na nossa porta. Dia 4 de março será o dia da 90ª cerimônia e algumas coisas mudaram desde a primeira edição, enquanto outras continuam tão antigas quanto. Quais são as expectativas de vocês para a premiação que está por vir? Dá pra ter esperanças de que os premiados vão sair das mesmice com os indicados deste ano?

TANY: A minha maior expectativa é que tenha pelo menos dois prêmios para concorrentes que geralmente são excluídos (negros, mulheres) da premiação e que, quem sabe, a cerimônia seja menos chata e com uns discursos melhores também.

ANA C.: Já aprendi há muito tempo que ter expectativa com o Oscar só serve pra quebrar a cara. Lembro de Boyhood e dói o coração. Esperança a gente sempre tem, mas honestamente não conto muito com isso.

JESSICAEste foi o primeiro ano em que acompanhei todas as premiações, desde o Globo de Ouro. Quando você começa a acompanhar mais de perto, é um pouco difícil ter esperança, porque muitas vezes os prêmios acabam indo para as mesmas pessoas ou filmes. No entanto, mesmo com esse cenário, estou muito ansiosa para saber como o #MeToo vai ser tratado no Oscar, e se vamos ter, como a Tany disse, prêmios para concorrentes ignorados. Eu sou uma canceriana trouxa com esperanças.

ANA LUÍZA: Tivemos algumas boas surpresas esse ano, algumas inéditas, como a indicação da Rachel Morrison por Moudbound: Lágrimas Sobre o Mississípi em fotografia, mas não tenho muita esperança de que essas mudanças sejam refletidas na escolha dos premiados.

THAY: Tenho que confessar que não tenho nem esperança e nem muita paciência pro Oscar. Por mais que ele venha e faça uma coisa nova, logo volta pra mesmice. E deus me livre de Gary Oldman.

JESSICA: Às vezes eu sinto que o movimento #MeToo e toda essa demanda foi apropriada pela indústria em geral, mas isso não se reflete nas indicações. Na hora de mostrar a cara, eles (os votantes e as votantes) simplesmente recuam.

ANA C.: Quando li que os movimentos atuais (#MeToo e #TimesUp, se não me engano) não vão ter muito palco no Oscar, porque a cerimônia tem que ser alegre, já desanimei.

THAY: Eu vi isso também e fiquei “SABIA!”. O Oscar é a pior das cerimônias pra esse tipo de coisa.

JESSICA: Nossa, Ana, eu nem estava sabendo disso. QUE TRISTEZA.

TANY: Gente, não sabia disso… que triste. Eles podem fazer isso porque é o Oscar. Eles podem fazer tudo porque é o Oscar. Eles são hipócritas. Acho que todas as premiações são, mas o Oscar consegue ser a pior delas. Ao mesmo tempo que diz abraçar a causa e tudo mais, ele também indica um abusador para compensar um filme gay como concorrente a Melhor Filme, sabem? É triste, mas ainda tenho esperança.

THAY: Exatamente, Tany. O que dá uma tristeza imensa. Ainda que o Oscar não queira dizer tanto quanto dizia antigamente, ainda tem um peso enorme no mundo do cinema em geral.

JESSICA: Parece que é mais pra preencher cota, vocês não acham? Para não “ficar feio”, mas sem realmente pensar nessas questões.

THAY: Dizer que o filme ganhou um Oscar sempre dá mais peso do que dizer que ganhou, sei lá, um Globo de Ouro.

JESSICA: Reza a lenda, Thay, que o Globo de Ouro é uma piada dentro do segmento do Cinema e Televisão. Li isso em um artigo, então faz sentido não ter muito peso mesmo.

THAY: Oxe, não sabia que o Globo de Ouro era visto como piada! Vivendo e aprendendo.

JESSICA: É sim! Ele fala muito sobre a campanha feroz em cima dos filmes, algo que não dá pra esquecer quando falamos sobre Oscar. E, bem, se os movimentos #MeToo e #TimesUp não terão palco no Oscar, será que vamos ver perguntas para os caras sobre esses dois movimentos? Porque nas outras premiações, só as mulheres foram perguntadas sobre esse aspecto. Isso só reforça como o movimento meio que é esvaziado, perde seu significado.

ANA LUÍZA: Eu li isso também e acho que a decepção só não foi maior porque é o Oscar. O que a gente espera de uma premiação que até hoje só indicou cinco mulheres à direção — nenhuma não-branca — e cinco homens negros? É bastante desanimador. Eu gostei bastante de O Destino de Uma Nação porque sou o tipo de pessoa que gosta de filmes históricos chatos, mas é hipocrisia demais que Gary Oldman ganhe a estatueta, sobretudo nesse momento específico que vive o cinema — mas é o que muito provavelmente vai acontecer.

ANA C.: Esse ano eles jogaram dois filmes que são fora da curva, Corra! e Me Chame Pelo Seu Nome, o resto não é muito incomum. A Forma da Água, talvez, mas pouco.

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“Me Chame Pelo Seu Nome”

THAY: Acho difícil ver os caras sendo questionados a respeito desses movimentos, principalmente quando parte deles é o motivo desses movimentos existirem. Quer dizer, é só lembrar do Justin Timberlake usando o broche do #MeToo em uma cerimônia e o embuste que ele é. Os caras pegam carona nesse movimento para saírem bem na foto, e é isso.

JESSICA: É verdade, Thay. É mais fácil usar broche e pregar que está do lado das mulheres para passar bem. Infelizmente, nesse aspecto, a indústria continua a mesma da era clássica do cinema. Que raiva!

ANA C.: Não precisamos lembrar de Casey Affleck, né? Tem que ter coragem.

THAY: Leio esse nome e até me embrulha o estômago.

ANA LUÍZA: Exatamente. Ainda bem que não vamos precisar lidar com a cara dele na cerimônia esse ano, pelo menos. É o mínimo.

THAY: MAS TEM O GARY OLDMAN. Desde que eu descobri que ele é um embuste que minha vida não tem mais sossego.

JESSICA: Eu me decepcionei real com o Gary, agora quero distância. Pior que isso apenas Dustin Hoffman e sua turma, né.

TANY: Nossa, muito triste… Eu também não imaginava, mas hoje em dia aprendi a não ficar mais surpresa, infelizmente.

ANA C.: Se a gente for elencar, as decepções são muitas, né? Acho que até hoje nenhuma foi pior pra mim do que o Michael Fassbender. Infelizmente, não dá pra ficar surpresa.

THAY: Mas vamos deixar os embustes pra lá e falar dos filmes? Quais vocês acham que deveriam estar indicados a Melhor Filme e não estão? Ou filmes que estão indicados e não deveriam?

ANA LUÍZA: MUDBOUND!

THAY: MUDBOUND, SIM, DEMAAAIS!!!!!!

JESSICA: Lá vou eu ser excluída do fandom da Meryl Streep, mas The Post – A Guerra Secreta deveria ter ficado de fora. Traz Mudbound, poxa!

TANY: Eu não vi Mudbound ainda, mas queria demais. The Post poderia dar o lugar e nem vi o filme, mas parece menos interessante que o resto. Também acho que O Destino de Uma Nação podia ter ficado de fora porque nossa, cansei de biografia de homens.

THAY: Então, eu não assisti a todos os filmes, nunca consigo fazer isso, mas Mudbound mexeu demais comigo. O filme é redondinho, 10/10, não consigo parar de pensar sobre e super deveria ter sido indicado. E Dee Rees para Melhor Diretora também. Eu adorei Lady Bird: A Hora de Voar, adoro Greta Gerwig, adoro Saoirse Ronan, mas aquele lugar deveria ter sido de Mudbound.

ANA C.: Ainda preciso ver Mudbound, mas gente… O Destino de Uma Nação foi um porre insustentável.

JESSICA: O Destino de Uma Nação foi tenebroso e olha que eu amo filmes históricos.

TANY: Queria muito duas mulheres como indicadas, mas tá foda.

THAY: Ou que tirasse O Destino de Uma Nação e colocasse Mudbound e Lady Bird.

ANA C.: Eu ainda não vi esse, mas eu tiraria O Destino de Uma Nação, não Lady Bird. Tiraria The Post, ou Dunkirk.

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“Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississípi”

ANA LUÍZA: É engraçado quando a gente começa a prestar atenção e percebe que mesmo que os títulos sejam diferentes, os indicados sempre seguem um padrão. Estão sempre lá os filmes de guerra, os biográficos — preferencialmente de época —, um ou outro filme indie, e por aí vai. Li esses dias um comentário que o motivo pelo qual Mudbound não tinha sido indicado era porque a cota de filme “negro” já havia sido preenchida por Corra!, enquanto Projeto Flórida ficou de fora das categorias maiores porque já tinham filmes indies lá — não lembro se o comentário referenciava Me Chame Pelo Seu Nome ou Lady Bird. Não existe nenhuma prova de que é assim que acontece, mas faz muito sentido.

JESSICA: The Post foi uma grande decepção no aspecto histórico também, em muitos momentos a Meryl parecia a Margaret Thatcher interpretando.

ANA C.: Achei pombo demais esses três.

THAY: Ou tirassem The Post, mas que tivessem incluído Mudbound na parada. Isso o que você comentou faz muito sentido, Ana Luíza. Você já até havia me falado isso antes e eu fiquei pensando nisso por muito tempo.

TANY: Sim, Ana Luíza, eu li a mesma coisa e faz muito sentido já que eu acho que o Oscar é um puro jogo de marketing. Geralmente alguns estúdios menores só podem vender um filme enquanto os irmãos Weinstein estavam aí cheios de dinheiro e contatos e poderiam vender quantos filmes quisessem.

JESSICA: Nossa, Ana Luíza, faz todo o sentido! E como a Academia dá preferência para premiar atores que trabalharam em filmes biográficos? Meryl de Margaret Thatcher, Marion Cottilard de Edith Piaf, agora o Oldman, enfim… Que gastura, sabe.

THAY: O que é uma pena, se parar pra pensar.

ANA LUÍZA: Eu gostei bastante de O Destino de Uma Nação, mas como disse antes, eu sou 100% o tipo de pessoa que gosta de filmes chatos de época. The Post não vi, mas todo mundo disse que é péssimo.

THAY: Pelo menos nessa leva dos biográficos a gente ganhou Eu, Tonya e Margot Robbie.

JESSICA: Os dias dos Weinstein estão contados, eles estão falindonão vou dizer que não comemorei.

TANY: A realidade é que a quantidade de pessoas que quer ver filme sobre um homem negro, sobre a história de uma mulher, ou sobre a realidade não histórica/suburbana de minorias é muito pequena. Eles querem os filmes que não cutuquem eles. Eu, Tonya não vi, mas quero demais.

THAY: É verdade Tany, eles preferem ficar quietinhos e confortáveis.

JESSICA: É mesmo se é pra mexer na ferida que seja falando sobre coisas históricas que são de consenso geral, do tipo: o nazismo foi ruim e precisamos combatê-los — tipo O Destino de Uma Nação.

ANA LUÍZA: É uma pena de fato, porque querendo ou não, o Oscar ainda é uma vitrine incrível.

TANY: Tipo, as músicas… meu Deus do céu, como colocam músicas chatas todos os anos. Sempre um musical que geralmente nem é bom (e eu amo musicais) e sempre uma trilha sonora indie que de séculos em séculos, ganha.

ANA C.: Um filme de guerra, um filme biográfico, um filme de white-drama com personagem pretensioso, uma investigação jornalística, um indie… Aí geralmente tem um filme pra contemplar alguma minoria. É horrível dizer isso, mas sinto muito isso do Oscar.

TANY: Não é horrível, Ana, é honesto! Por isso a audiência da cobertura televisiva da cerimônia cai a cada ano. Tem prestígio em Hollywood, para quem gosta de cinema ou dessa cultura, mas fora disso, ninguém liga.

ANA LUÍZA: Mas é total isso que acontece mesmo, amiga.

THAY: Vai ver que foi por isso que Mudbound ficou de fora, toca numa ferida que ainda tá aberta. Os nacionalista brancos, a Ku Klux Klan, o [Donald] Trump se fazendo de planta. O filme se passa em 1945, mas podia muito bem ter sido ontem.

ANA LUÍZA: Thay, isso faz muito sentido! Querendo ou não, a Academia ainda é um lugar de homens velhos e brancos que fazem filmes pra outros caras velhos e brancos. Eles ainda são muito resistentes com negros e mulheres. Foram preciso noventa edições pra indicarem uma mulher por fotografia, sabe? E a gente PRECISA saber que essas mulheres existem, precisa ter contato com o trabalho delas. O mesmo sobre outras minorias que a muito custo ganham algum espaço, mas muitas vezes acabam apagadas por outras circunstâncias. Moonlight: Sob a Luz do Luar ter vencido ano passado foi revolucionário, mas tudo aconteceu de um jeito tão errado que o filme acabou ofuscado pela confusão.

“Corra!”

JESSICA: Foi mesmo! Eu fiquei muito feliz, aquela troca de envelopes foi um sopro de esperança, de que as coisas podem mudar. Mas vai demorar e isso me deixa um pouco nervosa de vez em quando. Eles não tinham dado um mexe nos votantes? Queria saber quantos ainda são esses homens velhos e brancos (spoiler: deve ser 95%).

THAY: Eu li que a Cheryl Boone Isaacs, a presidente da Academia do ano passado, andou movimentando as coisas por lá, mas a maioria segue sendo homens brancos.

ANA C.: Homens brancos e velhos são a ruína de tudo, né mores.

ANA LUÍZA: Com o tempo vai mexendo, é claro, gente nova vai chegando, etc. Mas não tenho dúvidas de que eles ainda são maioria. Hoje estava lendo o texto da Thay sobre mulheres diretoras e alguns vencedores na categoria de Melhor Direção são escolhidos por trabalhos tão qualquer coisa que dá um desânimo real.

JESSICA: A galera tem que aprender com Cannes que, neste aspecto, é uma premiação que me parece muito mais aberta a receber filmes que saiam do espectro que a Ana citou anteriormente. Aprenda, Hollywood, mon amour.

ANA LUÍZA: O cinema francês sempre foi muito mais aberto que o norte-americano.

TANY: Vai demorar demais pra mudar isso, e eu acho que a mudança só vai ficar mais forte conforme esse povo for morrendo. Até lá… Sempre vai ter um peso maior do que outro. Eles contam muito. Tinha abusador até esse ano votando nos filmes do Oscar anualmente por décadas então, no final, acho que a gente nem sabe todo mundo que tem poder de voto ali.

ANA LUÍZA: Eu tive que rir, mas é exatamente isso: quando esse povo começar a morrer, talvez as mudanças comecem a ser mais efetivas. E como eles deixam passar uma coisa dessas? Como eles continuam indicando gente como Roman Polanski e Woody Allen? É muita hipocrisia.

TANY: Gente, mas só assim, juro que em vários problemas de discriminação só o pessoal morrendo porque não adianta mudar a cabeça de pessoas mais velhas. Simplesmente poucas vão funcionar, mas continuemos tentando.

THAY: A diversidade dos indicados só acontecerá de fato quando eles tiverem diversidade lá dentro.

ANA C.: Mas então, amigas, que filme vocês acham que levam? E qual vocês gostariam que levasse?

ANA LUÍZA: Eu queria muito que Corra! ou Me Chame Pelo Seu Nome levasse Melhor Filme.

TANY: Eu queria que Me Chame Pelo Seu Nome ou Corra!, mas fico entre Corra! ou A Forma da Água. Se eles premiarem como diretor a Greta Gerwig ou o Jordan Peele daí esquece, eles vão dar pra um filme “comum”. Se eles não premiarem, aí pode ser que o de Melhor Filme ganhe. Eles não são tão legais assim.

JESSICA: Eu queria que Trama Fantasma vencesse, mas acho que A Forma da Água vai levar.

ANA C.: Eu também, Ana Luíza! Torço pra Me Chame Pelo Seu Nome ou Corra!. Mas acho que Três Anúncios Para Um Crime leva.

THAY: Acho que eu ficaria com Me Chame Pelo Seu Nome, mas é uma escolha totalmente pessoal e baseada em sentimentos somente.

JESSICA: Minha escolha com Trama Fantasma também se baseia neste critério, Thay, então tudo bem.

ANA C.: Por que você acha que A Forma da Água leva, Jé? Eu acho um filme tão fantasia pro Oscar…

TANY: Nossa, Três Anúncios Para Um Crime pode levar mesmo! Eu não acho que Me Chame Pelo Seu Nome leva porque dois filmes gays em dois anos seguidos? Não mesmo.

“Três Anúncios Para Um Crime”

ANA LUÍZA: Não acharia ruim se A Forma da Água levasse, mas Me Chame Pelo Seu Nome e Corra! me impactaram demais, acho que mereciam. Não vi Três Anúncios Para Um Crime ainda, mas ele venceu alguns prêmios importantes, então talvez possam levar o Oscar também. Confesso que estou achando particularmente difícil opinar esse ano.

THAY: Eu nunca sei analisar friamente, sou péssima pra bolão.

TANY: Também, Thay! Eu não vi todos por isso só posso falar pelos que assisti, mas tá difícil mesmo esse ano. Vocês acompanham outras premiações? Eu fico lendo sobre algumas e em cada premiação está levando um filme diferente.

JESSICA: Olha, eu acho que Três Anúncios Para Um Crime é um filme com uma mensagem muito ruim e toca em muitos aspectos delicados, não sei se levaria. Ele me parece tão anti-Oscar? Eu acompanhei quase todas, querendo morrer, mas acompanhei. As de televisão também, inclusive Feud: Bette and Joan foi esquecida e ainda não perdoei.

THAY: Três Anúncios Para Um Crime reinou no BAFTA, mas não sei se ele é muito o tipo do Oscar.

JESSICA: Ele me parece ser o que menos tem chance, embora a Frances McDormand tenha boas chances como atriz. Ela arrasou demais.

ANA C.:  Me Chame Pelo Seu Nome, Corra!, A Forma da Água e Lady Bird: qualquer um que levar, fico feliz. Para os outros filmes, não torço.

ANA LUÍZA: Eu costumava acompanhar com mais afinco, esse ano fiquei mais alheia — não totalmente, mas ainda assim. O lance é que muita gente que vota nesses outros prêmios também vota no Oscar, por isso eles acabam servindo de termômetro.

THAY: Assim, tentando pensar como um cara branco e velho, deve ser O Destino de Uma Nação pois fala de um cara branco e velho.

TANY: Acho que o Oscar de Melhor Atriz é Frances McDormand ou Saoirse Ronan, Jé!

THAY: Eu daria o Melhor Atriz pra Margot Robbie.

ANA LUÍZA: Lady Bird não acho que mereça tanto. É um filme lindo, delicado, sensível à beça, mas tem indicados bem mais merecedores. Meu maior medo é acabar indo pra O Destino de Uma Nação ou Dunkirk.

TANY: Eu ainda acompanho vividamente, mas esses últimos anos tem sido mais fácil em quesito filmes, diferente de antes, porque tem histórias mais interessantes.

THAY: Eu adoro a Saoirse, mas não vi nada de revolucionário na atuação.

TANY: Se eles derem pra Saoirse vai ser pelo pacote da obra tipo Natalie Portman, e vários outros, mas também acho que não.

JESSICA: Eu achei que só eu estava com esse sentimento em relação à Lady Bird, que coisa boa saber que só eu não vi tanto esse hype.

ANA C.: Eu vou pessoalmente tacar fogo em Hollywood se Dunkirk ou O Destino de Uma Nação levarem.

JESSICA: Dunkirk, ainda não vi, fiquei traumatizada com O Destino de Uma Nação, então estou dando um tempo para os filmes sobre guerra.

THAY: Eu gosto de Dunkirk por adorar filme de guerra, mas seria apenas premiar mais do mesmo.

ANA LUÍZA: Sim, também amo filme de guerra, mas a gente não precisa de mais um filme sobre guerra que não apresenta nada de novo sendo premiado. Me falem sobre as mulheres na guerra e talvez eu mude de opinião.

THAY: Ah, pode ser. Mas logo a Saoirse tá em outro filme com um papel mais interessante, tipo na adaptação do livro do Ian McEwanOn Chesil Beach, que está chegando.

JESSICA: Ansiosa por esse papel, esse parece ser foda. Ian e seus livrões.

“Eu, Tonya”

ANA C.: Gente, eu amei Lady Bird de uma maneira que não sei nem explicar. Eu passei o filme todo chorando.

ANA LUÍZA: Ia falar isso. Também acho que se ela levar, vai ser mais pelo conjunto da obra do que pelo trabalho específico — o que é meio errado, mas acontece. Faz tempo que ela chega perto, então talvez seja a hora. Justiça não é o forte do Oscar. Só lembrar do ano passado, com Emma Stone levando em cima da Isabelle Huppert. Jamais vou engolir isso.

JESSICA: Isabelle Huppert e Emmanuelle Riva, as maiores injustiçadas do Oscar e tenho dito.

THAY: Emma Stone é um amorzinho, mas o papel dela em La La Land era pouco perto do da Isabelle.

ANA LUÍZA: Eu amei La La Land, mas o papel da Emma era bem qualquer coisa.

THAY: Eu gosto de La La Land, mas não é aquela paixão toda. Tipo, é fofo, chorei, vida que segue. O mesmo que senti com Lady Bird.

TANY: Isabelle Huppert tirou meu coração, e nem de La La Land eu gostei.

JESSICA: Não gostei de La La Land também.

ANA C.: La La Land morri chorando também, então óbvio que amei. Eu acho que eu tenho uma experiência catártica por Oscar, do tipo chorar de lavar a alma. Amo.

THAY: E A FERNANDA MONTENEGRO!

JESSICA: FERNANDA MONTENEGRO, É VERDADE!

TANY: NOSSA, NUNCA NA VIDA!

ANA LUÍZA: A FERNANDA!

TANY: O mais perto que a gente chegou e vai chegar em algumas décadas. Uma Anitta do cinema brasileiro pra pegar esse Oscar que nos devem.

JESSICA: Já que a Sônia Braga foi esquecida.

THAY: A Sônia Braga, esqueceram ela demais.

ANA LUÍZA: La La Land me tocou do jeito mais pisciano possível. É um filme sobre uma indústria que ao mesmo tempo que é mágica, é cruel demais, e estando em alguma medida nesse meio, às vezes eu preciso dessa dose de magia pra lembrar porque eu estou nessa caminhada, porque a gente se esforça tanto, etc. É um motivo totalmente pessoal.

JESSICA: Eu tentei criar uma conexão com a passarinha, mas não consegui. Confesso que me senti muito mal, ainda me sinto. Quero dar uma segunda chance, assim como o La La Land. Acho que ambos os filmes merecem.

TANY: Não revi La La Land, mas queria fazer o mesmo.

JESSICA: Mas pra não dizer que não falei de flores, eu adorei aquele pôster da Ingrid Bergman que a personagem da Emma Stone tem no quarto dela. Eu entendo muito o amor dela pelo cinema. Aquele pôster falou comigo.

THAY: Acho que a protagonista de Lady Bird é muito pretensiosa, e ao mesmo tempo que isso a faz identificável pra um monte de gente, afasta outras. Se eu chegasse pra minha mãe e dissesse que quero que me chame de “Lady Bird” daqui em diante, ela ia me mandar lavar uma louça pra criar juízo.

ANA LUÍZA: Mas ela é adolescente! Eu me identifico demais com as brigas que ela tinha com a mãe porque quando era mais nova eu tinha MUITAS com a minha. Era como existir em uma corda bamba de muito amor e ao mesmo tempo estar numa frequência tão diferente. Mas a gente amadurece e acho que o final mostra muito isso.

THAY: Mas então, mesmo se eu fosse adolescente e chegasse assim pra minha mãe, ela ia rir da minha cara. E entendo demais que ela é adolescente, acho que eu era pedante igual, mas não é filme pra levar estatueta. E isso que eu estou dizendo que gostei.

ANA LUÍZA: Consegui ter essa conexão com Lady Bird, e ainda acho que é um bom filme. Mas Me Chame Pelo Seu Nome me impactou mais. É um filme lindo, é diferente (o que eu acho importante em uma premiação como o Oscar em que todos os filmes seguem fórmulas muito parecidas dentro do gênero que exploram) e tem uma mensagem tão bonita. Você sente o tempo todo e sentir pra mim é algo muito fundamental, é o que faz essa merda ser mágica, que faz a gente ir pro cinema e amar pessoas que nem existem.

THAY: Eu gostei mesmo de Lady Bird, rolou risos e lágrimas, mas não foi tudo isso de “nossa, merece todas os Oscars!” Vou ficar feliz se ganhar por aquilo que representa, mas não acho que mereça realmente. Me conectei muito mais com Me Chame Pelo Seu Nome do que com Lady Bird, se é que isso faz sentido. Era possível sentir a Itália, o verão, aquela brisa de preguiça, sabe como? O filme foi perfeito.

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“Lady Bird: A Hora de Voar”

ANA LUÍZA:  Me Chame Pelo Seu Nome é perfeito demais, realmente.

TANY: Concordo, Thay! Eu queria um prêmio pra Greta porque a Greta é linda, gostei de Lady Bird, mas o problema é que ela é muito uma jovem mimada e tudo bem, eu me identifiquei e gostei, mas o que Me Chame Pelo Seu Nome faz com o coração da pessoa é demais. Eu chorei no final de Lady Bird porque me vi sendo escrota com a minha mãe da mesma maneira que a protagonista foi e dói, e é real, mas passa. O que você sente vendo Me Chame Pelo Seu Nome é um amor e uma vontade de amar que é linda. Lady Bird vai ser o filme que eu vou assistir e lembrar da minha mãe. Aliás, quero rever com ela, mas é um filme que talvez, no momento atual da minha vida, pese menos do que outros.

ANA LUÍZA: Não, a estatueta definitivamente Lady Bird não merece.

JESSICA: Quem nunca foi escrota com a mãe daquele jeito que atire a primeira pedra. Talvez isso tenha me incomodado ao ponto de causar uma repulsa em mim, é doloroso relembrar esses momentos.

ANA LUÍZA: Nem de direção eu daria pra Greta, pra ser sincera. Acho que Jordan Peele merece bem mais.

TANY: Por mim, se a Greta for filmada o máximo possível já estou feliz porque ela é muito linda, mas prefiro que vá pro Jordan também.

JESSICA: Greta correndo ao som de “Modern Love” em Frances Ha: só amor.

ANA C.: Eu não acho que mereça, mas acho um coming-of-age muito bom e lindo, e amei. Agora Me Chame Pelo Seu Nome é bem isso que Ana Luíza falou. Te dá muitos sentimentos. Os minutos finais do filme me destruíram de uma maneira que cheguei a ficar com dor de cabeça de tanto chorar. Porque ele [o filme] te faz lembrar como é bom gostar de alguém, a sensação boa que é gostar de alguém, e o quão horrível é ter o coração partido depois disso e ter que lidar com tudo. E a trilha sonora é maravilhosa.

THAY: O filme inteiro é uma obra de arte.

JESSICA: Acho que tudo em Me Chame Pelo Seu Nome trabalha pra te dar uma sensação nostálgica do que é gostar de alguém, é um filme tão trabalhado nesse sentido, eu queria morar naquela casa. E vamos combinar que a cena da fruta é digna de uma fanfiction da maior qualidade!

THAY: Quando li o livro já fiquei MEU DEUS, assistir foi entrar em combustão!

ANA C.: Eu preciso ler esse livro! Meu amigo leu e teve esse mesmo sentimento, Thay.

ANA LUÍZA: Mas é muito verdadeiro o que a Jéssica falou. Me Chame Pelo Seu Nome trabalha demais com sensações, e faz isso tão bem que do outro lado a gente realmente sente aquilo tudo. É muito doido e muito precioso.

JESSICA: É incrível isso, né? As cores, a maneira como a câmera entrega aquela imagem pra ti, é tudo bem pensado. E aquele ar europeu que a gente ama. Eu saí apaixonada por todos, especialmente pela Esther Garrel, que interpreta a Marzia.

ANA LUÍZA: Ele é muito europeu. Você percebe na hora os maneirismos e é lindo, lindo demais.

THAY: Eu não assisti Corra! ainda, mas nossa, seria demais o Jordan Peel ganhar e estou dizendo só de coração mesmo.

ANA LUÍZA: Amiga, assista Corra! Minha cabeça explodiu com aquele filme de tão bom. Peele merece demais levar o prêmio de direção.

TANY: Me Chame Pelo Seu Nome vai ficar na memória porque o filme é isso: sentimentos. Corra! eu acho mais urgente ganhar.

ANA C.: Concordo, Tany. Corra! levar é o ideal, e merecidíssmo. Por sinal, eu acho que a Alisson Williams merecia uma indicação de Atriz Coadjuvante.

ANA LUÍZA: Depois que assisti o filme, confesso que fiquei sem entender porque ela não foi ao menos indicada. Merecia demais mesmo.

TANY: Ai, Alisson Williams por mim não merece é nada. Foi uma boa atriz, mas não achei nada demais!

ANA LUÍZA: Nossa, eu achei ela tão boa!

ANA C.: Eu achei ela tão ótima, a cena dela procurando a chave é muito convincente. Pra mim ela entraria no lugar da Lesley Manville, de Trama Fantasma.

ANA LUÍZA: Nossa, essa cena da chave é fantástica!

TANY: Eu acho a atuação dela mediana, mas eu nunca conseguiria.

“A Forma da Água”

ANA LUÍZA: Pra quem vocês acham que vai/deveria ir Atriz Coadjuvante?

TANY: Laurie Metcalf das que eu vi! Mas amaria a Octavia Spencer porque ela merece tem anos!

JESSICA: Eu adorei a Lesley Manville, a indicação dela aqueceu meu coração. É um papel muito delicado, muito pelas beiradas, e que é difícil perceber isso num primeiro momento. Eu adorei cada segundo em que ela esteve no filme.

ANA C.: Acho que pra Mary J. Blige, pelo que a Thay comentou. Mas torço pra Laurie Metcalf.

JESSICA: Torço pela Lesley, mas ficaria feliz pela Laurie Metcalf e pela Allison Janney, de Eu, Tonya.

ANA LUÍZA: Até o momento, minha torcida também é da Laurie Metcalf, mas Mary J. Blige também seria uma ótima escolha.

TANY: Mary J. Blige sim, mas acho que ela e a Lesley Manville tem menos chances. Se não for a Laurie vai ser a Alisson ou a Octavia por prêmio de carreira. Se eles forem ousados, Octavia e se forem mais tradicionais é a Alisson.

THAY: Não assisti a todos os filmes, mas Allison Janney está ótima em Eu, Tonya. Mas a Mary J. Blige em Moudbound também. Tem coisa que ela passa só com o olhar, uma tristeza infinita. E a personagem dela não é de falar, falar, então ela me impactou bastante.

ANA C.: E Melhor Atriz, quem vocês acham que leva? Eu acho que a Frances McDormand leva, mas a Sally Hawkins também merece.

JESSICA: Acho que é capaz de a Frances McDormand levar, mas ficaria contente pela Margot Robbie também.

ANA LUÍZA: Ainda não assisti todos os indicados, mas acho que Frances McDormand tem uma chance real de levar olhando pra outras premiações.

THAY: Acho que a Frances McDormand leva, mas só por conta das outras premiações que já deram o troféu pra ela. Pessoalmente, adoraria a Margot Robbie.

TANY: Concordo com a Ana! Eu estou entre Frances McDormand e Sally Hawkins também.

ANA LUÍZA: Fico entre as duas também! Agora, Melhor Ator, vocês acham que alguém tira do Oldman?

JESSICA: O Daniel Day-Lewis!

ANA LUÍZA: Sério? Ainda não assisti Trama Fantasma…

JESSICA: Olha, se não tirar, deveria, porque ele está fantástico no filme.

ANA C.: Eu iria amar o Daniel Kaluuya! Mas não sei não, o Daniel Day-Lewis está muito bom em Trama Fantasma.

THAY: Tem o Denzel Washington também, poderia levar.

JESSICA: Eu acho que ninguém tira, mas todos os indicados mereciam.

TANY: Qualquer Daniel, mas o Daniel Day-Lewis talvez? Por ter falado que vai se aposentar, etc? Deve ser mentira, mas sei lá…

JESSICA: Pois é, ouvi essa história também!

ANA C.: Eu não consegui gostar do Churchill do Gary Oldman porque fiquei com o John Lithgow de The Crown na cabeça.

ANA LUÍZA: Os votantes do Oscar amam um papel tipo o dele como Churchill, que exige uma mega transformação. Eu gostei dele, mas em comparação, acho o John Lithgow um Churchill muito melhor.

JESSICA: “Eu não consegui gostar do Churchill do Gary Oldman porque fiquei com o John Lithgow de The Crown na cabeça”. Sim!

THAY: O Churchill do Lithgow é tão ótimo.

ANA LUÍZA: Tem uns momentos que achei o Churchill do Oldman muito afetado? Caricato demais?

JESSICA: Por que esse caricato dele me lembrou tanto a Margaret Thatcher da Meryl?

ANA C.: Sim! Tive a mesma impressão, Ana Luíza.

oscar
“Trama Fantasma”

JESSICA: Eu também acho que eles carregaram demais nesse aspecto. Tanto na Thatcher quanto no Churchill.

ANA LUÍZA: De fato. Acho que é um risco que se corre ao interpretar uma figura histórica tão icônica, tão cheia de trejeitos.

JESSICA: Pois é, acho que eles tentam humanizar e acabam sendo caricatos. É sempre minha impressão.

THAY: De coadjuvante tem o Christopher Plummer que entrou no lugar do embuste do Kevin Spacey, em Todo o Dinheiro do Mundo.

JESSICA: Essa foi a melhor pegadinha do Oscar dos últimos anos.

TANY: Acho que ninguém nem viu esse Todo o Dinheiro do Mundo, porque nem editado deve estar. Devem ter mandado o pessoal que vota do Oscar nas filmagens pra conferir a performance.

ANA C.: Eu gostei do Richard Jenkins. Mas não assisti Projeto Flórida ainda.

ANA LUÍZA: Também gostei do Jenkins, mas foi o único que assisti até agora, então não tenho muito como opinar.

JESSICA: Também não assisti Projeto Florida, estou curiosa, vi algumas pessoas falando bem.

ANA LUÍZA: As surpresas desse ano foram ótimas. Não sei se vocês acompanharam quando os indicados foram revelados, mas a reação das pessoas foram muito boas.

THAY: Tiffany Haddish, que estava anunciando, é ótima!

ANA LUÍZA: Sim! E foi contagiante demais. Eu lembro que fiquei quicando na cadeira de empolgação, muito porque a plateia era muito empolgada também. O tanto que foi bonito a hora que anunciaram Corra! a Melhor Filme não está escrito. Um momento desses podia demais se repetir na cerimônia. Seria histórico.

TANY: Triste a empolgação porque depois a realidade é outra, né? Mas a gente está aqui falando sobre o Oscar então temos que ter alguma fé.

JESSICA: Se a gente chegou até aqui, é porque alguma esperança existe. Acho que ninguém passa por essa saga de ver quase todos os filmes pra morrer na praia (ou não).

ANA LUÍZA: Exatamente. Depois do anúncio eu fiquei muito empolgada, mas foi só ver pra onde os outros prêmios estavam apontando que essa empolgação caiu por terra. O bom, no final das contas, é que pelo menos esses filmes vão receber alguma visibilidade. Estrelas Além do Tempo está aí pra provar que a estatueta até pode não vir, mas que o impacto de um filme pode ser imenso independente disso.

TANY: Eu nunca consegui assistir a todos os indicados do Oscar na minha vida! Queria, mas não dá. A cada ano os filmes ficam um pouco melhores então eu consigo ver um pouco mais, pelo menos. Vocês concordam que os filmes estão melhorando conforme o ano?

THAY: Se você quer dizer que melhorando significa ampliando as narrativas, eu até concordo.

TANY: Acho que quero dizer na forma de serem mais interessantes. Filmes que, normalmente, não veríamos indicados ao Oscar e que chamariam atenção exatamente por isso. Mas se formos colocar no papel quantidade, até impacto, realmente não é uma linha contínua.

ANA LUÍZA: Acho que depende muito do referencial. Ano passado a gente teve três filmes com protagonistas negros indicados a Melhor Filme, esse ano temos apenas um. Em compensação, tem um filme dirigido por uma mulher. Sem dúvida o prêmio está caminhando para um lugar melhor, mas ainda acho que é preciso fazer muito mais, visto que os votantes ainda continuam muito resistentes sobre esse mais. Pelo menos eles estão tentando. Melhor do que não fazer absolutamente nada.

JESSICA: Eu não sei se melhorar seria a palavra certa, mas eu percebo uma mudança, sim. Pelo menos estamos falando sobre todas essas questões, a falta de representatividade e tudo mais, então acho que os filmes estão começando a refletir isso, ainda de que forma tímida.

THAY: Acho que dias melhores virão, e o que a gente está vendo agora são os primeiros passinhos nessa direção. Com muita pressão, sim, mas pelo menos estamos caminhando.

TANY: Sim, é isso.

ANA LUÍZA: Nas categorias técnicas, vocês arriscam algum palpite?

THAY: Sei vários nadas de categoria técnica, mas amo o figurino de A Bela e A Fera, por exemplo, feito pela Jacqueline Durran, que concorre também por O Destino de Uma Nação.

JESSICA: Meu conhecimento sobre categorias técnicas é quase nulo, mas arrisco um palpite: Oscar de Melhor Trilha Sonora pra Trama Fantasma.

“The Post – A Guerra Secreta”

THAY: A fotografia de Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississípi é linda mesmo com toda a lama e a chuva, que acabam virando dois outros personagens da história, então eu super votaria na Rachel Morrisson, mas sou suspeita para falar.

TANY: Não sei nada de categoria técnica também. No máximo acho que a música de Me Chame Pelo Seu Nome talvez possa ganhar.

JESSICA: A música de Me Chame Pelo Seu Nome é um negócio lindo, seria maneiro se ganhasse mesmo. Esse ano tem umas categorias meio difíceis de adivinhar, todas são boas.

TANY: Acho que figurino pode ficar com Trama Fantasma. E maquiagem deve ser O Destino de Uma Nação.

ANA LUÍZA: Esse ano está muito difícil, mas por enquanto acho que A Forma da Água, Blade Runner 2049 e Dunkirk levam as categorias de mixagem, edição e fotografia. Som é uma área que, confesso, não sou muito familiarizada, mas esses filmes têm bem cara dos que costumam levar os prêmios; o som costuma ser uma parte muito fundamental em filmes de guerra, muito da construção narrativa acontece ali. Acho que tanto Blade Runner quanto Dunkirk têm chances nesse aspecto porque os dois são dirigidos por caras super preocupados com isso, que fazem coisas grandes, bem do jeito que o Oscar gosta. E maquiagem também acho que O Destino de Uma Nação leva. Figurino não lembro quem concorre.

JESSICA: Saudades do meu Blade Runner, também foi esquecido em algumas categorias. O figurino certamente fica com Trama Fantasma. Que trabalho maravilhoso, aquelas roupas falam conosco durante a história. O Willcock poderia fazer roupas para mim, eu não me importaria, não.

ANA LUÍZA: Eu tenho MUITAS questões com Blade Runner. Muitas mesmo. Amo Denis Villeneuve e tecnicamente é um filme que acho impecável. Mas me incomoda muito como ele coloca as mulheres dentro da narrativa mesmo que se trate de um futuro distópico.

TANY: E animação? Assistiram algum?

JESSICA: Nenhum, infelizmente. Essa foi a categoria que eu mais negligenciei.

ANA C.: Animação eu sempre fico muito por fora.

THAY: Não assisti nada também, uma pena.

TANY: Nem eu, mas com certeza Com Amor, Van Gogh ganha. É o que mais quero ver, aliás.

ANA LUÍZA: Li que O Touro Ferdinando é uma gracinha e Com Amor, Van Gogh realmente deve ser um trabalho fantástico.

ANA C.: Eu tento assistir os da categoria Melhor Filme, o resto é lucro. Essa semana quero assistir alguns outros, mas bem pontuais.

JESSICA: E documentário? Assistiram algum?

TANY: Não, e nem de filme estrangeiro, mas esse foi por falta de tempo porque felizmente dos cinco indicados, três estão na minha lista. E um com atriz transexual falando do amor de uma trans. Seria lindo se ganhasse, mas não sei se seria possível.

JESSICA: Eu também não vi nenhum filme estrangeiro, mas quero fazer isso se der. Acho uma das categorias mais interessantes do Oscar. Quanto aos documentários, eu só vi dois mesmo: Icarus e Visages Villages, da Agnès Varda.

ANA LUÍZA: Quero muito assistir Visages Villages!

JESSICA: Vou panfletar à favor da Agnès Varda até ela levar o Oscar!

TANY: Documentário eu raramente assisto. Lembro que ano passado tinham alguns que eu queria ver, mas esse ano esqueci total da categoria além do da Agnès. Curta eu nem comento…

JESSICA: É lindo, eu nem tenho palavras. É um cinema tão delicado, um cinema das pessoas, ela merece demais.

“O Destino de Uma Nação”

ANA LUÍZA: Aliás, uma pergunta: o que vocês acharam do Brasil mais uma vez ficar de fora da premiação?

TANY: Eu fiquei triste, mas sabia que um filme como Bingo: O Rei das Manhãs não iria entrar. Porém, fiquei feliz que eles escolheram outro tipo de filme que não fala da violência para concorrer. Foi uma escolha ousada, mas interessante e o filme é bom.

ANA LUÍZA: Não dá nem pra dizer que a culpa é só nossa porque o acesso a uma parte desses filmes é bem difícil, tipo os curtas. Eu acabo nunca assistindo porque não acho mesmo.

JESSICA: Nossa, é verdade. Encontrar filmes brasileiros é mais difícil que encontrar um filme raro dos anos 20, é frustrante. Isso quando eles nem passam pelos cinemas, aí só contamos com o Canal Brasil, e olhe lá também.

ANA LUÍZA: Eu tinha esperanças sinceras que Bingo entrasse justamente porque era diferente de tudo que o Brasil já tinha mostrado antes. Fiquei triste que ele não tenha conseguido no final das contas, mas acho que foi uma escolha muito boa, ao contrário do ano passado. Só o Canal Brasil pra nos salvar mesmo, viu?

JESSICA: Adorei Bingo! É a nossa televisão, né? Achei um filme super interessante.

TANY: Sim! E Leandra Leal rainha! Eu achei um filme bem legal. Interessante, fala da nossa história, mas ele não tem cara de Oscar mesmo.

THAY: Sou um sincero fracasso em se tratando de cinema nacional, preciso melhorar muito. Mas eu achei legal Bingo ter sido escolhido, ainda que não tenha entrado. É bem diferente do “padrão Brasil” de cinema.

TANY: Felizmente o “padrão Brasil” tem mudado. Estou aos poucos assistindo mais filme brasileiros porque, felizmente, eles tão indo pra todos os lados/gêneros e isso é ótimo.

ANA LUÍZA: Bingo é bom demais! E o Brasil tem tanta história pra contar ainda, tanta gente esperando pra virar personagem no cinema. Ano passado assisti filmes muito diferentes entre si, distantes de tudo aquilo que a gente costuma entender como cinema brasileiro, e foi TÃO BOM! É muito bacana ver produções nacionais tão distintas e ricas sendo feitas, indo parar nos cinemas do país inteiro.

JESSICA: É, o Bingão é muito diferente mesmo. Ele tem uma coisa realness, uma coisa bem Brasil, acho que é porque fala de algo que a gente conhece muito, a TV. E esse lado trash da nossa TV.

THAY: Sim, isso é maravilhoso! Como Nossos Pais é um que quero muito assistir, principalmente depois da crítica que Anna Vitória escreveu pro site.

ANA LUÍZA: Como Nossos Pais é incrível também. O Filme da Minha Vida foi outro que me apaixonei no ano passado. A crítica pro site nunca saiu, mas amei muito, muito.

JESSICA: Estou apenas esperando as cinebiografias de mulheres maneiras, porque a tendência é que está virando musical (vide musical da Hebe Camargo e da Bibi Ferreira), mas eu queria ver isso indo pro cinema.

THAY: E a Hebe vai ganhar série com a Andrea Beltrão ainda!

JESSICA: Vai? Acabei de ler uma biografia sobre a Hebe e estou maravilhada. Eu fiquei feliz com a notícia, porque o preço dos musicais é um pouco salgado e o público fica restrito. Nós precisamos descobrir as personalidades fabulosas que temos espalhadas pelo Brasil, principalmente de mulheres.

THAY: Ainda mais se isso puder chegar ao Oscar um dia. Seria maravilhoso.

TANY: Tem tanta gente que deveria ter filme, tanta mulher foda, meu Deus, tanta. Tanto homem brasileiro também e aí não tem nada. Poucos são os que saem, tipo o da Elis Regina, e poucas pessoas assistem. Queria demais assistir Como Nossos Pais também! Tem um de terror com a Sandy de que falam bem demais.

ANA LUÍZA: UM TERROR COM A SANDY! Brasil, único país possível.

JESSICA: TERROR COM A SANDY? WHAT

THAY: TERROR COM A SANDY, vivi pra ver isso!

TANY: Gente, sério!!!!

ANA LUÍZA: Só o fato de ser filme brasileiro já afasta muita gente. Rola um preconceito, não tem como negar. Mas pelo menos agora a gente está em uma fase muito boa, acho que a tendência é o Brasil crescer cada vez mais. A internet ajudou muita gente que produzia de forma independente a colocar seu trabalho no mundo, fora os festivais, que sempre foram uma vitrine ótima tanto pra gente que era mais experiente quanto pra gente que estava começando. Ver o Brasil ganhar um Oscar: uma esperança real. De modo geral, quais são as expectativas de vocês pra noite do dia 4?

TANY: É só ver uma pessoa que não seja “homem branco hétero” ganhando. De verdade. Não vou me iludir, queria minorias em todas as categorias, mas é impossível, então um prêmio e discursos que possam ser reproduzidos já ajudariam. Mas o meu sonho é a gente sair dessa premiação sentindo que um passo definitivo foi dado.

JESSICA: Minha expectativa é de que a gente saia do espectro “homem branco hétero”, pelo menos um pouco. Quero ver discursos cutucando a ferida no sistema, já que sabemos que as minorias não irão vencer em todas as categorias. E que esse tom engraçadinho do Oscar possa sumir, afinal, embora o Leifert discorde, cinema é muito politizado sim. E isso precisa aparecer no dia 4 de março.

ANA C.: Espero que essa cerimônia realmente entregue as mudanças que o Oscar está precisando, que honre o momento que estamos vivendo agora. Espero que não premie de maneira óbvia e segura. E eu espero, de verdade, que seja divertida e suportável, e nos dê grandes discursos e bons momentos pra lembrarmos por muito tempo.

ANA LUÍZA: Como toda cerimônia, acho que o Oscar desse ano vai, sim, ter algumas decepções e frustrações, além de vencedores óbvios em certas categorias. No momento, minha maior expectativa é que a Academia comece a repensar suas escolhas e levar em conta tudo que tem acontecido na indústria cinematográfica nos últimos anos. Não acho que vamos ver grandes mudanças, mas já sabemos que podemos contar com pessoas dispostas a promover essas mudanças, que estarão lá na noite do dia 4 de março e certamente vão jogar luz sobre essas questões, seja no tapete vermelho ou em seus discursos. Que isso sirva pra chamar a atenção do mundo inteiro e que ano que vem a gente possa se reunir de novo pra falar sobre indicados muito mais diversos do que dessa vez.