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Emily Lima na Seleção: o que muda dentro e fora das quatro linhas?

Daria para imaginar que, sendo uma seleção feminina, nada mais justo que ter uma técnica mulher, mas desde sua estreia, em julho de 1986, a “maior autoridade” na seleção feminina de futebol ainda era masculina.

Depois do pequeno susto depois da Olimpíada Rio-2016 com umas declarações da CBF que davam a entender que a seleção principal de futebol feminino seria descontinuada, tivemos a declaração do então técnico Vadão falando que o formato do “projeto futebol feminino” precisava ser revisto. Pouco tempo depois, fomos surpreendidos positivamente com a notícia de que a seleção não só continuaria muito bem, obrigada, como sua nova técnica seria a paulista Emily Lima.

Emily acredita que o futebol é igual em toda parte do mundo, que em qualquer lugar ele tem a mesma linguagem, e a diferença está no tratamento e no trabalho de cada treinador. É um trabalho que independe de gênero, mas uma representatividade é sempre positiva. A FIFA exige que haja pelo menos uma mulher dentro da comissão técnica de qualquer seleção de qualquer país que queira disputar torneios oficiais, e isso independe de cargo — tanto o mais alto como o mais baixo —, e ser uma técnica em 2017 é difícil, mas não existe um problema de rivalidade entre membros da comissão:

“Há uma cobrança de mulher na comissão, mas a gente precisa (primeiramente) trabalhar com pessoas que você confia. (…) Hoje eu posso fechar os olhos e saber que nenhum deles quer estar no meu lugar. (…) O Torneio só carimbou que eu fiz todas as escolhas certas.”

Sendo a primeira mulher a treinar uma seleção principal, então, o que muda?

Emily entra para comandar a Seleção Feminina depois de um estouro inexplicável que aconteceu nas Olimpíadas. O futebol feminino, que em 2016 lotou estádios e mais estádios em todos os jogos no Rio de Janeiro, deixou sua marca no coração dos brasileiros — às custas das derrotas da Seleção Masculina, mas isso é assunto para outra hora —, e um amor que persiste até hoje. Prova disso é a audiência do Torneio de Manaus, primeiro torneio oficial de Emily como treinadora, primeiro título conquistado.

A treinadora vem com a missão difícil de sentar, se concentrar e conciliar o calendário do futebol feminino brasileiro com os campeonatos estaduais, nacionais, internacionais e as datas FIFA, que estão cada vez mais próximas uma da outra. Junto com isso, existe a necessidade de treinar as meninas junto à nova comissão técnica em um ano fraco de torneios oficiais. Emily pegou a seleção em seu “melhor pior momento”, e apesar de estar entre os 10 no ranking da FIFA, o trabalho precisa ser refeito praticamente do zero.

Taticamente falando, Emily vem para terminar com os chutes longos — que aumentam a chance de contra-ataque adversária e tem uma margem gigante de erros — e ligações diretas, o que significa que o time começa a jogar mais conectado e mais fluido. Fluidez que Emily faz questão de ter dentro e fora de campo através do trabalho de coaching de Sandra Santos, junto com a preparação física. Emily disse recentemente às Dibradoras: “A gente exige muito da atleta, e a gente precisa mostrar pra elas que o trabalho delas é como um relaxamento também.” Trabalhando não só o corpo e o condicionamento físico como a parte psicológica das meninas. É respirar fundo, começar do começo, e lembrar a cada uma das meninas — e a própria Emily — por que elas estão ali em primeiro lugar.

Também é uma característica de Emily conhecer a fundo e trabalhar junto às categorias de base, coisa que pouquíssimos times masculinos se incomodam em fazer e que tem se mostrado cada vez mais importante. Trazer as categorias de base para jogar junto da seleção principal foi uma maneira de fazer com que jogadoras mais novas se mantenham motivadas e sejam melhor exploradas.

“Fazer com que elas fizessem nossas preliminares nessa datas FIFA, por exemplo: a gente vai jogar contra a Dinamarca lá. Antes vai ter o jogo da categoria sub-17 e depois o nosso. Fazer com que essas meninas viagem também.”

2017 será um ano de muitos testes para a seleção, que, sem Copa Algarve para disputar, vai precisar se basear em pequenos torneios (como o dos Estados Unidos, em junho, na Austrália, em setembro e um torneio maior de fim de ano) e amistosos, cujo principal objetivo é trazer grandes times para que as garotas treinem juntas contra equipes maiores e desafiadoras.

Mais do que uma mulher à frente da seleção principal do esporte (ainda) mais popular do país, a seleção brasileira que veremos em 2017 é uma corrente de poder feminino que promete conquistar o mundo, um campeonato de cada vez.