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O legado Mulder e Scully na cultura pop

“Você tem que acreditar em mim, Scully. Ninguém mais nesse planeta acredita ou sequer vai. Você é minha uma em cinco bilhões.”

11 temporadas e dois filmes ao longo de mais de 25 anos. Esse é o legado de Arquivo X, em linhas gerais. No universo expandido, o clássico cult da cultura pop chegou até mesmo a ganhar algumas histórias serializadas em quadrinhos e livros, que exploram diversos assuntos como, por exemplo, a adolescência dos protagonistas. A influência de Scully (Gillian Anderson) em uma geração de meninas que seguiram carreira na ciência por sua causa ainda é um assunto explorado pela mídia, assim como a bagunça que, aos poucos, se tornou a mitologia da obra, bem como a necessidade do criador, Chris Carter, de sempre procurar o próximo conceito ao invés de deixar a história seguir seu curso natural. Mesmo entre altos e baixos, os fãs acompanharam a produção até o último segundo e, apesar de ser atrativa em várias aspectos, não existe nenhuma dúvida que os responsáveis por isso são os dois protagonistas e a dinâmica que eles construíram durante todos esses anos.

Mesmo que seja o fator que tenha permitido o sucesso o absoluto da série, a natureza da relação de ambos sempre foi um dos aspectos mais controversos da história. Mesmo hoje, quando ambos têm um relacionamento mais ou menos estabelecido, ainda existe certa resistência na forma como as pessoas os veem. Enquanto uns acreditam que tudo na trama é construído para ressaltar o aspecto romântico da relação, outros defendem que era melhor deixar a dinâmica apenas como uma amizade platônica. Apesar de Arquivo X não ser a única série que canaliza esse tipo de discussão, ela com certeza foi uma das que elevou o debate para níveis maiores. Afinal, Mulder e Scully se tornaram um dos casais mais amados, discutidos e populares da cultura pop no geral. Essa popularidade moldou vários aspectos da TV como um todo. Depois da obra, a dinâmica de uma dupla de investigadores com personalidades distintas se popularizou (veja Brennan e Booth de Bones; ou Castle e Beckett, de Castle; ou até mesmo a recente Evil, com Kristen e David) sendo que foi naquela época que o termo “shipping” foi criado, hoje tão famoso em círculos cujo objetivo é o engajamento entre fãs.

A história de Mulder (David Duchovny) e Scully começa logo nos primeiros minutos do episódio “Piloto”, quando a médica é convocada para espionar a divisão do FBI que ficou conhecida como X Files. Comandada por Fox Mulder, seu principal objetivo é investigar atividades extraordinárias em todos os cantos dos Estados Unidos, sendo que o próprio agente tem uma missão bem específica como motivador: descobrir mais sobre o desaparecimento da sua irmã, Samantha (Vanessa Morley), que ele acredita ter sido abduzida por alienígenas quando ambos eram adolescentes. Como uma mulher da ciência, Dana Scully parece ser a escolha perfeita para acompanhá-lo nessas investigações. Sua missão quando desce para o porão e começa a trabalhar lado a lado com o Spooky Mulder (como os outros agentes chamavam o protagonista) era não só colocar os seus pés no chão e abrir sua cabeça para os fatos, ao invés das crenças, mas também reportar absolutamente tudo que acontecia nas viagens para os figurões no topo. O que ninguém acreditava que ia acontecer, nem mesmo a própria Scully, era que ela fosse encontrar um novo propósito para sua vida em casos sem resolução, que instigavam a imaginação da cientista e a empurravam cada vez mais para dentro daquele mundo.

Mulder e Scully

Propósito é o primeiro motivo para explicar tamanha dedicação que ela desenvolve no desenrolar da história. Já o segundo motivo pelo qual ela ficou tão envolvida com a busca pela verdade sempre é a relação que estabelece com Mulder. Apesar dele desconfiar das suas motivações no início (e com um pouco de razão), Scully não demora a cair nas graças do seu parceiro, e vice-versa. Apesar de Mulder ser um pessoa que acredita 100% nos casos que investiga, Scully oferece uma voz racional que não só é muito necessária, como também bem-vinda. Isso fica claro logo na primeira cena em que eles falam sobre um caso, quando trocam farpas sobre um acidente sobrenatural que, segundo Mulder, tem todos as indicações clássicas de abdução. Marcas estranhas no corpo e uma morte sem explicação possível para Mulder é sinal de uma abdução que deu errado, enquanto Scully usa a ciência para refutar qualquer um dos seus argumentos.

Mesmo nessa pequena interação, é possível perceber que eles estabelecem uma espécie de dança entre si. Ambos recebem as refutações não como uma ofensa, mas sim como um desafio, como se o fato deles se colocarem em xeque constantemente é algo que os mantém fora da suas zonas de conforto. Na medida em que os episódios avançam, é possível perceber que uma conexão mais profunda surge entre eles: enquanto Mulder enfrenta descrença e problemas na hora de desvendar as questões mais profundas de seu passado, Scully começa a ter sua própria cota de dor e luto. Ela perde o pai, depois a irmã. Mais tarde, é abduzida e depois aparece com câncer. Mas ao invés disso colocar os dois em lados opostos, distanciá-los, o efeito é o oposto. Scully abraçou a investigação de Mulder para saber o que aconteceu com a irmã, e ele faz o mesmo por ela sem pensar duas vezes.

“Você me salvou, Scully. Apesar de ser sido frustrante e difícil às vezes, sua lógica e ciência me salvaram mais de mil vezes. Você me fez honesto, me fez ser uma pessoa completa.” 

A primeira vez em que o relacionamento deles é colocado a prova é no episódio oito da primeira temporada, intitulado de “Ice”. Esse é o capítulo que prova a teoria de que, antes da confiança e cumplicidade mútua que surgiu entre eles, já existia algo mais no relacionamento. No caso, o que as pessoas chamam de tensão sexual. Mais tarde, quando ambos já estavam envolvidos em um nível mais profundo, a dinâmica se desenvolve puxando pelo fato de que um é a âncora do outro e, portanto, existe um laço de lealdade inquebrável ali. Quando Mulder diz para Scully voltar para sua vida normal, ela diz que não consegue pois agora seu trabalho é ao seu lado. A verdade de Mulder importa para ela, e pode-se argumentar que o mesmo acontece em situações invertidas.

Em episódios como “War of the Coprophages” e “Memento Mori” isso fica muito claro. No primeiro, Mulder tem que enfrentar um caso sozinho, sem a ajuda da parceira. Quando ela finalmente chega para ajudá-lo, é possível ver um pouco do seu alívio. Eles já são uma unidade, trabalham melhor juntos. Enquanto isso, no segundo, Scully descobre que está com um tumor por causa da sua abdução na segunda temporada. Disposto a lutar para descobrir uma possível cura, Mulder não mede seus esforços e no processo, os dois acabam ficando ainda mais próximos um do outro. Ele não está disposta a perdê-la e, percebendo isso, Scully mostra uma vulnerabilidade que ela nem mesmo sabia que tinha, além de encontrar motivação para continuar lutando (não só por Mulder, claro, mas também por si mesma). Esse é um momento agridoce, mas importante para o relacionamento dos dois. Quase como um ponto de virada.

Mulder e Scully

Apesar das coisas ficarem mais complicadas dali pra frente, e as conspirações começarem a se tornar menos tangíveis e cada vez mais mirabolantes, existe uma naturalidade maior na forma como os dois protagonistas se relacionam. E a narrativa explora isso de forma quase orgânica, natural. Em “The Unnatural”, por exemplo, eles compartilham uma cena genuína onde Mulder ensina Scully a jogar beisebol, uma cena que se tornou favorita entre os fãs. Em “Bad Blood” a história é contada pela perspectiva de ambos e rende um bom capítulo sobre a relação entre eles, enquanto “Arcadia” e “Hollywood A.D” mostram lados mais leves de suas personalidades, algo que geralmente é deixado de lado por causa da seriedade da narrativa, mas que funciona muito bem na hora de acrescentar novas nuances para o relacionamento em si. São esses episódios, que geralmente não se conectam com os grandes arcos conspiratórios que ligam uma temporada na outra, que provam a verdadeira força do casal. E, no final, isso prova exatamente o que todo mundo já sabia: o relacionamento entre eles sempre foi, e sempre vai ser, o maior trunfo da série.

Como qualquer série que dura anos, a dinâmica sofreu pequenas mudanças com o passar das fases que moldam a vida dos personagens. Se antes Mulder e Scully eram movidos por verdades individuais (a busca por uma irmã perdida, ou talvez para tentar descobrir sobre os mistérios do universo), mesmo que elas se misturassem de forma frequente, a oitava temporada trouxe uma mudança pertinente e madura para a relação. Depois que eles dormiram juntos pela primeira vez (algo que acontece off screen), Scully engravida e acaba tendo o filho do casal, William, que mais tarde ela daria para adoção, preocupada com a sua segurança. Por causa dos conflitos de Duchovny com a série e sua ausência durante a maior parte da oitava e nona temporada, essa fase nova do relacionamento quase não é desenvolvida e, quando é, é apenas de forma superficial. Mas como foi estabelecido anteriormente pela narrativa, os dois são as pessoas com quem eles mais podem contar no mundo, e ao passar pela fase mais difícil da vida de ambos, mais uma vez eles escolhem permanecer juntos. A química verdadeira entre os dois atores também ajuda para que cada conversa e detalhe seja importante na hora de construir a história deles, algo que ajuda muito na trama que envolve William.

O aspecto romântico do relacionamento sempre esteve ali, mas os próprios personagens pareciam lutar contra isso. Ao invés de cederem ao que eles sentiam um pelo outro, eles preferem colocar energia em áreas distintas de suas vidas. Geralmente, o trabalho que compartilham no X Files. Essa dinâmica não é nem um pouco saudável, uma vez que isso faz com que eles se tornem um pouco codependentes um do outro, algo impossível de ignorar. É por isso que, nas temporadas futuras, eles não conseguem achar um meio-termo e acabam ficando mais separados do que juntos. Eles se amam (e isso provavelmente nunca vai mudar), mas todas as eternas buscas pela verdade, que os uniram no começo, é também o que os separam agora. É uma pena que a narrativa nunca tenha aprendido a desenvolver o relacionamento deles para além do slow burn que os moveu durante os primeiros anos da série. Com a 11ª temporada tudo parecia fora de lugar na produção. A mitologia, os personagens coadjuvantes, as histórias e, eventualmente, até mesmo a dinâmica entre Mulder e Scully. Eles sempre acabam voltando um para o outro, mas para que deixá-los separado para começo de conversa?

No capítulo final da nona temporada (que serviu como o primeiro final “definitivo” da série), ambos estavam juntos. Eles tinham que permanecer em fuga e mudar de vida para escapar às consequências de descobrir uma grande conspiração, mas encontraram conforto em estarem fazendo isso como parceiros. Não à toa, o episódio se chama “The Truth”, fazendo uma alusão não só ao tema pertinente que se espalhou durante a série (a busca pela verdade), mas também a verdade que se estabeleceu entre Mulder e Scully. Uma verdade que vem do relacionamento mais importante que os dois carregam e da possibilidade de finalmente poderem admitir o que realmente existe entre eles.

Mulder e Scully

Mulder, Scully e o fandom

Assim como várias produções da cultura pop que foram muito populares, Arquivo X era muito baseado em fandom, ou no conceito do mesmo. Isso quer dizer que as pessoas que se consideravam fãs da série se reuniam em grupos e fóruns on-line para discutir teorias conspiratórias, para onde a trama iria a seguir e, claro, a relação entre Mulder e Scully e todos os seus aspectos, inclusive a possibilidade dos dois desenvolverem um relacionamento amoroso. Essa discussão em específico não chegou sem fundamento. O público, que é sempre sofisticado o suficiente para reconhecer tropos e recursos usados dentro de uma narrativa, percebeu que o roteiro do seriado usava deles para deixar subentendido a atração romântica entre os dois. Não eram os fãs que estavam inventando algo que não existia, mas sim algo que o próprio roteiro da série deixava explícito. Dentro dessa comunidade criada por pessoas que compartilham esse interesse em comum, hoje chamada fandom, surgiam coisas como fanart e fanfiction, cujo o objetivo é sempre expandir o universo entre os dois protagonistas e a possibilidade que existia para o romance.

Essa mesma relação entre fandom e série se perpetua até os dias atuais na cultura pop, de forma cada vez mais intensa. Lost, Fringe e até mesmo o fenômeno recente Game of Thrones, são exemplos pertinentes de obras que tinham uma grande e sólida base de fãs que se propunham a engajar com a produção e discuti-la de forma profunda. Se antes eram os fóruns que dominavam esse grupo específico de pessoas, agora são as redes sociais.

Arquivo X dificilmente é a produção da cultura pop que criou o fandom, mas, para mim, é a série que girou a roda. Apesar de eu mesma não fazer parte de nenhum fandom ou sequer consumir (muitas) coisas que vêm nesse meio, é difícil me manter longe quando se gosta de coisas que são extremamente populares e baseadas fortemente nesse aspecto. E passando por esse universo, percebi um fenômeno que se perpetua desde aquela época até os dias atuais: o do gatekeeper. Segundo o Google, gatekeeper (ou porteiro, em tradução literal) é uma pessoa que controla o acesso a algo. Na cultura, eles se manifestam de várias formas, entre elas, como a pessoa (geralmente homem) que tenta controlar o fluxo de informações que passa de um fã para o outro. Sabe aquele cara que, quando descobre que você gosta de Star Wars, por exemplo, faz mil e uma perguntas absurdas sobre onde o universo em si só para testar o seu conhecimento e provar que você é realmente fã? Então, ele é considerado um gatekeeper, de certa forma. E isso parece existir ainda mais entre os fãs de gênero (terror, ficção científica, etc).

Segundo o artigo The Fandom is Out There: Social Media and The X Files Online”, grande parte das fãs da série eram mulheres e, portanto, elas comandavam as discussões sobre a história dentro do fandom — sendo que um desses aspectos é, claro, o relacionamento amoroso entre Mulder e Scully. O mesmo texto também diz que essas pessoas se tornaram parte tão essencial da história quanto a obra em si, ditando muito do que viria a ser a relação entre produtores e fãs no futuro da TV. Entretanto, por esses fãs terem focado bastante na dinâmica entre os protagonistas e, mais do que isso, torceram para que eles ficassem juntos, existia muito machismo sendo perpetuado neste ambiente, sendo o principal ponto o foco em um suposto aspecto errado da trama. O argumento é que, ao invés de priorizar o desenvolvimento da relação entre os personagens, o foco deveria ser a mitologia da série e seus alienígenas.

Mulder e Scully

Há algum tempo, Jay Faerber, escritor de quadrinhos, viralizou no Twitter ao afirmar que os dois protagonistas da sua obra não necessariamente precisavam se engajar em um relacionamento amoroso. Apesar dele estar certo e determinadas dinâmicas funcionarem melhor quando permanecem no espectro platônico — como acontece com Dutch (Hannah John-Kamen) e Johnny (Aaron Richard Ashmore), de Killjoys; Lucas (Chad Michael Murray) e Haley (Bethany Joy Lenz), de One Three Hill e até mesmo Ron (Nick Offerman) e Leslie (Amy Poehler), em Parks and Recreation, apenas para citar alguns exemplos —, as respostas ao tuíte não exploram esse ponto de vista, fazendo alusão ao machismo propagado pelos fãs.

O próprio Chris Carter perpetuou a narrativa preconceituosa: apesar de o autor claramente utilizar tropos românticos para construir o relacionamento entre Mulder e Scully, o criador dizia que o relacionamento dos dois era platônico e que ninguém estava interessado em vê-lo se desenvolver de forma completa. Ainda segundo Carter, o mais importante estava na história em si. No processo de tentar de tentar lutar contra um caminho que parecia orgânico, o showrunner tomou várias decisões equivocadas, mantendo o machismo enraizado na série. Ao violar Dana Scully — que teve o filho implantando por meio de um experimento híbrido entre humanos e alienígenas —, quando podia deixar que ela compartilhasse uma história romântica e sexual com Mulder, Carter apenas isolou ainda mais a personagem, aprofundando um suposto status de “personagem feminina forte”, que sofre incessantemente, mas nunca tem a chance de trabalhar seus traumas.

Mesmo que tenha rejeitado essa parte da história por tantos anos, sua audiência e engajamento vinham principalmente de um grupo específico de fãs que desejavam ver esse desenvolvimento. De certa forma, era o tipo de publicidade perfeita: enquanto houvesse gente falando e se importando com os personagens da série, menos eram as chances de ele ser cancelado ou deixado de escanteio — o que funcionou muito bem para Arquivo X: foram mais de 11 temporadas, filmes, spin-offs, livros, quadrinhos e produtos licenciados. A série é uma marca, e Mulder e Scully estão no centro de tudo isso.

A insistência do showrunner e dos fãs da série que insistem que construir um romance é focar no aspecto errado da história (não necessariamente com essas palavras) é, por sua vez, algo que existe até hoje e cresce de maneira exponencial. A história de Ben Solo e Rey, em Star Wars, é um exemplo claro que reforça esse aspecto. Star Wars é uma história muito mais velha do que Arquivo X, mas foi somente por causa da série que comecei a perceber como os fãs entusiastas de Reylo eram tratados de forma geral. Muito como os fãs de Arquivo X, que torciam por mais momentos entre Mulder e Scully, os fãs de Reylo enfrentam barreiras parecidas. Existe, de fato, uma discussão mais profunda sobre a natureza do casal, mas em paralelo também existe um movimento de exclusão na internet de pessoas que se apegaram a um relacionamento específico — uma dinâmica que, devo acrescentar, está presente na narrativa, ou seja, não é algo que surgiu do nada. Ainda assim, são esses fãs os grandes responsáveis pela maior parte do engajamento com a série, suas sequências, fanfictions, fanart e spin-offs, além da arrecadação de dinheiro para causas sociais, etc.

Outros exemplos pertinentes do mesmo caso se espalham pela cultura pop. O showrunner de The 100, Jason Rothenberg, utilizou do engajamento de seus telespectadores ativos no fandom para promover a série ao mesmo tempo em que, durante entrevistas, desmerece as discussões levantadas sobre o aspecto romântico da obra. Mais recentemente, Rob Thomas, de Veronica Mars, tirou de cena o interesse amoroso de sua protagonista porque ninguém estaria interessado em vê-la se relacionar com o marido — ignorando aqueles que assistem a série por causa dos dois. Mesmo séries como Doctor Who acabam caindo no mesmo buraco (embora exista um pouco mais de tolerância, a relação do Doctor com a companion Rose é um exemplo do mesmo padrão). No final, todas essas decisões só servem para isolar os protagonistas e reforçar uma suposta bandeira de feminismo que eles levantam, mas que não podiam estar mais longe de um significado real.

Implicar com esse fato é como afirmar que assistir Supernatural pela relação entre Dean (Jensen Ackles) e Sam Winchester (Jared Padalecki) é errado. Ou Gilmore Girls sem querer acompanhar o relacionamento entre Lorelai (Lauren Graham) e Rory Gilmore (Alexis Bledel). Podemos concluir, portanto, que Mulder e Scully fizeram mais do que só ditar a forma como relacionamentos amorosos viriam a ser apresentados na TV, mas também como eles seriam recebidos pelo público e tratados por showrunners.

Particularmente, amo os episódios mais ridículos de Arquivo X, aqueles que são divertidos e, ao mesmo tempo, profundos em mitologia ou que contém qualquer criatura bizarra, como o chupacabra ou Eugene Tooms — esse último, uma espécie de criatura que consegue hibernar por 30 anos após consumir carne humana. Mas amo igualmente aqueles que são e funcionam como uma carta de amor a relação entre Mulder e Scully. No fim do dia, são essas dinâmicas, sejam elas amorosas ou não, que criam a conexão entre público e obra, e que o mantém com o passar dos anos; não teorias vagas sobre a morte do presidente Jonh. F. Kennedy ou se o homem realmente pisou na lua ou não.

Com o revival da série, que acrescentou mais duas temporadas ao cânone, duas coisas ficam claras. A primeira é que a falta de diversidade na sala de roteiristas afeta diretamente a produção e a maneira como ela vê Scully e, consequentemente, o seu relacionamento com Mulder. E a segunda, que Chris Carter ainda está muito preocupado com o conceito da trama (e sua mitologia bagunçada), mas parece ser um dos únicos. Alguém ainda acompanha o seriado para saber sobre conspirações alienígenas? Talvez — muitos não dispensariam a oportunidade de se aprofundar na ficção científica. Mesmo assim, são Mulder e Scully que que fazem a roda girar e sustentam uma trama que não conseguiu evoluir com o tempo, que está certamente presa ao passado. É comum visitar certas obras e perceber que talvez suas histórias não fossem contadas da mesma forma hoje, notar a falta de representatividade e inclusão. O que faz com que elas se tornem atemporais é a forma como os personagens se relacionam. Se tudo faz sentido para os protagonistas no momento, com certeza vai atingir alguém do outro lado da tela. É isso que fez com que a relação entre Mulder e Scully se tornasse tão incrivelmente popular. E pelo o que parece, nem mesmo o criador da série é capaz de entender isso.

3 comentários

  1. Ótimo texto pra uma ótima série.

    Só uma correção: a gravidez da Scully foi induzida pelos membros do Sindicato. Lembre-se que ela ficou estéril depois da abdução, portanto não podia engravidar naturalmente do Mulder. Scully tentou fertilização in vitro quando o Mulder encontrou um frasco com alguns óvulos dela, mas o bebê William tinha poderes vindos dos genes alienígenas, derivados da hibridização feita pelo governo.

    Então não, ela não engravidou depois de transar com o Mulder.

  2. “Depois que eles dormiram juntos pela primeira vez (algo que acontece off screen), Scully engravida e acaba tendo o filho do casal, William, que mais tarde ela daria para adoção, preocupada com a sua segurança”

    Não, gente! Scully engravidou por inseminação feita pelo Canceroso. Os membros do Sindicato morreram, o Canceroso escapa e a gravidez da Scully é induzida. Essa mulher era estéril, como poderia engravidar? O próprio Mulder foi doador quando ela tentou inseminação!

  3. A gravidez da Scully foi induzida pelo chip que foi reinserido na nuca dela. Agora como isso foi feito, sendo que o Sindicato removeu todos os óvulos dela, aí não sabemos.

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