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Como Pitty contribuiu para minha formação como mulher

Pitty não foi minha primeira grande ídola mulher. Com mais ou menos dois anos de idade fui muito fã da Daniela Mercury e, depois, vieram várias outras meninas e mulheres mais apropriadas à minha faixa etária na época. Mas, uma hora, a infância acabou e eu comecei a entrar naquela fase de autoafirmação em que precisamos escolher e construir nossas personalidades e gostos, momento crucial em que nossos caminhos se cruzaram e Pitty entrou na minha vida, trazendo uma perspectiva e sensatez que ninguém mais poderia ter fornecido à minha formação.

Claro, minha mãe influenciou a pessoa que sou hoje, assim como minhas avós, tias e muita gente que possivelmente não lembro, mas que existiu e passou pela minha vida. Ainda assim, o papel de um ídolo, alguém que conscientemente nos inspiramos e espelhamos, é essencial. Especialmente para uma menina de treze anos de idade.

Como alguém que sempre gostou muito da sonoridade do rock, esse clube do bolinha da pesada, encontrar uma figura relativamente tão próxima e acessível foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido. E, por mais que com o passar dos anos eu tenha percorrido outros caminhos e me distanciado de seu trabalho, Pitty continua sendo uma artista querida no meu coração e as influências que deixou em minha vida duram até hoje e vão durar para sempre: em coisas simples, como a gata que adotei dez anos depois ou as tatuagens que não canso de fazer, ou em coisas mais profundas e fundamentais da pessoa que sou hoje e me orgulho de ser.

Pitty

A lista de coisas que Pitty me deu sem nem saber que eu existia é imensa. A começar por essas palavras. Claro, as palavras nasceram comigo, ou eu dificilmente estaria aqui, hoje. Mas a inspiração para começar a blogar e dividir com o mundo meus pensamentos — a princípio desconexos e depois cada vez mais elaborados — veio dela. A vontade de aprender instrumentos, ainda que sempre tenha faltado a disciplina para praticar e insistir, veio dela. Ela não era só uma mulher a quem eu admirava, era uma mulher tão próxima da minha realidade, que falava a minha língua e até se parecia um pouco comigo, e que naturalmente ocupou um lugar superior em relação a todos os homens brancos gringos que formavam 90% da minha biblioteca de música.

A forma como ela falava sobre política me fez querer entender aquilo também. A forma como me ensinou, por palavras e por exemplos, como uma mulher pode ser forte e independente, e como existe uma alternativa aos padrões sociais vigentes, me permitiu escolher conscientemente qual caminho eu queria seguir na vida. E se eu estou hoje aqui, na minha própria casa, pagando minhas próprias contas, vivendo minha própria vida, descobrindo quem eu sou e dando minha opinião sem pedir desculpas, é porque Pitty me ajudou a refletir sobre tudo isso lá atrás.

Pitty

Esse é um texto essencialmente sentimental, e tem um tom bem diferente de todos os outros que já escrevi aqui antes, para os quais procuro pesquisar e me embasar ao máximo. Mas se vai existir um momento apropriado para isso em todos os anos de vida que esse modesto site ainda tem pela frente, é esse, nessa semana especial, em que eu estou mais preocupada em agradecer a essa pessoa que fez tanto por mim, sem nem saber que eu existo.

E para não dizer que não falei das flores, fica a reflexão sobre a importância da representatividade. A importância de conseguirmos nos ver, nos espelhar, nos enxergar em nossos ídolos. Eu olhava para a Pitty e conseguia ver a mim mesma, em um futuro mais ou menos distante. Era alguém que poderia ser eu, e isso fez toda a diferença do mundo. É algo que todo mundo deveria ter a chance de ter na vida.