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Troféu Valkirias de Melhores do Ano: Música – Lado B

Continuando o passeio musical pelos nossos álbuns e singles favoritos deste ano, vale observar ainda que muitas artistas que vieram com novos lançamentos esse ano estão mais engajadas com a máxima expressão de si do que nunca. Algumas pendem para o lado mais político e social das questões, outras pendem para o lado emocional. Independente do que seja, todas são válidas e nos serviram de alguma forma. Como aprendizado, como auxílio para a nossa autoaceitação e autoafirmação. Tudo em relação às mulheres precisa ser bastante enfatizado para ser compreendido — infelizmente, temos esse trabalho dobrado —, mas como não estamos aqui para desistir, podemos pelo menos dançar enquanto lutamos.

Invasion of Privacy, Cardi B

Por Tany

Não existem dúvidas que a música do verão americano ano passado foi “Bodak Yellow”. Cardi B, rapper, estrela de reality show e ex-stripper americana, conseguiu tirar o primeiro lugar do single de estréia do álbum de Taylor Swift, se tornando a primeira rapper feminina em ter o número 1 da Billboard desde 1998. Seu caso poderia ser igual ao de muitos outros artistas que desapareceram após alcançar seu único hit, mas sua personalidade cativante, estilo, talento e acima de tudo, timing perfeito para lançar música atrás de música, parcerias e finalizar um álbum coeso em menos de um ano a estabeleceram como uma artista que não irá embora tão cedo.

Invasion of Privacy, seu álbum de estréia, foi lançado um ano após seu primeiro sucesso mostrando talento e ambição em comandar o showbusiness. Fora da linha dos álbuns de rappers femininas e flertando com outros ritmos, como o reggaeton (“I Like It” ft. Bad Bunny e J Balvin), R&B (“Ring” ft. Kehlani) e gospel (“Best Life” ft. Chance THe Rapper), mostrando quem é como artista para todo o público. Cardi B, na minha opinião, não é a melhor rapper do mundo e nem da atualidade, mas tem uma personalidade vibrante e muito talento. Ter mais mulheres, na música, e no rap, atingindo o sucesso, quebrando recordes e mostrando quem são, é algo que nós precisávamos fazia muito tempo. Mais do que um disco de rap Invasion of Privacy é um disco sobre uma mulher, o poder que tem de ir atrás do que quer e alcançá-lo.

Liberation, Christina Aguilera

Por Tati

Após um longo hiato, Christina Aguilera voltou com tudo em 2018 com seu novo álbum, Liberation, reafirmando o porquê é um dos principais nomes da música pop que lutam em prol do empoderamento feminino. Uma discografia que traz nas entrelinhas das faixas mensagens-chaves para o movimento feminista, como meninas dizendo que suas profissões do futuro serão de doutoras, cientistas e demais áreas em que as mulheres são ofuscadas pelo machismo, sincronizadas com letras que reafirmam a necessidade de discutirmos temas como indústria da beleza, autorreflexão, relevância dos relacionamentos na vida das mulheres, objetificação dos corpos femininos, entre outros.

Álbum versátil que traz grandes parcerias, com destaque para a canção “Fall in Line”, com a cantora Demi Lovato. A faixa enfatizou importantes assuntos para a luta das mulheres, fazendo um paralelo com a vida pessoal das artistas. A força de ambas as cantoras foi o destaque da música, pois elas se posicionaram em frente às câmeras e usaram toda a potência de suas vozes para dizer: nós, mulheres, não vamos mais seguir ordens.

Para saber mais: Fall in Line: a indústria não vai nos fazer seguir ordens

Lush, Snail Mail

Por Anna Vitória

Desde 2016 faço um ranking pessoal para eleger a Música Mais Romance do Ano. É uma coisa boba que só diz respeito a mim, uma desculpa que me dou para dissecar um monte de versos de amor ou só ficar ouvindo música no escuro em busca daquele refrão apaixonado que eu gostaria de gritar na cara de alguém ou pior, gostaria que gritassem pra mim (é por isso que evito divulgar esse tipo de lista). De acordo com critérios que nem sei explicar — aqueles do coração — minha Música Mais Romance de 2018 é “Heat Wave”, de Snail Mail, mas poderia facilmente ter escolhido “Pristine” ou “Full Control”.

As três músicas fazem parte de Lush, álbum de estreia de Snail Mail, banda de Baltimore encabeçada por Lindsey Jordan, uma garota de 19 anos que toca guitarra desde os cinco e que durante o processo de produção do álbum começou a descobrir a liberdade de escrever canções de amor direcionadas a garotas na medida em que ia ficando mais confortável com a ideia de ser uma garota lésbica. Ao longo de 2018, Jordan teve a chance de se apresentar em festivais badalados como o Coachella e foi comparada frequentemente, e com razão, a Liz Phair, que não por acaso é um de seus grandes ídolos. Outra coisa que as três músicas têm em comum é uma honestidade desafiadora, uma vulnerabilidade quase violenta, que soa afrontosa mesmo quando atinge o ápice do melodrama, como quando grita diz “I’ll never love anyone else”. Essa sinceridade marca as composições de Jordan, com histórias sobre amar, quebrar a cara e crescer, manifestações que, graças à guitarra da artista, são sempre vigorosas, mesmo quando ela se mostra mais frágil. Embora admita que a maior parte das canções do álbum são inspiradas por crushes — no sentido antigo do termo, aquela pessoa que você deseja tanto que sente vontade de esmurrar uma parede e jurar nunca mais amar ninguém — Lindsey também diz que Lush é um álbum sobre crescimento, amadurecimento. Não importa se nessa jornada seus romances não sejam bem sucedidos, o grande aprendizado é que, no fim das contas, o que vale é abraçar os próprios sentimentos com força e convicção, e no fundo não há nada mais romântico do que isso.

Party For One, Carly Rae Jepsen

Por Yuu

Depois de três anos explorando o material de E•MO•TION, seu terceiro álbum de estúdio, Carly Rae Jepsen chegou, bem depois da metade do ano, quando as nossas esperanças estavam mais enfraquecidas, com o primeiro single de sua nova era. “Party For One” é uma autêntica música de Carly Rae Jepsen, com todas as características que definem seu estilo e fazem seus fãs amá-la. Mais uma vez, Carly canta sobre estar com o coração partido por causa de um amor platônico, e mais uma vez, ela escolhe ver a situação como uma oportunidade perfeita para afogar as mágoas e deixar seus sentimentos fluírem, libertos.

Foi outro dia que ela disse que as músicas que estava escrevendo poderiam ser descritas como “músicas para ouvir enquanto estamos limpando a casa”, e embora “Party For One” seja uma trilha sonora maravilhosa para isso também, é em primeiro lugar uma música para curtir a solidão (ou solitude) só por isso mesmo. O conceito é muito claro, e clipe lançado em 1º de novembro ilustra o que já imaginamos: almas rejeitadas, sozinhas num quarto de hotel, fazendo a festa de diversas formas. E para tratar a universalidade do sentimento, a festa para um não é exclusividade de mocinhas jovens, mas também de homens de meia idade, senhoras com a sexualidade à flor da pele, meninas impulsivas, gays que dançam a mágoa afora. De roupa de baixo e salto alto, pedindo serviço de quarto, treating yourself.

Fofa como é, Carly Rae Jepsen defende a liberdade de todos serem quem são e fazerem o que quiserem se isso os fizerem felizes. Algumas participações em seu clipe, são, inclusive, pessoas que conheceu por meio do Instagram, como a menina que enfia a cara no pão de forma e o rapaz que dança “Cut To The Feeling” com toda sua energia envolto à bandeira LGBT. Quando a gente abraça as diferenças do mundo e a intensidade dos nossos sentimentos com carinho fica bem mais divertido superar qualquer fase ruim.

Para saber mais: Carly Rae Jepsen: Quando os sentimentos são os únicos fatos

thank u, next, Ariana Grande

Por Yuu

Atrevo-me a dizer que este foi um ano marcante para Ariana Grande, pessoal e profissionalmente, com altos e baixos e muitos aprendizados. Do lançamento do seu quarto álbum de estúdio, Sweetener, ao noivado que não foi com o comediante Pete Davidson e a perda de seu amigo e ex-namorado Mac Miller a cantora que afirmava não ter mais lágrimas para chorar se viu muito surpreendida. Sua forma de superar tantas reviravoltas em tão pouco tempo, no entanto, foi uma cartada grandiosa: Ariana voltou aos estúdios, escreveu um punhado de canções e anunciou que antes de 2018 terminar ela lançaria seu quinto álbum, just like that.

O single “thank u, next” chegou de surpresa como um hino pós-término. Na música, Ari dá nome aos bois de forma a agradecê-los publicamente por tudo que eles lhe ensinaram no tempo que passaram juntos, fossem coisas boas ou más, amor, paciência ou dor; e é também um hino de autoapreciação, visto que todas essas experiências no campo amoroso ajudaram a construir a pessoa que hoje ela se tornou. E essa pessoa acontece de ser a Mulher do Ano da Billboard, com o recorde de streams no Spotify e visualizações na VEVO. O vídeo da música, aliás, é uma obra de arte à parte. Dirigido por Hannah Lux Davis, o clipe de “thank u, next” é uma homenagem aos filmes mais icônicos dos anos 2000: Meninas Malvadas, As Apimentadas, De Repente 30 e Legalmente Loira e o que esses filmes têm em comum — além de serem escolhas fáceis para qualquer sessão entre amigas — são as histórias de garotas no protagonismo que precisam subverter todas as concepções errôneas sobre elas e o fazem com muito sucesso. Um hit é um hit. Thank u, next, bitch.

Para saber mais: Sweetener e “thank u, next”: os divisores de águas de Ariana GrandeMeiga, porém perigosa: A evolução de Ariana Grande

The Pains Of Growing, Alessia Cara

Por Thay

Alessia Cara tem apenas vinte e dois anos, mas tem muito a dizer. Nascida em Brampton, no Canadá, escrevia poemas quando criança, aos dez anos aprendeu a tocar guitarra e aos treze criou um canal no YouTube onde publicava as versões que fazia para músicas famosas. Em 2015, aos dezenove anos, lançou seu primeiro álbum, Know-It-All, e logo se tornou um sucesso com seu hit “Scars to Your Beautiful”. Uma coisa leva a outra e logo Alessia estava cantando ao lado do rapper Logic a música “1-800-273-8255”, além de “How Far I’ll Go” escrita por Lin-Manuel Miranda para Moana. A escalada de sucesso de Alessa culminou com sua indicação para o Grammy Awards de 2018 como melhor nova artista, mas o ano da cantora ainda teria mais um sucesso: The Pains Of Growing, seu segundo álbum de inéditas. Assinando todas as quatorze canções, Alessa mantém a sinceridade presente no primeiro álbum mas consegue amadurecer ainda mais como artista. Seus versos são delicados e falam sobre como a jovem mulher que é está em busca de seu lugar no mundo, de se encontrar e entender como indivíduo. Os dramas de Alessa podem ser intrínsecos à sua idade, mas encontrarão eco em todas nós quando sua voz doce canta sobre corações partidos e solidão, mas também sobre medo e depressão.

As músicas presentes em The Pains Of Growing, saídas da adolescência de sua criadora, conversarão intimamente com jovens mulheres e seu dilemas. Alessia Cara fala sobre a pressão das redes sociais, como é viver em um mundo que não nos trata com gentileza. Mas os temas mais presentes em seu segundo álbum são, certamente, sobre relacionamentos amorosos. Em “Comfortable” fala sobre como o período após a “lua de mel” em um relacionamento é confortável, enquanto em “I Don’t Want To” ela canta sobre como não quer superar o final do relacionamento com alguém a quem ainda se ama. “Out Of Love” é um dolorido questionamento sobre os motivos que fazem com que alguém pare de te amar. Vulnerabilidade, afinal, é só um outro nome para as dores de crescer, de se tornar adulta.


** O fundo da arte em destaque é de autoria da nossa colaboradora Carol Nazatto. Para conhecer melhor seu trabalho, clique aqui!

** A montagem da arte é de autoria da editora Ana Luíza. Para ver mais, clique aqui!