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Vinte e Cinco, Vinte e Um: nostalgia, sonhos e coming-of-age

Coreia do Sul, 1998. Uma crise financeira assola o país, levando empresas e famílias à falência. Nesse cenário improvável, seis jovens completamente diferentes se aventuram no início da vida adulta enquanto buscam seus sonhos e desvendam amor e desafios juntos. A narrativa coming-of-age do k-drama Vinte e Cinco, Vinte e Um emociona com as lembranças de um tempo difícil mas cheio de possibilidades.

Atenção: este texto contém spoilers!

A protagonista da trama é Na Hee-do (Kim Tae-ri) que, aos 19 anos, vê os sonhos ameaçados pelo término da equipe feminina de esgrima da escola por conta dos problemas financeiros decorrentes da crise. Muito determinada e confiante em suas ambições, Hee-do faz de tudo para conseguir transferência para a escola onde sua maior inspiração treina: Ko Yu-rim (Bona), jovem esgrimista que acaba de conquistar a medalha de ouro para a Coreia do Sul.

Vinte e Cinco, Vinte e Um

Na turma nova, Hee-do logo conhece Moon Ji-woong (Choi Hyun-wook) e Ji Seung-wan (Lee Joo-myung). Os dois personagens são apresentados como amigos de infância, que cuidam um do outro como irmãos, o que confere um ar diferente à dinâmica do descolado despreocupado com a estudiosa centrada.  Beak Yi-jin (Nam Joo-hyuk) completa o grupo principal. Mais velhos dos jovens, com 21 anos, a preocupação de Yi-jin é conseguir um emprego para ajudar a família, cuja empresa foi à falência com a crise. Quando se conhecem, ele e Na Hee-do não têm uma boa impressão um do outro, mas os dois continuam a se esbarrar e uma amizade profunda começa a crescer e evoluir para algo mais.

Vinte e Cinco, Vinte Um apresenta tramas complexas e sem pontas soltas. Ao longo dos episódios, tanto protagonistas quanto coadjuvantes possuem desafios a enfrentar ou traumas passados a resolver, com arcos de desenvolvimento bem escritos e coerentes. A série consegue transportar quem assiste para o meio dos acontecimentos. Mas, como uma grande viagem no tempo, a história não acontece no presente.

Na verdade, o enredo acompanha os relatos que a jovem Na Hee-do fez nos diários de sua adolescência. É a filha dela que encontra os antigos cadernos e traz a história à tona em pleno 2021. Como resultado, a série tem um clima forte de nostalgia, de aventuras passadas, que aumenta conforme o final dos episódios se aproxima. Ainda assim, Vinte e Cinco, Vinte e Um consegue esquentar corações com a leveza de acontecimentos cômicos juvenis, o carinho de amizades profundas e a esperança de um futuro em que sonhos se tornem realidade.

Força feminina

Vinte e Cinco, Vinte Um

Ponto marcante de Vinte Cinco, Vinte e Um, as personagens femininas são retratadas com bastante complexidade. Um destaque especial para a amizade de Na Hee-do e Ko Yu-rim, que passa por uma evolução digna de enemies to lovers, mas que não decepciona. Na Hee-do praticava esgrima para honrar a memória do pai e porque a fazia feliz; Yu-rim também jogava por prazer, mas sempre carregando a responsabilidade de ser bem sucedida para ajudar a família financeiramente. O medo que Hee-do a superasse leva Yu-rim a ser hostil no início. Ela rejeita e humilha a novata até perceber que, apesar de tudo, uma era quem mais podia entender as angústias e as alegrias da outra. A partir desse ponto, a amizade que se inicia é de cumplicidade, admiração e respeito.

Ambas eram jovens prodígios da esgrima, que, sem saber, evoluíram no esporte motivadas uma pela outra. É ótimo ver uma representação de amizade feminina completamente oposta aos estereótipos de competição, em que, mesmo sendo rivais nas partidas, torcem genuinamente pelo sucesso da amiga. O mesmo espírito de sororidade está presente no apoio da equipe de esgrima à Lee Ye-ji (Joo Bo-young), quando ela decide deixar o esporte. As meninas se empenham em treinar com a amiga até que ela pudesse cumprir as demandas da treinadora para sair do time, comemoram o sucesso e a deixam partir com mensagens motivadoras.

No mesmo episódio em que Ye-ji deixa a equipe, um dos mais emocionantes, Ji Seung-wan também passa por uma “desistência”. Depois de tentar denunciar a violência no tratamento dos professores e não ser ouvida, ela opta por deixar a escola, mesmo que isso significasse atrasar em um ano o vestibular para o qual tanto se preparou. Contra todos, ela se mantém firme na decisão tomada e atravessa (ou melhor, pula) o portão da escola junto a Lee Ye-ji, mantendo a cabeça erguida. No final das contas, nenhuma das duas desistiu de nada, apenas foram corajosas o bastante para buscar um novo caminho quando o que estavam seguindo não as satisfazia mais.

Não há outra maneira de descrever Ji Seung-wan se não como icônica. A personagem foge do estereótipo do nerd usual e retrata o peso da busca pela excelência acadêmica, a exaustão emocional das “dores do crescimento”, além da coragem de colocar seus sonhos em espera para seguir o que acredita ser certo no momento. Ela trabalha para conseguir o que quer, é engraçada e rebelde a seu jeito, uma personagem com quem é fácil se identificar.

Outra relação conturbada e emocionante é a de Hee-do com a mãe, âncora de um importante telejornal. Shin Jae-kyung (Seo Jae-hee) introduz a discussão sobre o difícil equilíbrio da balança entre vida pessoal e profissional. A vida de Hee-do com a mãe era marcada pela distância e pela frieza por causa do passado em que Jae-kyung não pôde estar sempre presente, já que a carreira exigia muito dela. As constantes faltas da mãe, em especial depois da morte do pai da menina, afetaram a confiança, o carinho e o respeito entre as duas. A distância aumentou até que se tornou insustentável e as duas precisaram se enfrentar, expondo os sentimentos e as mágoas acumuladas. Aos poucos, Hee-do passa a compreender o lado da mãe e Jae-kyung começa a tentar compensar a ausência, o que faz com que mãe e filha recuperem o amor perdido.

Para terminar, é impossível não comentar sobre Yang Chan-mi (Kim Hye-eun), a treinadora da equipe de esgrima. A personagem rouba a cena diversas vezes com a energia correspondente a de um mestre Yoda irreverente e levemente narcisista. Com as práticas duvidosas e sem razão que, na verdade, escondem uma sabedoria valiosa, Yang Chan-mi guia as meninas no esporte e na vida.

Em defesa do final 

Vinte e Cinco, Vinte Um

É verdade que finais românticos “infelizes” não agradam a todos. O casal não terminar junto pode, sim, dar calafrios e provocar choro e desespero nos espectadores. Mas Vinte e Cinco, Vinte e Um prova que o término não está sempre associado à falta de amor ou carinho e que pode ser a única escolha pelo bem mútuo dos envolvidos. Como as pessoas, a vida e os objetivos mudam, o que parecia promissor pode deixar de ser e o afastamento se torna a melhor opção. Assistir ao adeus de Na Hee-do e Baek Yi-Jin dói — e muito —, mas o amor que viveram foi crucial para que os dois crescessem e sobrevivessem às dificuldades enfrentadas. E no momento em que deixou de ser, esse mesmo amor abriu espaço para que eles trilhassem caminhos separados que os levariam para onde queriam chegar.

Quando se conheceram, Na Hee-do e Beak Yi-jin encontravam-se em momentos turbulentos. Os sonhos dela de se tornar uma grande esgrimista pareciam perdidos com o fim da equipe da escola. A vida dele tinha sido virada de cabeça para baixo ao precisar largar a faculdade, encontrar um emprego e se afastar da família depois da falência. Marcada por encontros e desencontros, a amizade dos dois passa a ser o principal ponto de apoio deles, até mesmo à distância.

Durante todo o relacionamento, os dois funcionam como polos opostos que se equilibram. Hee-do é impulsiva e ingênua, mas também otimista, determinada e bem-humorada. Yi-jin encara a vida com seriedade e pessimismo, mas é focado, talentoso e ambicioso. Quando ela está com problemas, ele está lá para ajudar a resolvê-los com calma e uma boa dose de atitudes pé no chão. Se o peso da realidade é muito para ele carregar, a presença leve e animada dela diminui as preocupações e o incentiva a não desistir. No momento em que se encontram sozinhos, saber do apoio e da torcida do outro é tudo o que precisam para se reerguer e continuar tentando.

Ao doar um pouco de si e levar um pouco do outro, o namoro de Hee-do e Yi-jin permite que os jovens amadureçam. Ela se torna medalhista de ouro pela equipe nacional de esgrima, enquanto ele evolui no jornalismo, carreira que o acolheu, e consegue um cargo como correspondente internacional em Nova York. No entanto, as agendas corridas de viagens praticamente impossibilitam que os jovens se encontrem, dificultando o relacionamento, em especial por Hee-do já ter um trauma da vivência similar de faltas que teve com a mãe. O momento que culmina na separação acontece justamente enquanto estão longe. Quando o apoio de Hee-do deixa de ser suficiente para Yi-jin e a ausência dele é dura demais para ela, o namoro parece perder o sentido. Nas próprias palavras dela, ninguém fez nada de errado, mas eles acabaram se distanciando mesmo assim.

No meio da história dos dois, quando Na Hee-do ainda não entendia o significado dos sentimentos por Beak Yi-jin, ela diz que os denominaria de “arco-íris”, ao que ele responde com o primeiro “eu te amo” do casal. Eles nunca precisaram de nomes diferentes, do início ao final, foi sempre amor, apenas em formas diferentes: amizade, romance, saudade, carinho e admiração. Anos depois da separação, durante a entrevista sobre sua última medalha de ouro, Hee-do mostra que ainda se preocupa com Yi-jin e ele é sincero ao parabenizar a jovem pelo sucesso na carreira e pelo casamento. O término abriu espaço para o crescimento próprio, um carinho profundo e boas lembranças de um primeiro amor.

O fato da história ser narrada como uma memória e de assistirmos o desenrolar do relacionamento como um elemento do passado deles ajuda a diminuir a dor ao transformar a saudade em nostalgia.  Aos vinte e cinco e vinte e um anos, Baek Yi-jin e Na Hee-do se afastam, o que não significa que não fossem as pessoas certas um para o outro naquele momento. Eles se apoiaram, impulsionaram e quando não foi mais possível seguirem juntos, o amor que ainda sentiam permitiu que eles continuassem crescendo sozinhos.