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Grown-ish – “Only Human”: conversando sobre a saúde mental das pessoas negras

Nos primeiros minutos do episódio “Only Human” de Grown-ish, já percebíamos que a narrativa iria focar no debate sobre saúde mental. Um estudante da faculdade, em que boa parte da série acontece, tenta o suicídio e a protagonista Zoey Johnson (Yara Shahidi), narra sobre as questões que angustiam os jovens. A partir deste acontecimento, Aaron Jackson (Trevor Jackson) faz uma reunião com alguns dos estudantes para discutir sobre o tema. Então, a história se desenrola.

É importante destacar que Grown-ish tem como foco principal os negros (maioria do elenco), e, portanto, ao abordar a saúde mental, ela tratou em especial sobre essas pessoas. O que nos faz discutir, também, em relação aos problemas psicológicos em que pretos e pardos, em especial os jovens, passam em seu dia-a-dia.

Com a reunião que Aaron organizou, os estudantes tiveram a oportunidade de se abrir sobre as questões que os afligiam. Partindo disto, o personagem se encarrega de conversar com um dos conselheiros da faculdade, ao perceber que todos ali necessitavam de um acompanhamento psicológico. Porém, mesmo diante a uma tentativa de suicídio de um dos alunos, A. Jackson percebeu que a universidade não iria auxiliá-los como deveriam.

Uma das importantes discussões é como pessoas não-brancas são tratadas e vistas em nossa sociedade. Ressaltando que, a construção no imaginário da população, é de que negros e negras são criminosos que não possuem o benefício da dúvida. 75% das vítimas de homicídio no Brasil, por exemplo, são negras, como apontou o Atlas da Violência — divulgado este ano —, que é um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. E sim, isto afeta diretamente o psicológico dos pretos.

Desde crianças os pretos e pretas são ensinados como devem se portar para que não sejam alvos da polícia militar e afins, para não serem confundidos com criminosos. O racismo institucional promove este tipo de relação, que nos faz prisioneiros de nós mesmos, pois não podemos agir de certo modo, para que não sejamos mortos por sermos quem somos.

Depressão, ansiedade, suicídio. De acordo com Ministério da Saúde e da UnB (Universidade de Brasília), a cada dez jovens que se suicidam no Brasil, seis são negros. A taxa de mortes por suicídio de pessoas pretas e pardas aumentou, enquanto de pessoas brancas permaneceu a mesma, de acordo com este estudo. E isto é resultado do racismo estrutural que domina a nossa sociedade.

Em Grown-ish, quando Aaron ressalta que pessoas negras não estão sendo ouvidas sobre suas principais angústias, medos, dificuldades, inseguranças, ele está apontando uma questão que afeta a sociedade de forma geral. Os Estados Unidos e o Brasil, por exemplo, já reivindicam que seja reconhecido que um dos principais causadores de problemas psicológicos em pretos, é a discriminação racial.

Grown-ish

Negros são excluídos dos principais espaços, são as pessoas que estão em maior vulnerabilidade social, como a extrema pobreza, sem acesso a saúde, educação, saneamento básico. Assim como são os que possuem maior baixa autoestima, o que também afeta suas produções, trabalhos, relacionamentos e vidas sociais. Quando não tratamos estes pontos com responsabilidade, não somos capazes de perceber do porquê da taxa de suicídio entre pessoas pretas ter aumentado ao longo dos anos.

O cuidado da saúde mental é importante para que possamos ter o bem-estar. Todavia, como adquirir esta condição, se toda a sociedade nos faz sentirmos à margem dela? Como os jovens negros podem perceber-se aceitos e inclusos, se existe um racismo estrutural que nos fazem cada vez mais exclusos?

Atualmente, uma “onda” de representatividade vem crescendo e se fortificando. No entanto, pessoas pretas ainda continuam sendo mortas por serem pretas. Ainda continuam no lugar da marginalidade. Portanto, mesmo diante a este novo ciclo que estamos vivendo, ainda precisamos de uma longa caminhada para ultrapassar todo o racismo que foi construído e estruturado ao longo da história.

A não aceitação, a falta de amor, a falta de compreensão, a solidão. Diariamente pessoas não-brancas convivem com isto, em maior escalada que as pessoas brancas. Precisamos ouvir. Precisamos dar o apoio. Precisamos abraçar. Porque a sociedade, de modo geral, não ouve, não apoia, não abraça os pretos. Não há muito mistério sobre o suicídio diante a tudo isso. Racismo mata. E mata com diversos tipos de armas. Inclusive as psicológicas.


** A imagem em destaque é de autoria da editora Ana Vieira.