Categorias: CINEMA

Oscar de Melhor Direção: 5 mulheres indicadas em 90 anos

Em 2018, o Oscar chega à sua 90ª cerimônia mantendo-se firme como a premiação mais conhecida e tradicional do cinema norte-americano. Entre as categorias mais disputadas, destacam-se as de Melhor Atriz e Melhor Ator, a de Melhor Filme e, claro, a de Melhor Direção. Em nove décadas de entregas do Academy Awards, no entanto, apenas cinco mulheres foram indicadas à categoria de direção, das quais apenas uma levou a estatueta para casa: Kathryn Bigelow pelo filme Guerra ao Terror, em 2010. De lá para cá, os clamores por maior diversidade e inclusão se tornaram mais altos, mas as mudanças parecem ocorrer em um ritmo lento: novamente, estamos prestes a acompanhar mais uma cerimônia de premiação em que apenas uma mulher figura entre os indicados na categoria de Melhor Direção.

Quando o nome de Greta Gerwig foi anunciado como um dos indicados ao prêmio, a cineasta, produtora, roteirista e atriz estava não apenas sendo reconhecida pelo seu trabalho — fato este que passou despercebido por outra grande premiação, o Globo de Ouro —, mas também fazendo história ao se tornar a quinta mulher a ser indicada em uma das mais consagradas categorias da premiação. Ainda que em 2018 possamos contar com nomes como Guilhermo del Toro, que concorre por A Forma da Água, e Jordan Peele por Corra! — que se tornou o quinto homem negro a ser indicado na categoria —, na lista de indicados, o feito de Greta, que concorre pela direção de Lady Bird: A Hora de Voar, filme do qual também é roteirista, poderia não ter sido um caso isolado, mas ser acompanhado pela cineasta Dee Ress, por exemplo, diretora do aclamado Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi, que se tornaria a primeira mulher negra a entrar na disputa — o que não aconteceu.

Desde a vitória de Kathryn Bigelow, oito anos se passaram sem que nenhuma outra mulher fosse sequer indicada à categoria. Mesmo que filmes como A Hora Mais Escura, também dirigido por Kathryn dois anos mais tarde, e Selma – Uma Luta Pela Igualdade, dirigido por Ava DuVernay, em 2014, existissem e tivessem passado pela premiação, o trabalho dessas mulheres jamais parecia suficiente para a Academia que, por sua vez, preferia simplesmente ignorá-las. De maneira a enaltecer as conquistas das cinco mulheres que, mesmo em vista de todas as dificuldades, conseguiram chegar lá — e na torcida por dias melhores para todas aquelas que vierem depois delas —, esse texto foi preparado para que possamos relembrar — ou conhecer — a trajetória de cada uma dessas mulheres, que obtiveram reconhecimento em uma indústria famosa por sua misoginia.

Lina Wertmuller por Pasqualino Sete Belezas (1977)

Lina Wertmuller já tem uma história peculiar desde o princípio: cineasta italiana, Lina descende de uma nobre família suíça e seu nome verdadeiro é de causar inveja em qualquer princesa de contos de fadas: Arcangela Felice Assunta Wertmuller von Wlgg Spanol von Braucich. Nascida em agosto de 1928, Lina foi uma criança rebelde que acabou expulsa de uma dúzia de escolas católicas enquanto seu pai sonhava que ela crescesse para se tornar uma advogada de prestígio. Contra todas as expectativas paternas, a jovem enveredou pelo teatro. Após se graduar, Lina partiu em uma turnê pela Europa com uma companhia de teatro de bonecos, trabalhando também como atriz e diretora.

Com essa experiência, Lina foi convidada, mais tarde, para ser assistente de Federico Fellini, em 1962. A parceria trouxe algum aprendizado e logo Lina estava lançando seu primeiro filme: The Lizards (ou I Basilischi, no original em italiano), que trouxe um tema que se tornaria recorrente em seu trabalho: o empobrecimento do sul da Itália. O filme que a tornaria verdadeiramente famosa e uma eterna nota de rodapé nas curiosidades acerca do Oscar — algo que viria a ofuscar sua bem-sucedida carreira anos mais tarde — era parte de uma série de quatro filmes, todos protagonizados por Giancarlo Giannini. Pasqualino Sete Belezas [Pasqualino Settebellezze], filme pelo qual Lina foi indicada, conta a história de um soldado italiano que desertou durante a Segunda Guerra Mundial e acabou capturado por alemães. Desde a indicação histórica, Lina nunca mais figurou entre os concorrentes a uma estatueta — o que é uma pena, visto que a cineasta continuou a produzir filmes de interesse e impacto. Atualmente com 89 anos, o último longa lançado por Lina foi a comédia A Casa dos Gerânios [Peperoni Ripieni e Pesc in Faccia], em 2004.

Indicados: Lina Wertmuller (Pasqualino Sete Belezas); Alan J. Pakula (Todos os Homens do Presidente); Ingmar Bergman (Face a Face); Sidney Lumet (Rede de Intrigas); John G. Avildsen (Rocky: Um Lutador).
Vencedor: John G. Avildsen (Rocky: Um Lutador).

Jane Campion por O Piano (1993)

Lina Wertmuller abriu espaço para que mulheres fossem indicadas ao prêmio de Melhor Direção, mas se passaram dezessete anos antes que outra cineasta fosse incluída novamente na categoria. Quem quebrou o jejum de quase duas décadas foi a neozelandesa Jane Campion com seu filme O Piano. A escritora, produtora e diretora nasceu em 1954 e cresceu cercada pelo mundo da arte e da interpretação: sua mãe, Edith, era escritora e atriz, enquanto seu pai, Richard, era diretor de ópera e teatro. Ainda que não pretendesse desenvolver uma carreira enquanto atriz, Jane sempre gostou de arte e suas duas graduações são relacionadas a esse mundo: ela tem um diploma de Bacharel em Artes na Victoria University of Wellington e outro em Artes Visuais (Pintura) conquistado no Sydney College of the Arts. Não satisfeita com os limites que esse tipo de representação artística acabou impondo em suas criações, Jane filmou seu primeiro curta, Tissues, em 1980, e logo começou a estudar na Australian Film, Television and Radio School para buscar novos horizontes.

Seu primeiro curta como profissional, Peel, de 1982, foi agraciado com a Palma de Ouro de Melhor Curta no Festival de Cannes, em 1986. A partir de então, Jane Campion passou a colecionar prêmios diversos com suas produções. A indicação ao Oscar de Melhor Direção veio em 1993 por O Piano, que também recebeu a Palma de Ouro no Festival de Cannes do mesmo ano. O longa conta a história de uma mulher muda, no ano de 1850, que é enviada à Nova Zelândia para um casamento arranjado; ainda que Jane não tenha conquistado o Oscar de Melhor Direção, a cineasta recebeu a estatueta de Melhor Roteiro Original. As atrizes de O Piano, Holly Hunter e Anna Paquin, esta com apenas 11 anos de idade, receberam prêmios nas categorias de Melhor Atriz e Melhor Atriz Coadjuvante, respectivamente. Jane, a segunda mulher a ser indicada como diretora, não recebeu outras indicações no Oscar, mas isso não desmerece seu trabalho. Aos 63 anos, Jane tem mais de 20 produções no currículo — entre curtas, filmes e minisséries —, além de inúmeros roteiros e projetos nos quais atua como produtora.

Indicados: Jane Campion (O Piano); Steven Spielberg (A Lista de Schindler); James Ivory (Vestígios do Dia); Jim Sheridan (Em Nome do Pai); Robert Altman (Short Cuts – Cenas da Vida).
Vencedor: Steven Spielberg (A Lista de Schindler).

Sofia Coppola por Encontros e Desencontros (2003)

Sofia Coppola nasceu em um belo berço de ouro cinematográfico: filha mais nova da cenografista e artista Eleanor Neil e do cineasta Francis Ford Coppola, Sofia cresceu cercada por cinema, arte e moda. Embora tenha tentado iniciar uma carreira como atriz — ela fez seu debute ainda criança, em O Poderoso Chefão —, Sofia decidiu manter-se atrás das câmeras após receber críticas negativas por sua atuação. Seu primeiro curta, lançado em 1998, foi Lick the Star; na sequência Sofia, dirigiu As Virgens Suicidas, em 1999, longa baseado no livro homônimo de Jeffrey Eugenides, e deu início a uma parceria duradoura com a atriz Kirsten Dunst, que viria a protagonizar, anos mais tarde, Maria Antonieta, em 2006, e mais recentemente, participar de O Estranho que Nós Amamos, de 2017.

Foi com seu segundo filme, o aclamado Encontros e Desencontros, de 2003, que Sofia conquistaria prêmios importantes e reconhecimento enquanto diretora, saindo da enorme sombra projetada pelo sucesso de seu pai. Estrelado por Bill Murray e Scarlet Johansson, Encontros e Desencontros conta a história de dois norte-americanos que veem suas vidas se cruzarem em Tóquio enquanto seguem entediados e sem rumo certo. O filme recebeu quatro indicações ao Oscar, incluindo Melhor Direção, Melhor Filme, Melhor Roteiro Original e Melhor Ator para Bill Murray. Sofia não conquistou o prêmio de direção, mas a estatueta de Melhor Roteiro Original foi para casa com ela. Encontros e Desencontros também foi aclamado em outras premiações como o britânico BAFTA, o Globo de Ouro e o SAG Awards daquele mesmo ano.

Indicados: Sofia Coppola (Encontros e Desencontros); Peter Jackson (O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei); Clint Eastwood (Sobre Meninos e Lobos); Fernando Meirelles (Cidade de Deus); Peter Weir (Mestre dos Mares).
Vencedor: Peter Jackson (O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei).

Kathryn Bigelow por Guerra Ao Terror (2010)

Antes de se graduar na Columbia University, onde conquistou seu diploma de mestrado em Teoria e Crítica de Cinema, no ano de 1972, Kathryn Bigelow frequentou o San Francisco Art Institute, onde se formou como Bacharel em Artes. As formações se complementariam e a ajudariam a transformar seus filmes, fazendo com que todos possuíssem uma linguagem apenas dela. Foi em 1978 que a cineasta começou seu primeiro curta, The Set-Up, com um roteiro que procurava desconstruir a violência. Alguns anos mais tarde, em 1982, Kathryn filmou seu primeiro projeto completo, The Loveless, estrelado por Willem Dafoe. Em 2009, a cineasta dirigiu e produziu Guerra ao Terror, filme pelo qual recebeu 9 indicações ao Oscar no ano seguinte, das quais conquistou 6 estatuetas, incluindo aquela que a faria entrar para a história da premiação: o Oscar de Melhor Direção.

Guerra ao Terror conta a história de um grupo de soldados norte-americanos em missão no Iraque da era Bush. Faltam apenas alguns dias para que retornem ao lar, e os soldados, que fazem parte do esquadrão antibombas, têm muito trabalho a fazer e muita pressão para suportar. Com o filme, além de levar o Oscar de Melhor Direção, Kathryn Bigelow também venceu nas categorias de Melhor Filme, Melhor Edição, Melhor Roteiro Original, Melhor Mixagem de Som e Melhor Edição de Som. Alguns anos mais tarde, a cineasta tentaria repetir o sucesso com A Hora Mais Escura, protagonizado por Jessica Chastain, e ainda que tenha concorrido nas categorias de Melhor Filme e Melhor Roteiro Original, foi esnobado na indicação de Melhor Direção, em 2012.

Indicados: Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror); James Cameron (Avatar); Lee Daniels (Preciosa); Jason Reitman (Amor Sem Escalas); Quentin Tarantino (Bastardos Inglórios).
Vencedor: Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror).

Greta Gerwig por Lady Bird: A Hora de Voar (2018)

Passaram-se oito longos anos antes que outra mulher fosse indicada novamente na categoria de Melhor Direção. Ainda que a comemoração pela vitória de Kathryn, em 2010, tenha sido memorável, a diversidade nas indicações do Oscar continuava como um grande discurso vazio. Nascida em Sacramento, nos Estados Unidos, em 1983, Greta Gerwig cresceu almejando se tornar dramaturga, tendo graduado-se em Música e Teatro na Barnard College e em Inglês e Filosofia na Universidade de Columbia. Começou a atuar quase por acaso quando, durante a faculdade, conseguiu um papel no filme independente LOL, de Joe Swanberg. Assim nasceu seu amor pela atuação, atividade que exerceu com maestria, e seu envolvimento com o movimento artístico Mumblecore, que pode ser resumido como a produção de filmes de baixo orçamento, com atores não profissionais e muita improvisação de roteiro. Como parte desse movimento, Greta estrelou Hannah Takes the Stairs, filme que escreveu junto de Joe Swanberg; mais tarde, foi muito elogiada pelo papel que interpretou no longa Greenberg, de Noah Baumbach, pelo qual recebeu o prêmio de Melhor Atriz no Independent Spirit Award.

Greta também co-escreveu junto a Noah Baumbach o filme indie aclamado pela crítica Frances Ha, e só então resolveu se aventurar sozinha no roteiro e direção de Lady Bird: A Hora de Voar. O filme, quase uma biografia da própria Greta, é um coming of age onde acompanhamos a adolescente Christine “Lady Bird” McPherson, interpretada por Saoirse Ronan, indicada ao Oscar de Melhor Atriz pelo papel, e seu desejo de sair da pequena cidade em que vive para cursar uma faculdade em Nova York. Lady Bird já conquistou alguns troféus em premiações importantes, como Melhor Filme de Comédia ou Musical e Melhor Atriz para Saoirse no Globo de Ouro deste ano. Esse, contudo, é apenas o primeiro filme inteiramente dirigido por Greta, de modo que ainda podemos esperar coisas maravilhosas da carreira da escritora e diretora.

Indicados: Greta Gerwig (Lady Bird: A Hora de Voar); Christopher Nolan (Dunkirk); Jordan Peele (Corra!); Paul Thomas Anderson (Trama Fantasma); Guilhermo Del Toro (A Forma da Água);
Vencedor: descobriremos no dia 4 de março!