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A Serpente e as Asas Feitas de Noite, de Carissa Broadbent

Em A Serpente e as Asas Feitas de Noite, primeiro livro da duologia Nascidos da Noite da escritora Carissa Broadbent, acompanhamos a jornada de Oraya, uma humana criada em uma corte de vampiros. Mas Oraya não foi criada por um vampiro qualquer: ela é a filha adotiva do rei dos vampiros dos Nascidos da Noite e, ainda que isso a tenha feito viver envolta em privilégios em um universo repleto de perigos para humanos comuns, também colocou um enorme alvo em suas costas desde muito cedo.

Lançado no Brasil pela Editora Suma com tradução de Jana Bianchi, A Serpente e as Asas Feitas de Noite é um livro de fantasia que reúne as melhores características do gênero: um universo verossímil, personagens carismáticos e um enredo interessante, repleto de momentos de ação em que ninguém está completamente a salvo. Ainda que o livro não tenha em si muitas inovações — durante a leitura a trama até mesmo soa como a de outras obras do gênero —, a narrativa envolvendo Oraya e sua herança humana em uma corte de vampiros é realmente divertida e perigosa. Sou leitora ávida de fantasia há muitos anos, e A Serpente e as Asas Feitas de Noite conseguiu evocar as melhores lembranças de momentos em que passei, ainda adolescente, em companhia de vampiros dos mais diversos tipos, dos que brilham ao sol até os que vivem no Brasil.

“Afinal de contas, vampiros sabem melhor do que ninguém como é importante proteger o coração. E o amor, entenda, é mais afiado do que qualquer estaca.”

Carissa Broadbent consegue prender a atenção do leitor ao nos contar a história de Oraya, e logo de início queremos saber os motivos que levaram Vincent, o poderoso rei dos vampiros, a adotar uma humana ainda criança, levando-a para viver no lugar mais perigoso possível para ela. Oraya precisou entender, desde muito jovem, que o modo sobrevivência era o único em que poderia se fiar para navegar na corte dos vampiros e que mesmo com a proteção do rei, ela estaria por sua própria conta. Sendo assim, Oraya treina para ser a melhor que puder e quando surge a oportunidade de participar do Kejari, ela não pensa duas vezes: ela precisa se tornar mais forte, não apenas por ela, mas também pelo reinado de Vincent.

O Kejari é um torneio realizado através dos séculos em que a Deusa Nyaxia, criadora dos vampiros, concede um desejo ao seu vencedor. Mas para chegar ao final do torneio, é necessário passar por provas de vida ou morte, sobrevivendo aos desafios, mas também aos demais competidores. No caso de Oraya, ela se torna, à primeira vista, um alvo fácil, visto que é a única humana a competir em meio aos vampiros da corte e das demais casas do reino. Mas no decorrer dos torneio, os vampiros vão descobrir que Oraya é muito mais do que aparenta ser. Quem percebe Oraya primeiro é Raihn, um vampiro que esconde segredos por trás de sua fachada relaxada e displicente, mas que acaba despertando certa curiosidade na protagonista que sente que precisa desvendá-lo a todo custo.

Dessa maneira, os dois se tornam aliados improváveis, e aos poucos Oraya começa a baixar sua guarda, sempre tão alicerçada em sua sobrevivência, e deixa que Raihn veja além da superfície. Isso levará a consequências que, até então, Oraya não poderia imaginar, e que colocará todo o reinado de Vicent em risco. A leitura de A Serpente e as Asas Feitas de Noite vai crescendo em urgência na medida em que vamos avançando no torneio ao lado de Oraya, com a tensão entre ela e os demais vampiros chegando ao ápice, assim como entre ela e Raihn. Aqui temos um típico caso de enemies to lovers, meu tropo favorito, e Carissa Broadbent consegue desenvolvê-lo muito bem, mesclando momentos de ternura com os de brigas explosivas.

Mesmo que eu tenha me divertido durante a leitura, isso não significa dizer que A Serpente e as Asas Feitas de Noite está isento de erros. Embora Carissa Broadbent tenha criado uma trama interessante, amarrando o desenvolvimento de Oraya ao torneio, lidando com a política do reino dos vampiros ao mesmo tempo em que os entrelaça em magia, a autora peca ao não dar tanta profundidade aos seus personagens principais, onde tanto Oraya quanto Raihn falam muito mais do que, de fato, agem.

“Ela achava que estava apaixonada. Ainda não tinha aprendido como aquele tipo de coisa podia ser mortal.”

Oraya, ainda que funcione como protagonista, não é tão decidida e esperta quanto diz ser. Muitas das situações em que se encontra durante a trama poderiam ter sido desenvolvidas de outra maneira se, de fato, a personagem fosse tão desenvolta e segura quanto diz. A conclusão de A Serpente e as Asas Feitas de Noite, inclusive, serve para pontuar exatamente isso, o fato de que Oraya consegue ser muito ingênua em uma situação de cada um por si, não sendo capaz de enxergar o cenário maior e agindo somente pelo impulso do momento. Tudo bem que a autora ainda terá outro livro para compensar essa questão, e entendo que Carissa Broadbent ainda deve ter cartas na manga para o futuro de seus personagens, mas incomoda um pouco a quantidade de questões que não são desenvolvidas por completo, nos deixando apenas com suposições.

De qualquer forma, A Serpente e as Asas Feitas de Noite foi uma leitura divertida e me vi verdadeiramente absorta pela trama. Com pouco mais de 400 páginas, Carissa Broadbent dá início a uma narrativa cativante que ainda precisa de alguns ajustes, mas que pode envolver o leitor do início ao fim. O livro que abre sua duologia poderia ter se aprofundado mais no momento de criar e desenvolver os personagens, além das tramas políticas e de aprimorar alguns diálogos, mas a autora faz um bom trabalho ao instigar a curiosidade do leitor a respeito do que vem a seguir. A ideia do torneio envolvendo diferentes provas e competidores, ainda que não seja inovadora, funciona para o propósito do livro. Espero que em seu As Cinzas e o Rei Maldito pelas Estrelas, conclusão da duologia com previsão de lançamento, também pela Editora Suma, em 2025, Carissa Broadbent possa entregar todo o potencial que sua história, e seus personagens, tem.

“O luto me destroçou entre seus dentes. Foi pior do que jamais achei que seria.”

O exemplar foi cedido como cortesia por meio de parceria com a Companhia das Letras.


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