Categorias: LITERATURA

O surreal e o tétrico em Coelho Maldito, de Bora Chung

Coelho Maldito, da escritora sul-coreana Bora Chung, é uma obra peculiar. Finalista do International Booker Prize de 2022, os contos presentes nas 230 páginas do livro transitam entre o surreal e o tétrico, entre o realismo mágico e o folclore, entre o horror e a ficção científica, mostrando o arsenal que Bora Chung leva consigo em suas publicações. Lançado no Brasil pelo selo Alfaguara da Companhia das Letras, e com tradução de Hyo Jeong Sung, Coelho Maldito é uma viagem assombrosa onde transitamos muito perto de temas verdadeiramente reais, principalmente para mulheres, revestidos no surreal. Não é à toa que Bora Chung vem sendo descrita pela crítica especializada como uma das mais notáveis vozes da Coreia do Sul quando o assunto é literatura.

Coelho Maldito abre justamente com o conto que dá título ao livro, onde acompanhamos uma família cujo negócio é criar objetos de maldição. Nesse conto, o avô relembra um acontecimento envolvendo um amigo de infância, um abajur em forma de coelho e a maldição que corroeu sua família, um integrante por vez. Na sequência, “A Cabeça” mostra a jornada de uma mulher que passa a ser perseguida por uma criatura que aparece em seu vaso sanitário, um conto grotesco e bizarro que te fará pensar duas vezes antes de usar o banheiro. Esse, talvez, seja o conto mais perturbador de Coelho Maldito, mas que, ainda assim, consegue ter pitadas de um humor maquiavélico que só poderia ter surgido da mente de Bora Chung.

“É possível desfazer uma maldição, porém não há como abrir os olhos de um homem cegado pela ambição.”

Os demais contos como “Menorreia”, “Adeus, meu Amor” e “Reencontro”, apenas para citar alguns, permanecem transitando no singular universo criado pela autora, evocando imagens e situações que permanecerão com o leitor por muito tempo, visto que Chung consegue mesclar com maestria elementos que, em um primeiro momento, não deveriam funcionar colocados lado a lado, mas, com ela, funcionam de maneira excepcional. A autora decide retratar uma sociedade quebrada e egoísta, nos entregando contos entremeados por vislumbres de situações reais, sempre atreladas a uma existência patriarcal e misógina. É assim que Chung enfia o dedo na ferida e aproveita para descrever a sensação com riqueza de detalhes, estes sempre muito vívidos e perturbadores.

Coelho Maldito

Por meio dos contos presentes em Coelho Maldito, Bora Chung tece críticas à sociedade em que vive, mas que não se restringem somente à Coreia do Sul. O patriarcado, a ganância e o egoísmo estão presentes em todas as páginas de sua obra, mostrando como a menor das questões pode levar pessoas ao limite, e como a corda sempre arrebenta para o lado do mais fraco. Combinando elementos do terror, do realismo mágico e da fantasia, Bora Chung cria algo original, sem se furtar de tocar em temas complicados, instigando o leitor a pensar sobre o que está de fato lendo, colocando questões impossíveis de desviar o olhar.

Por meio de suas dez histórias, Coelho Maldito evoca imagens tão grotescas quanto assombrosas, construindo enredos incômodos que tratam com um olhar afiado questões que permeiam nossa sociedade e, com mais vigor, a existência feminina. Prepara-se para encarar contos que te farão ficar com o estômago revirado, mas também te colocarão a pensar sobre o absurdo e o grotesco de nossa realidade, sem filtros.

“Estejamos vivos ou mortos, não passamos, na verdade, de fantasmas do passado.”

O exemplar foi cedido como cortesia por meio de parceria com a Companhia das Letras.


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