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Kardashians: uma história

Para os olhos não tão treinados, o sucesso épico construído pela família Kardashian pode parecer repentino. Hoje em dia, todos os membros da família são ícones tanto na internet quanto na TV, e todo o merchandising e promoção de conteúdo derivam desse sucesso. Mas, antes de tudo, as Kardashian são uma família rica como qualquer outra família rica. Então, como foi que, de filhas mimadas de Calabasas, elas se tornaram reconhecidas mundialmente? Quem são essas pessoas? E por que escrever sobre elas?

Naturalmente, elas não se materializaram na TV em algum momento do ano retrasado. Pelo contrário, a família já estava envolvida em dramas televisivos há décadas. Para quem não sabe, o patriarca da família foi o falecido Robert Kardashian, advogado conhecido por defender O.J. Simpson, amigo de longa data da família, no julgamento pelo assassinato de sua esposa, Nicole Brown Simpson, melhor amiga da ex-esposa de Robert, Kris. O caso, que ficou conhecido como um dos julgamentos mais controversos dos Estados Unidos, foi recentemente adaptado na primeira temporada de American Crime Story.

Alguns anos mais tarde, a família passou a protagonizar o próprio reality show. Keeping Up With the Kardashians foi lançado em 2007, resultado de uma parceria entre Kris (na época, casada com Bruce Jenner, que depois anunciou ser uma mulher trans e mudou seu nome para Caitlyn) com o produtor de TV Ryan Seacrest. Na época, Kim Kardashian era conhecida por ter sido assistente de Paris Hilton e ter sofrido com o vazamento de uma sex tape com seu ex. Kris, então, resolveu investir em um programa sobre sua família e incentivar a carreira das filhas.

Os episódios de Keeping Up With the Kardashians são geralmente focados em algum drama familiar do momento e seguem o típico formato de reality shows, com câmeras seguindo os membros da família e comentários em estilo confessionário. O reality acompanha, principalmente, as vidas de Kim, Kourtney e Khloé, as três filhas de Robert e Kris, que começam como empresárias, gerenciando a butique Dash, em Los Angeles, e tendo o incentivo da mãe para almejarem a fama. Em segundo plano, está a própria Kris, Caitlyn, e as filhas Jenner, ainda crianças, Kendall e Kylie. O filho de Kris com Robert, Robert Jr. também aparece de vez em quando e o mesmo pode ser dito sobre Brody Jenner, filho de Caitlyn de um casamento anterior (se o nome parece familiar, é porque ele é: Brody também esteve em The Hills).

Com o desenrolar das temporadas, notamos também a evolução — pessoal e profissional — dos membros da família. Criticadas por serem “famosas por serem famosas”, vimos que as Kardashians tiveram sucesso em diversos projetos ao longo do tempo: linhas de roupas, sites, apps, cosméticos, trabalhos de modelo, etc. Gostem ou desgostem, não se pode negar o poder delas como empresárias. Mas quem é quem nessa família?

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A maior referência e provavelmente mais reconhecível é Kim. Kim Kardashian West foi quem, basicamente, colocou toda a família sob os holofotes. O mais fascinante é que a primeira vez que ela se tornou notícia foi pela questão da sex tape, mas hoje esse é um assunto do qual quase não se fala. Depois da estreia de KUWTK, Kim atingiu um novo nível de sucesso, tendo mantido a Dash, lançado diversas linhas de roupa, sido porta-voz de inúmeros produtos, posado na Playboy, produzido um jogo, etc. Ela também se casou com Kanye West, com quem teve dois filho: North e Saint.

As outras irmãs Kardashian tiveram sucesso parecido. Kourtney, que durante a maior parte das temporadas teve um relacionamento conturbado com Scott Disick, é mãe de três crianças adoráveis (Mason, Penelope e Reign) e também continua trabalhando na Dash e no seu conteúdo de redes sociais. Já Khloé, além de tudo isso, recentemente se dedicou à vida fitness e escreveu um livro sobre sua jornada com a aceitação do corpo.

Já as filhas Jenners tiveram um relacionamento diferente com os holofotes durante o programa. Tendo basicamente crescido na frente das câmeras, as duas se aproveitaram da fama e do reconhecimento de formas diferentes: Kendall, a mais velha, se dedicou à carreira de modelo. Kylie, por sua vez, investiu nos cosméticos: conhecida por seus lábios preenchidos, ela lançou um kit de batom que imita seu look e tem tido bastante sucesso. Todas, no entanto, são bem unidas e lançaram até mesmo um app juntas, além de linhas de roupas e sapatos de diversas marcas. Tudo, é claro, sob o olhar da momager Kris.

Mas, afinal, por que elas são tão odiadas pelas pessoas?

Kim Kardashian é uma pessoa convencionalmente bonita. Ela usa maquiagem, arruma o cabelo, compra roupas de grife, tem um glam squad enorme, fez ensaios fotográficos e foi porta-voz de produtos. Mas ela também não é convencionalmente bonita em outros sentidos. Ela é armeno-americana, o que significa não ser branca, loira, de olhos azuis e ter porte de modelo.

É inegável que ela reforça alguns padrões de beleza com sua fama. No entanto, Kim e sua ascensão também quebram alguns. Ela não é convencionalmente magra e se aproveitou de alguns atributos para criar uma imagem de si mesma como dona de um corpo a ser admirado. Longe de ser um ícone feminista ou de acabar com os padrões de beleza hollywoodianos, alguém como Kim, com quadris largos, por exemplo, não deixa de ser um ponto de esperança.

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Seguindo esse caminho de padrões de beleza, é preciso considerar também as outras irmãs. Khloé, que se separou do marido questionável e resolveu investir no próprio corpo, por exemplo. Não se trata da maior conquista feminista da história, mas é inegável a vibe de poder que emana de alguém que resolve mudar o foco da sua vida depois de um relacionamento ruim. Khloé até mesmo lançou um livro sobre o tema, marcando mais pontos para a dominação Kardashian em todos os mercados do entretenimento.

São as irmãs Jenner, no entanto, que parecem experimentar o momento de maior destaque. Quando perguntei no Twitter quem era a Kardashian favorita das pessoas, elas foram o grande sucesso, definitivamente fazendo valer o crescimento coberto pelos holofotes. A mídia até mesmo criou um portmanteau: KarJenners. Kendall e Kylie, as duas irmãs Jenner, possuem tanto, senão mais, poder do que as irmãs mais velhas e sabem usar as redes sociais a seu favor. Mesmo mais novas, elas não perderam tempo, e souberam como usar a fama desde bem cedo.

Kendall, como dito antes, virou modelo. Junto com as outras amigas famosas e socialites (Gigi Hadid, Cara Delevigne, Hailey Baldwin), a garota conseguiu emplacar trabalhos tanto nas passarelas quanto voltados para a internet. Há quem diga que isso só acontece porque ela já é famosa e que não se fazem modelos como antigamente. É verdade que contatos ajudam, mas o que acho mais interessante sobre Kendall e suas amigas é como elas conseguem criar identidades apesar de virem de famílias conhecidas. São modelos e têm trabalhos, mas também têm fãs e presença na internet — o que é mais interessante do que ser definida por uma indústria problemática como a da moda.

Já Kylie tem sua linha de cosméticos, além das contas em redes sociais para divulgar tanto seus produtos quanto de outros fabricantes. Como me disse a Anna Vitória uma vez: “ela é a millennial que deu certo”. Com um monte de privilégios, fama e dinheiro, mas o senso de oportunidade e ações foi genial.

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Tudo isso tem um fator em comum: interesses que são considerados fúteis. Para muitos opositores da família Kardashian, elas são famosas por motivo nenhum, ou só servem para falar de coisas fúteis. Minha pergunta é: por que esses interesses (normalmente tidos como “de mulherzinha”) são considerados fúteis? E por que mulheres que conseguem fama e dinheiro nessas áreas são minimizadas? Duvido que se algum filho de milionário fizesse mais dinheiro e fama fazendo propaganda de carros, por exemplo, alguém escreveria reclamando nos comentários do BuzzFeed. Ou chamaria o cara de escória da sociedade e lixo humano — o tipo de comentário que as KarJenners recebem.

Quando a revista Cosmopolitan chamou esse grupo tão controverso de “primeira-família dos EUA”, houve quem surtasse. Bom, os Estados Unidos têm uma primeira-família de verdade, os Obama, mas não se pode negar que, quando se trata de publicidade, ninguém domina o país melhor do que as Kardashians. Elas atingiram um status (tanto em meios tradicionais como na TV e na imprensa, quanto nas redes sociais) de celebridade absurdo e o fascínio e escárnio que as pessoas colocam em cima da vida delas dá dinheiro. Mas a união familiar é inquestionável e o matriarcado também. Kris é quem gerencia a grande marca familiar; Kourtney é mãe de três crianças e coloca os filhos acima das necessidades do agora ex-marido; e Kim constantemente sai em defesa das irmãs na internet.

É uma família de mulheres. Elas têm irmãos, meio-irmãos que aparecem de vez em quando. Alguns ex-namorados problemáticos e maridos que aparecem vez ou outra. Mas eles são figurantes em suas histórias de sucesso. É claro que, para um reality, muito é editado e roteirizado. Mas também é claro que, na grande percepção pública, o foco são as mulheres da família. Na construção da imagem que elas mesmas editam (tanto no reality quanto na internet), são elas e seu próprio trabalho, não importa o quanto ele seja considerado fútil, que recebem o destaque.

No fim das contas, o que nos atrai é justamente a questão familiar. O que as conecta a audiência não é o fato delas gastarem milhões em jatinhos particulares ou falarem coisas desconectadas da realidade de gente comum. O que capta o interesse público são as brigas na mesa de jantar. Kim ter que morar com a mãe enquanto sua casa está em reforma e os dramas que isso desencadeia. Kendall e Kylie, milionárias adolescentes, brigando sobre quem pegou a roupa da outra sem pedir. Divórcios, casamentos, crianças. Segredos revelados e, ao mesmo tempo, uma união bem forte. Um reality baseado no almoço de domingo de todos, e não só de quem tem família rica e influente. Que “todas as famílias felizes são parecidas, todas as infelizes são infelizes à sua maneira” já sabemos. Mas as reais são as que misturam isso a uma dose de drama. E são essas as que nos fascinam.

18 comentários

  1. Adorei seu texto. E tbm adoro as Kardashians.
    Independente disso, já questionei algumas vezes, porque moda e beleza são vistas como algo fútil, mas videogame e carros não? Ok, eu sei que carro é importante para muitas coisas, mas ter o carro do ano com inovação x, y e z não são importantes, são só status. Porque os filmes que são voltados para o público feminino são ridicularizados, mas os de super-heróis não? Afinal, não é tudo entretenimento?

    1. Meu ponto exatamente, Alana. Tipo, por que curtir moda é algo necessariamente fútil e por que homens ricos gastam com o que querem? E #teamKardashians

  2. Amei seu ponto-de-vista! Muitas coisas que eu já questionava você conseguiu explanar com magnitude e bons argumentos!

  3. Adorei a matéria! Uma pena que o Canal E! só tem deixado a opção dublado na nova temporada. :/ Podia ter a opção legendado também

  4. Adorei o texto!
    Confesso não ser fã das Kardashians e acho que talvez elas sejam meio “supervalorizadas”, mas isso não quer dizer que não tenham seu valor. Elas tem, sim, coisas a nos ensinar.
    Além disso, sobre a futilidade, eu concordo plenamente que há uma grande diferença de tratamento entre os assuntos “fúteis” associadas ao universo feminino e masculino. E, ainda, acho que as pessoas se esquecem que cada informação tem seu objetivo e sua função – e não há nada de errado na função de entreter.

  5. Adorei o texto, e preciso dizer que minha Kardashian favorita é… a KRIS!! Acho ela genial, pela ideia do reality, como ela conduz a carreira das filhas, os negócios da família e tudo mais… Sem dúvidas uma mulher que faz dos limões uma bela limonada!

  6. Eu tentei assistir KUWTK mas realmente e muito ruim. Nao tem conteúdo e de forma alguma e exemplo de alguma coisa. Porem eu aplaudo a eficiência e capacidade que essa família tem de fazer transformar tudo que tocam em sucesso.

  7. Também gosto das Kardashians pelo empoderamento, e principalmente, como vc mencionou, apesar de serem ricas e influentes, terem problemas tão semelhantes e banais como os nossos… Minha família também tem muitas mulheres, e, à exceção do dinheiro, os dramas são parecidos!! hahaha

  8. Gostei muito do seu texto, adoro as Kardashians, e recentemente li uma entrevista que a Kris deu pra Harper bazzar americana e quando foi questionada sobre os haters e comentários negativos sobre a família e ela deu a melhor resposta ever, algo do tipo: entendo que tenha pessoas que não goste de nós ou do que fazemos, mas nós não chegamos até aqui no ar a 10 anos na tv e movendo tantas pessoas ao nosso encontro por onde passamos se fossemos tão ruins assim, é o que tento passar para os meus filhos, eles são boas pessoas e sim estão fazendo algo bom pelas pessoas, sempre recebemos mensagens agradecendo de alguma forma, então é isso que vale.

  9. Lore, amei teu texto. Antes achava bizarro o reality, mas gente…não tem como resistir, amo a Khloe e o Mason, a relação dela com todos os sobrinhos. Elas são odiadas por muitos por terem o poder, influência e dinheiro que as pessoas queriam ter mas não tem a coragem delas para tentar.

    Amei seu blog, não conhecia e já cheguei chamando de Lore (uia) kkkkk
    beijo

    Lua xx

  10. Você escreveu exatamente o que eu sempre pensei das Kardashians. As pessoas pensam que talento é só cantar, desenhar, escrever e etc, mas o dom delas pro empreendimento não conta? Kris é genial! Ela consegue fazer tudo virar marketing e eu admiro muito ela por isso, sério mesmo. As KarJenners tem lá seus momentos problemáticos, mas quem não tem, não é? E é lindo ver a Kim defender nosso direito de mostrar o próprio corpo mesmo nós não estando no padrão hollywoodiano da coisa ♥

  11. Um pouquinho atrasado, mas entrei nesse site por uma curiosidade: Como as Kardashians alcançaram a fama?
    E esse blog ajudou muito com certeza a entender a trajetória delas e como elas ficaram tão famosas apenas por ser figuras públicas.

  12. Seu texto ficou incrível!
    Poderia escrever sobre mulheres que assim como eu batalha para conseguir um lugar ao sol na música sertaneja, mas somos engolidas pelas duplas masculinas. Hoje um pouco mais aceitável. Mas ainda enfrentamos uma barreira muito grande.

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