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Escola de Rock: inclusão e transformação através da música

Ouvir uma música e se sentir praticamente abraçado por ela. Encontrar pessoas que se identificam com o mesmo som e se sentir acolhido. Descobrir letras que te fazem sentir como se fossem escritas especialmente para você. Todos esses sentimentos e sensações são parte do nosso cotidiano como ouvintes de música, seja ela qual for, onde muitas das quais influenciam diretamente nosso próprio jeito de enxergar o mundo. Como uma forma de arte e também um dos mais antigos meios de comunicação, dependendo da época, a música foi capaz de moldar muitas gerações com acordes e sons transformados em ferramentas de inclusão, identificação e transformação.

No caso do rock, isso não é diferente. O gênero surgiu nos Estados Unidos, durante a década de 1940, como uma releitura de outros quatro gêneros já consagrados: o blues, o country, o R&B e o gospel. Somados às guitarras estridentes, à bateria e o contrabaixo, formulou-se então um dos mais conhecidos gêneros musicais do mundo e que todos os dias continua a dar origem a novos desdobramentos e mais formatos de expressão com base no bom e velho rock’n’roll. Mais do que isso, o seu discurso político, inovador e rebelde possibilitou o empoderamento de pessoas que se sentiam deslocadas no contexto em que viviam.

Escola de Rock, filme de 2003 estrelado por Jack Black e dirigido por Richard Linklater, utiliza como mote uma escola com crianças extremamente aplicadas, que passam a assumir novos espaços quando conhecem Dewey Finn (Black), um roqueiro falido que forma uma banda de rock com alunos após ser expulso de seu grupo anterior, uma banda chamada No Vancancy. O filme, no entanto, não se limita ao desejo de Finn em continuar sua carreira na música, e se aprofunda em outras temáticas na tentativa de entender como o rock entra na vida desses pequenos e como o gênero os influencia e transforma suas vidas.

Para isso, Dewey é convertido no pouco convencional mentor dessas crianças. Depois de atender a um telefonema para seu colega de apartamento, Ned Schneebly (Mike White), que ganha a vida como professor substituto, ele decide se passar pelo amigo e aceitar o convite para ser o mais novo professor temporário da quarta série da Horace Green Escola Preparatória. Era uma oportunidade de ganhar dinheiro fácil, mas quando chega na escola e encontra uma turma muito comportada e pronta para aprender com o novo professor, ele se vê numa enrascada. Afinal, não seria possível manter as aparências por muito tempo sem o preparo e conhecimento necessários para dar aula àquelas crianças.

É quando vê a turma na aula de música que Dewey descobre uma saída para seu problema, já que esse é um assunto que ele domina. Além disso, para ele, as crianças são também uma forma de conseguir participar do concurso de bandas de rock da cidade, que dava um grande prêmio em dinheiro, mas que parecia um desejo impossível de ser realizado após sua saída da No Vacancy. Como vários de seus alunos já sabiam tocar instrumentos e/ou cantavam, o que ele precisava fazer era moldá-los de acordo com aquilo que fosse necessário para vencer o concurso. Assim, Dewey os observa e descobre que os pequenos não conheciam nada de rock e que todas as suas influências vinham da música clássica. Para eles, o rock era um gênero proibido, transgressor demais, e os pais não ousariam apresentá-lo a eles.

Mas porque o rock tem, em sua essência, muito do ser diferente, da união por algo maior e uma dose de rebeldia, as crianças precisavam entender do que cada uma dessas coisas consistiam. Dewey, então, passa a ensiná-las sobre O Homem, em uma analogia que sempre utilizava um homem que estaria repreendendo novas ideias, alguém que não aceitava mudanças ou que nunca seria a favor de algo fora da curva. Com esses conceitos, os alunos começam a se dar conta de como são instigados a seguir regras, mesmo durante as brincadeiras, na hora de serem apenas crianças. Aos poucos, eles passam a entender que as coisas não precisam ser sempre iguais, nem como O Homem manda, e sim conforme o que cada um acreditava, o que queriam para si.

Dewey utiliza o rock como agente de transformação e a música é o que une a turma e incentiva as crianças a serem elas mesmas, algo que não acontecia no passado. Em sua banda não existia definição de gênero para determinada função, apenas roqueiros prontos para arrasar. Desde a menina baixista e a cantora, o menino estilista e o vocalista, o nerd que sabia projetar a iluminação e o que podia ser segurança, todos encontraram uma função dentro do espetáculo e eram incentivados a serem mais, a quebrar regras e viverem o momento. Nas aulas de história do rock, por sua vez, eles aprendiam que não importava ser homem ou mulher, que o rock é música e música empodera pessoas, independente de sexo, cor ou religião — um discurso inovador até para os padrões do próprio rock, que por muito tempo foi conhecido como um gênero de homem brancos.

Um filme como Escola de Rock não conta somente com mudanças na vida dos alunos que participam da banda, mas também de toda uma geração de espectadores que aprenderam que o rock é um estilo musical abrangente, que aceita todo mundo que quer ser diferente. Quantas pessoas não começaram a tocar algum instrumento após assistir ao filme? Quantas garotas se sentiram empoderadas ao descobrir a história de mulheres que transformaram o rock? Quantas pessoas passaram a ir atrás de outras influências e novas informações sobre o mundo do rock, que não se restringe apenas ao rock clássico, mas com todas as suas vertentes, como o gothic, o emo, o indie, o glam, o punk e tantos outros? Quantos foram os adolescentes que tiveram seu sono embalados pelas letras e melodias que combinavam seus sentimentos à época, as inseguranças, a sensação de querer fazer parte de algo novo, o desejo tão raro de pertencimento quando o coração se acalma com aquela banda que logo se tornou uma favorita?

Escola de Rock tem uma certa referência à trama de Sociedade dos Poetas Mortos, onde um professor chega e desconstrói a ideia de ensino e cultura de uma classe. Mas, muitas vezes, tudo que um grupo de pessoas, ou somente uma, precisa, é de apoio, exatamente como o rock tem feito por todos nós há tantos anos.

** A arte em destaque é de autoria da editora Ana Luíza.