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O 2019 alvinegro do futebol feminino

“Fala, Fiel!”

Quem acompanhou o futebol feminino do Corinthians, alvinegro de São Paulo, está mais do que acostumado a ser saudado nas redes sociais com essas duas palavrinhas. 2019 foi daqueles anos do futebol feminino que a gente nunca vai esquecer. Sem deixar de lado os pequenos e os grandes passos que a gente ainda precisa dar para que a modalidade seja respeitada, o que se viu do futebol ano passado foi de encher os olhos com aquele brilho de quem está assistindo a espetáculo atrás de espetáculo.

O Corinthians começou o ano com o “peso” de continuar seu ótimo desempenho em competições. No ano anterior, 2018, o clube havia finalizado sua parceria com o Audax, time do interior de São Paulo, com quem dividia a gestão do futebol feminino, e percebeu que cabia a si mesmo superar suas próprias marcas.

Dizer que as expectativas foram atingidas é dizer muito pouco.

Em 2019, o clube chegou a 34 vitórias seguidas (números históricos para a modalidade, seja feminina ou masculina, no MUNDO), e às finais dos principais campeonatos que disputou: o Campeonato Brasileiro (contra a Ferroviária, de quem perdeu), o Campeonato Paulista (contra o São Paulo, de quem ganhou) e a Copa Libertadores (também contra a Ferroviária, de quem ganhou).

O grande destaque vai para a final do Campeonato Paulista, disputado em casa (e por casa eu quero dizer Arena Corinthians, sim, o mesmo estádio dos meninos) e que registrou recorde de público que foi prestigiar o futebol feminino: quase 29 mil pessoas saíram de suas casas para assistir mulheres jogarem.

É o melhor técnico do Brasil!

O bom trabalho do Corinthians não se restringe apenas ao campo.

A comissão técnica, liderada por Arthur Elias, tem feito um ótimo trabalho e o técnico possui uma opinião bem lúcida com relação ao futebol feminino brasileiro. O paulista de 38 anos tem experiência quando falamos de futebol feminino, começou a treinar quando ainda tinha 20 anos, em uma equipe universitária de futsal feminino.

No futebol feminino de campo, com 24 anos começou um projeto na USP para crescimento de jogadoras (quase como um “olheiro” mesmo, prestando atenção naquelas que se destacavam). Depois de passagens vitoriosas pelo time do Centro Olímpico, de São Paulo, Arthur assumiu o Corinthians em 2016, quando o time ainda tinha parceria com o Audax, e está lá desde então. Ele chegou inclusive a ser um nome cotado para substituir Vadão no comando da Seleção Brasileira Feminina, que acabou ficando com Pia Sundhage, anunciada no meio de 2019.

Precedente perigoso

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Nós não podemos deixar, porém, que o 2020 do Corinthians seja uma repetição do que foi os últimos anos do futebol feminino, especialmente quando falamos de Seleção Brasileira. Ou seja, que o torcedor (ele mesmo, o homem cisgênero hétero) só dê atenção ao futebol feminino quando o masculino está na pior, como é o caso do time masculino do Corinthians, que fez uma campanha preocupante no último ano. O caminho não é por aí.

Em entrevista à Olga Bagatini, repórter do Yahoo!, Arthur Elias disse que acreditou no futebol feminino por ter sentido mais estabilidade para trabalhar com atletas de alto rendimento. Ele também diz que foi quando começou o projeto na USP lá em 2006 que vislumbrou um futuro crescimento da modalidade — hoje, 14 anos depois, podemos dizer que ele é um dos profissionais mais aptos do mercado e um dos que mais entendem de futebol feminino.

Isso conversa em alguns aspectos com o imediatismo cada vez mais presente no futebol masculino, onde a “moda” é buscar jogadores jovens e os “mais velhos” acabam sendo só um repositório de moral e liderança em alguns clubes, e onde técnicos precisam mostrar resultado a curto prazo. A sensação que passa é que não é estável, não é confiável, não é seguro. Não há plano de carreira e possibilidade de evolução. É uma tentativa e erro, onde os técnicos pensam que “tudo bem” ser demitido de um cargo por um resultado ruim, pois recebem a multa de rescisão de contrato, ficam uns meses parados, e são contratados para outro time.

É preciso que os clubes façam com que os torcedores acreditem cada vez mais no futebol feminino assim como os profissionais que trabalham pra fazer acontecer, e isso não se faz apenas da porta de casa pra fora. A “arrumação da bagunça” precisa vir inclusive de mais longe, de cima pra baixo. Falo aqui da última passagem de Emily Lima pelo Santos, onde ela precisou expor as jogadoras dormindo em um saguão de hotel em Manaus por falta de organização do Campeonato Brasileiro Feminino por parte da CBF, Confederação Brasileira de Futebol.

O que esperar do Corinthians em 2020?

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“Continuidade” parece ser a palavra do Corinthians para 2020. Além das renovações de elenco, contrastando com os desmanches de muitos clubes fortes como Santos e Flamengo, o clube também trouxe Andressinha de volta pra casa.

Após grandes temporadas em clubes fortes e premiados no futebol feminino como o Iranduba e o Ferroviária, e depois de ter passado a temporada de 2019 no futebol americano jogando pelo Portland Thorns, Andressinha é camisa 17 na Seleção Brasileira, e sua vinda ao Corinthians torna o time com mais jogadoras que atualmente defendem a canarinha em competições internacionais.

A Seleção Brasileira tem partidas importantes marcadas para esse início de 2020 como forma de preparo para as Olimpíadas Tóquio-2020 cuja cerimônia de abertura é dia 24 de julho. Começamos a temporada em um torneio amistoso a ser realizado entre os dias 4 e 10 de março, jogando dia 4 contra a Holanda (3º lugar no ranking da FIFA) e dia 7 contra a França (4º lugar no ranking da FIFA, e seleção que nos eliminou da última Copa do Mundo).

As jogadoras que forem convocadas do Corinthians farão falta em jogos de segunda fase do Campeonato Brasileiro (que tem a primeira e a segunda fase jogadas entre fevereiro e maio). Até agora, as datas FIFA do Futebol Feminino não irão prejudicar o clube nem no Campeonato Paulista e nem na Copa Libertadores.

Não se fala em outra coisa?

O Corinthians ainda faz um bom trabalho em suas redes sociais.

Embora muitos clubes (como o Santos) optem por usar apenas uma conta de Twitter para dar suas notícias de futebol, o alvinegro de Itaquera resolveu fazer uma conta apenas para o feminino, e ela tem dado muito certo. Numa tentativa de trazer cada vez mais os torcedores pra perto das meninas, o Twitter que já conta com 52 mil seguidores (número que só cresce), acompanha os treinos e as resenhas das jogadoras, com uma média incrível de engajamento para a modalidade. O corinthiano quer mais é ver seus times brilhando.

Apesar disso, uma parte dos torcedores ainda questiona porque o perfil oficial do clube ainda não fala tanto sobre o futebol feminino. Por exemplo, em coluna publicada no Meu Timão, Andrew Sousa questiona se o time sabe o tanto que a contratação de Andressinha representa para o futebol do país.

“Como pregar respeito para as minas se, em um momento tão importante, o descaso prevalece?

Em um mundo ideal, o perfil do Corinthians Feminino teria o mesmo número de seguidores que o oficial. Mas não é assim. E passa longe. Hoje, é possível que muitos alvinegros nem saibam que uma atleta com tamanho currículo treina no Parque São Jorge para a próxima temporada.

A torcida precisa saber que o clube é exemplo no feminino e se fortalece cada vez mais. Para isso, o próprio clube precisa avisá-los.”

A coluna de Andrew nos faz pensar sobre a necessidade de uma separação de um perfil apenas para notícias do futebol feminino. É sobre ainda precisar dar pequenos e grandes passos em direção a uma representação mais igualada que comentamos no início desse texto. Qual a abordagem certa afinal? Deixar tudo num perfil só como o Santos faz, e correr o risco de pular notícias importantes, ou separar os perfis e tratar o feminino como algo secundário ao time principal que segue sendo o masculino?

Por aqui, estamos ansiosas pra ver o que o Corinthians fará dentro e fora de campo com seu futebol feminino. E sem secar ninguém: eu quero é vê-las Rainhas de toda a América!


Fontes