Categorias: TV

Sr. & Sra. Smith, da Amazon, encontra caminho independente para os novos Smiths

Adaptação do filme de 2005, Sr. & Sra. Smith, a nova série da Amazon estrelada por Donald Glover e Maya Erskine, expande o universo dos Smiths de maneira independente. Com oito episódios, logo fica claro que a obra que marcou os anos 2000, especialmente pelo forte protagonismo de Angelina Jolie e Brad Pitt, é apenas a base para uma produção mais focada no relacionamento do casal principal, devendo o filme restar apenas como uma referência, de onde alguns easter eggs felizmente podem ser retirados.

Aqui, Jane (Maya Erskine) e John Smith (Donald Glover) trabalham para a mesma agência de espionagem internacional e não estão tentando matar um ao outro como missão — ou, ao menos, não ainda. Ambos são designados para atuarem como um bem sucedido casal de fachada, enquanto realizam diversas operações de alto risco pelo mundo.

Sr. & Sra. Smith

Apesar de aparentemente retratar alguns “tropos” de thrillers de espionagem internacional, a escolha narrativa da série foca no desenvolvimento do relacionamento entre os personagens, bem como sua evolução pessoal, o que pode decepcionar aqueles que esperam as grandes cenas de ação do filme, bem como as habilidades e até maturidade do Sr. e Sra. Smith dos cinemas.

Mesmo que inicialmente relutantes sobre construir uma verdadeira amizade ou um relacionamento amoroso (ou um protótipo disso), Jane e John passam por diversas fases de um relacionamento comum, ainda que oficialmente casados, o que torna a experiência da série, no mínimo, interessante, ao inverter a ordem dos fatores em um roteiro que se preocupa em alinhavar os momentos pessoais e profissionais do casal.

Já com uma aliança no dedo, eles vão a um primeiro encontro, se namoram e se conhecem aos poucos durante as primeiras e mais bobas experiências de um simples namoro, exceto que eles já moram juntos e, ao passo que isso acontece, também estão em missão sob ordens de uma entidade sem rosto, que se comunica com ambos através de mensagens, o que é o diferencial de Sr. & Smith em relação a outros romances.

Sr. & Sra. Smith

Com a oportunidade de se aprofundar neste relacionamento de altos e baixos, é possível delinear realmente quem são Jane e John, os espiões, e Jane e John, as pessoas fora do trabalho, que estão vivendo uma situação de exceção. Donald Glover e Maya Erskine carregam similaridades com os personagens Brad Pitt e Angelina Jolie. Enquanto ambas as Janes são reservadas e possuem verdadeiras travas sociais, subsistindo uma impressão de que há sempre algumas camadas a se desvendar sobre elas a cada informação concedida, Donald retrata um John mais extrovertido, aberto, carregando o mesmo tipo de humor meio galhofa de Pitt, embora em um tom a mais, uma vez que a série não chega no gênero de ação com tanta força.

A roteirista e criadora da série, Francesca Sloane (Fargo/Atlanta) revelou que conseguir Wagner Moura e Parker Posey para o papel dos “Outros” Jane e John Smith foi um sonho realizado, mas a produção conta, de fato, com um elenco estrelado, como Paul Dano, Alexander Skarsgård, Ron Perlman, Sarah Paulson, Úrsula Corberó, John Turturro, dentre outros, que torna cada episódio realmente instigante.

Com isso, além de conseguir contar a história que inicialmente se propõe, resultando no que realmente se espera de Sr. & Sra. Smith — ou seja, o grande “desabamento” do casamento em metáfora à destruição da linda casa em que vivem no fim do último ato —, a produção abre boas possibilidades para o futuro: um mergulho nas verdadeiras motivações e trabalhos dos Outros Smiths, haja vista a breve roubada de cena de Wagner e Parker? Mais centralização no gênero da espionagem? Uma ligação com o filme, que fica apenas nas entrelinhas do que pode vir a ser agência para quem trabalham? Talvez mais?

Sr. & Sra. Smith

A este ponto, resta apenas questionar, mas é neste “mais”, que reside uma certa falta da real essência de Sr. & Sra. Smith. Por mais que tenha escolhido um viés mais independente e inédito em relação ao filme, trata-se de uma história que seria possível explorar sem o peso de Brad Pitt e de Angelina Jolie nos ombros, especialmente quanto à ação. Assim como no filme, há muitas pontas soltas sobre seus verdadeiros patronos e, se naquele, informações práticas fazem pouca diferença, neste, é como se faltasse uma grande trama central em que se apoiar, já que falta uma construção mais elaborada dessa realidade.

Obviamente, há espaço para isso, uma vez que, sendo uma série, existe a oportunidade de desenvolvimento de um pano de fundo maior em uma — ainda não confirmada — segunda temporada, porém, ainda que acompanhar Jane e John Smith, com suas descobertas, frustrações, concessões e combinados durante as fases subvertidas deste casamento seja divertido, soa como se fosse divertido demais, como se faltasse à produção um senso de urgência e perigo que deveria existir, especialmente quando outros Johns e Jane Smith estão sendo “finalizados” ao redor do mundo.

Sr. & Sra. Smith sabe onde quer chegar, com Glover e Erskine sendo competentes em nos levar até lá, mas, em um possível segundo ano, para uma melhor experiência a “là Smiths” de verdade requer aprimoramento e menos sutileza.