Categorias: CINEMA

Troféu Valkirias de Melhores do Ano: Cinema

Ainda que tenham sido responsáveis por filmes sucesso de público e crítica, mulheres continuam excluídas de uma série de premiações do cinema. É o que aconteceu, por exemplo, com o Globo de Ouro 2018 que, ao divulgar sua lista de indicados, não tinha sequer uma mulher nomeada na categoria de Melhor Direção. Em ano de Mulher-Maravilha e Patty Jenkins, de Lady Birdy e Greta Gerwig, de Mudbound Dee Reesa exclusão de mulheres nas categorias técnicas só se prova mais do mesmo em mais de setenta anos de premiação. No próprio Globo de Ouro, apenas cinco mulheres concorreram na categoria de Melhor Direção e apenas uma delas, Barbra Streisand, levou o prêmio para casa com seu filme Yentl de 1984.

Mesmo que Angelina Jolie esteja concorrendo a Melhor Filme Estrangeiro com First They Killed My Father e também apareça como produtora em The Breadwinner — dirigido por Nora Twomey —, que disputa o prêmio de Melhor Animação, ela é a exceção e não a regra. Críticas positivas, sucesso de bilheteria e tramas impecáveis não parecem ser o suficiente para um sistema que se sustenta com base em abusos e coerção. 2017 é o ano das narrativas de mulheres, das quebras de silêncio, mas também de mais do mesmo no que se refere às premiações. Embora elas estejam por aí, contando nossas histórias, dando voz a quem não a tem, ainda há muito o que ser feito. O Troféu Valkirias de Melhores do Ano na categoria Cinema busca enaltecer as histórias que nos impactaram e que, de alguma maneira, nos fizeram, acima de tudo, sentir.

A Bela e a Fera, Bill Condon

Por Yuu

A Bela e a Fera foi uma das estreias mais esperadas para o primeiro trimestre de 2017 e não por poucos motivos. A nova leva de remakes em live-action da Disney tem trazido uma leitura diferente dos clássicos em animação que  conhecemos, adequando as histórias para a nova geração, mas mantendo o ar de conto de fadas que marcaram a nossa infância com carinho.

O filme é protagonizado por Emma Watson e Dan Stevens como Bela e a Fera, respectivamente, e são eles que nos levam por essa história já tão conhecida. Muitas das canções originais são mantidas, transportando-nos direto para nossas infâncias e memórias, em números que enchem os olhos e aquecem o coração, enquanto novas composições são introduzidas, de modo a construir algo que seja capaz de agradar ao público mais antigo e conquistar quem está tendo o primeiro contato com a trama agora. Ainda, muito embora A Bela e a Fera seja um conto de fadas, tão lúdico quanto possível, o remake ignoradas pela adaptação sobre o passado da Fera e, sobretudo, de Bela — uma verdadeira heroína, que consegue tornar-se ainda mais inspiradora do que no original.

Para saber mais: Crítica: A Bela e a Fera – Quando sentimentos são os únicos fatos; A Bela e a Fera: Quando a redenção não é possível.

A Glória e a Graça, Flávio Ramos Tambellini

Por Paloma

A Glória e a Graça foi um filme inesperado. Ele conta a história de duas irmãs separadas pela vida e novamente reunidas por ela. Após descobrir um aneurisma inoperável no cérebro e sem ter ninguém que cuide dos seus dois filhos após sua morte, Graça vai atrás do irmão com quem não fala há anos e, no lugar dele, acaba encontrando Glória, sua nova identidade pública. A partir daí, segue-se uma história de reconciliação, reconstrução de relacionamentos e superação de mágoas.

A produção, que estreou nos cinemas em março, mas que acabou sendo — como se podia esperar pelo tema — muito pouco comentada pela mídia em geral, foi posta em ação por insistência de Carolina Ferraz, que interpreta a personagem Glória e que foi quem comprou os direitos da história e batalhou pela concretização do filme. Apesar de grande parte dos olhares terem sido voltados para essa personagem, é muito importante não deixar de lado também a outra personagem central, Graça (Sandra Corveloni), uma mulher que cria sozinha os filhos e conduz a própria vida como bem entende, obrigada a se deparar com a inevitabilidade e proximidade da própria morte e suas consequências práticas. O resultado final da película é muito sensível e emocionante, misturando momentos de profunda emoção, com outros mais tensos e pequenas pitadas de alívio cômico que dão à produção como um todo uma dimensão mais profunda e cativante.

Para saber mais: Crítica: A Glória e a Graça

Atômica, David Leitch

Por Ana Luíza

Em um primeiro momento, Atômica não parece um filme tão interessante quanto realmente é: ambientado durante a Guerra Fria, às vésperas da queda do Muro de Berlim, o filme gira em torno da já conhecida — e explorada à exaustão — disputa entre MI-6 e KGB que tentam recuperar uma lista cujo conteúdo comprometedor pode causar verdadeiro estrago nas mãos erradas. O fato de ser protagonizado por uma mulher, na contramão dos grandes filmes de espionagem, parece a única característica que faz de Atômica um filme ligeiramente fora da curva, mas de forma inteligente, David Leitch constrói uma narrativa bastante única, que está menos interessada em viradas cabeludas de roteiro, teias de conspirações e mentiras, e mais em quem vive essa história: no caso, a espiã Lorraine Broughton, interpretada pela brilhante Charlize Theron.

É a partir do olhar de Lorraine que conhecemos a Berlim instável e transgressora do final da década de 1980, que fervilhava de expectativas pelo fim da guerra, mas que ainda era dividida por um muro; e conforme Lorraine passa a explorar a cidade, descobrimos como a vida nos lado Ocidental e Oriental eram tão radicalmente opostas. Atômica é, sobretudo, um filme de contrastes, que são percebidos desde as já mencionadas diferenças entre uma Berlim ainda dividida e na explosão de cores da vida noturna na cidade em contrapartida às cores sóbrias dos dias, quanto em sua personagem principal, que navega por diferentes emoções e interpreta papéis muito distintos em sua jornada; da espiã badass e letal, até a mulher que se permite ser vulnerável, que sofre com suas perdas, que se entrega a um relacionamento, que se machuca — e muito, física e mentalmente —, tem medo. A humanidade de Lorraine jamais é vista como uma fraqueza, tendo justamente o efeito contrário: todas elas a tornam mais forte, mais complexa, e dá maior significado ao seu trabalho e narrativa, que, por fim, transmite com louvor aquela que talvez seja a mensagem mais importante do filme; continuemos sempre a lutar — como garotas.

Para saber mais: Crítica: Atômica

Bingo – O Rei das Manhãs, Daniel Rezende

Por Ana Luíza

No ano em que o cinema brasileiro viveu um momento bastante interessante, com inúmeras e tão distintas produções chegando ao cinema mainstream, Bingo – O Rei das Manhãs se tornou um representante à altura desse novo momento: candidato escolhido pelo Brasil para concorrer a uma vaga no Oscar do ano que vem, o filme une comédia e drama a uma narrativa tão potente quanto absurda, em uma produção cheia de personalidade que só poderia existir em um país tão multifacetado — e por vezes absurdo — quanto o Brasil. Baseado na história de Arlindo Barreto, o filme resgata a tradição da televisão brasileira na década de 1980, a veia cômica tão popular, que se utiliza de piadas muito específicas que talvez não fizessem sentido em qualquer outro canto do mundo, mas o faz aqui — como diz o próprio Augusto Mendes (Vladimir Brichta), o Brasil não é, afinal, um país para principiantes — e personalidades da época, como a cantora Gretchen.

Bingo – O Rei das Manhãs não se limita à narrativa de sucesso de seu protagonista, nos levando para o outro lado da mesma moeda: as drogas, as festas, a frustração por jamais poder ser reconhecido verdadeiramente pelo público; todos sabiam quem era Bingo, o palhaço, mas Augusto Mendes era apenas um ator fracassado, que jamais conseguiu sair da sombra das mulheres de sua vida — primeiro, da mãe, uma atriz famosa que fora esquecida depois de tornar-se idosa; depois da ex-mulher, uma proeminente atriz da TV Mundial (uma referência a nossa já bastante conhecida Rede Globo). Menos uma biografia que idealiza seu personagem principal e mais um retrato da televisão brasileira, Bingo não é um filme moralista — ainda que seja o que o final pareça sugerir após a redenção do protagonista —, tampouco deixa de ser eficientemente incômodo, engraçado e, por vezes contraditório, nos lembrando sobretudo, do país imenso em que vivemos e quantas histórias absurdas e tão nossas não existem por aí, prontas para serem contadas.

Como Nossos Pais, Laís Bodanzky 

Por Anna Vitória

Várias sinopses e críticas do filme definem Rosa (Maria Ribeiro), protagonista de Como Nossos Pais, como uma mulher que está sobrecarregada por tentar ser perfeita em tudo. Discordo dessa visão. Rosa não quer ser perfeita, mas faz o que pode para tentar cumprir com todas as expectativas que existem sobre ela enquanto representante da mulher contemporânea. Esse trabalho invisível e infinito que toda mulher conhece muito bem mostra que estamos longe do mundo pós-feminista que alguns acreditam que vivemos ao observar a imagem de uma família classe média de esquerda. Ainda somos as mesmas e vivemos como nossas mães e avós. A crise de Rosa é o drama da mulher contemporânea de perceber-se fruto de um sonho de liberdade e revolução que nunca se concretizou completamente.

Recebido com elogios em festivais internacionais, com direção e elenco premiados dentro do país, muito se questionou na divulgação do filme se Como Nossos Pais é feminista. É uma etiqueta que, pessoalmente, não me importa, mas a qual acho importante reivindicar tendo em vista o contexto no qual o filme se insere. Como Nossos Pais é dirigido e escrito por uma mulher, contando a história de uma mulher com a complexidade e sensibilidade de que só outra mulher seria capaz. Ele não traz em si uma revolução ou o caminho para tal, mas abre caminhos para nossas inquietações — são essas que nos movem e também nos acolhem quando ainda não sabemos para onde ir.

Para saber mais: Como Nossos Pais: para todas as mulheres exaustas

Corra!, Jordan Peele

Por Anna Vitória

No Troféu Valkirias de Cinema do ano passado, escolhi A Bruxa como meu filme favorito de 2016 e agora volto com mais um filme de terror para recordar 2017. O gênero vive uma excelente fase e ela anda de mãos dadas com a onda conservadora atual, principalmente com o acalorado debate racial que vive os Estados Unidos que, assim como o Brasil, se destaca pelo alto índice de assassinato de pessoas negras — inclusive, ou principalmente, pela mão de autoridades. É na onda do #BlackLivesMatter que surge Corra!, escrito e dirigido por Jordan Peele, um filme que mistura terror e comédia satírica para falar sobre racismo.

Assim como em A Bruxa o medo se projeta na figura de uma garota adolescente cuja sexualidade começa a aflorar, e o grande algoz são aqueles que tentam esmagá-la, em Corra! o medo é o racismo e o demônio são as pessoas brancas. Na história, os atos de racismo — como apropriação cultural e objetificação da pessoa negra — são levados a extremos que podem parecer exagerados, mas são apenas versões mais (mas nem tanto assim) radicais de atos de violência praticados diariamente. Não há meio termo no filme porque a ideia é mostrar, de forma didática, os medos enfrentados pelos negros em uma sociedade estruturalmente racista e não faltam alívios cômicos que abrem espaço para um único tipo de riso: o de nervoso.

De Volta para Casa, Hallie Meyers-Shyer

Por Júlia

Depois de já ter passado a pente fino todos os filmes da categoria “comédias românticas” da Netflix, imaginem a minha surpresa ao saber que em 2017 ia estrear uma nova romcom com Reese Whiterspoon e escrita por Hallie Meyers-Shyer, filha de Nancy Meyers (que produziu o filme), roteirista de filmes como Operação Cupido, O Amor Não Tira Férias, e outras comédias românticas perfeitas. Com esse time de mulheres eu sabia que o filme seria um sucesso.

De Volta para Casa é aquele tipo de filme que arranca boas risadas e faz todos os problemas parecerem mais leves depois que termina. É sobre uma mulher divorciada e com duas filhas pequenas que aprende que nunca é tarde para nada na vida; nem para abrigar três jovens rapazes aspirantes a artistas em sua casa, muito menos para continuar a se conhecer. Antes de ser um filme sobre relacionamentos românticos, é um filme sobre como é importante se amar e estar bem consigo mesma. Se o filme fosse um bolo, seria aquele bolo de cenoura com calda chocolate quentinho na tarde chuvosa. Se fosse uma peça de roupa, seria aquele moletom macio que já está bem velho de tanto uso, mas nenhum outro veste tão bem quanto ele. Se fosse uma bebida, seria um copo de água de coco bem gelado depois de uma caminhada debaixo do sol em pleno mês de janeiro. Já consegui te convencer?

Para saber mais: Nancy Meyers e os sentimentos simplesmente complicados

Extraordinário, Stephen Chbosky

Por Paloma

O nome do filme é extremamente representativo do seu conteúdo. Extraordinário é a adaptação cinematográfica do livro infantojuvenil da escritora R. J. Palacio que andou na boca do povo pelos idos de 2012. A história gira em torno de Auggie, um menino de 10 anos portador de uma doença genética que fez com que ele nascesse com deformidades faciais. Devido às limitações ocasionadas pela sua condição e dos tratamentos médicos necessários, o menino — interpretado por Jacob Tremblay — passou os primeiros anos da sua vida escolar sendo ensinado em casa pela mãe (Julia Roberts). Agora, Auggie finalmente vai entrar em uma escola regular, e precisa lidar com o bullying e as dificuldades dessa nova fase.

A produção teve muito sucesso em transmitir para as telas toda a delicadeza, profundidade e emoção retratadas no livro, e ganhou o bônus de trazer a mãe ainda mais para o centro da história, evidenciando os sacrifícios pessoais feitos por ela para se dedicar exclusivamente ao filho após o seu nascimento, como é socialmente esperado das mães. O resultado é um filme extremamente emocionante e delicado, que faz um uso muito bom dos atores de alto escalão que compõem o seu elenco. Apesar de ser uma aparição pequena, também é bastante satisfatório ver Sonia Braga interpretando a avó de Auggie e Via (Izabela Vidovic), que de fato é brasileira na história original, apesar de o fato não ser mencionado no filme.

Gaga: Five Foot Two, Chris Moukarbel

Por Júlia

Já foi mais do que provado que 2017 foi o Ano das Emoções e Lady Gaga não ficou fora disso. Dias depois de ter compartilhado a razão pelo cancelamento de seu show no Rock in Rio — a cantora sofre de fibromialgia, uma doença crônica que causa dores fortes no corpo —, Lady Gaga divulgou seu documentário na Netflix sobre as gravações e divulgação de seu novo álbum lançado no final de 2016, Joanne.

Joanne era a irmã de seu pai que faleceu devido a complicações de outra doença crônica, a lúpus. Todo esse contexto de doenças parece desimportante, mas é fundamental para essa fase de Lady Gaga. Ao compartilhar ao mundo suas fraquezas, na música e no filme, a cantora expõe o seu lado mais vulnerável e mais humano. Ela retira a máscara pública que costumava colocar, distante do público, estranha e excêntrica, para colocar outra, só que dessa vez se conectando com seu lado mais frágil e o expondo para o mundo. Gaga: Five Foot Two é poderoso quando mostra o sofrimento da cantora e a maneira com que ela se coloca em suas músicas e performances. É claro que seu trabalho não é um reflexo direto de sua vida, há a construção artística, mas é interessante ver como ela molda sua nova imagem a partir de sua própria biografia. É um filme importante que mostra que divas do pop também podem ser vulneráveis, mas sem deixar de ser poderosas.

Para saber mais: Stefani Coração de Diamante: a vulnerabilidade de Lady Gaga.

Ingrid Goes West, Matt Spicer

Por Sofia

Ingrid Goes West é um filme desconfortável de ver. A comédia dramática foca em Ingrid (Aubrey Plaza), uma jovem lidando com transtornos mentais não-especificados e com o trauma da morte da mãe. Em um contexto de total solidão, Ingrid se torna obcecada por uma influencer de Instagram, Taylor Sloane (Elizabeth Olsen), e decide se mudar para a Califórnia para stalkear sua nova obsessão e manipular uma amizade. O desconforto constante do espectador passa principalmente por ver a jornada de uma protagonista que sabemos que está errada, mas que não queremos ver sofrer mais — é nesse ponto que o filme se torna realmente interessante, para além da superfície potencialmente crítica à exposição na internet.

Jackie, Pablo Larrain

Por Fer

Sem chamar muita atenção na temporada de premiações, Jackie chegou e saiu rapidamente dos cinemas brasileiros e poucos meses depois foi se refugiar no catálogo da Netflix. É uma pena que tenhamos falado relativamente pouco sobre o filme, já que se trata de uma cinebiografia pouco convencional sobre uma mulher — e figura histórica — muito interessante. Para além de seu icônico terninho rosa e de seu sotaque exageradamente inconfundível, Jackie Kennedy foi uma pessoa de carne e osso cujo conto de fadas particular, de primeira-dama elegante e popular, terminou no filme de terror que foi segurar nos braços o corpo inerte do marido assassinado. O filme de Pablo Larraín não busca nos contar quem foi Jacqueline Kennedy-Onassis, figura presente no imaginário popular, e sim explorar um momento específico e particularmente desnorteador de sua vida: ser obrigada a viver o luto sob os olhos curiosos de um país devastado, ou então nos cômodos de uma casa que não lhe pertencia nem era um refúgio, e sim um lugar do qual tinha prazo para sair.

A muito elogiada atuação de Natalie Portman dá o tom do filme, cheio de contrastes — da felicidade inimaginável à maior dor possível —, e o bom trabalho do elenco de apoio a auxilia na missão complicada de reviver uma figura icônica e inconfundível. Mas é a trilha sonora perturbadora e inesperada de Mica Levi que melhor representa o que é Jackie, o filme: por vezes incômodo, por vezes estranho, por vezes desconcertante, mas sempre avassalador. E, por fim, um respiro carregado de esperança, embora se trate de uma esperança tímida, ainda permeada pela melancolia. Sobreviver ao luto pode parecer banal, já que é algo que a maioria de nós vivenciou ou ainda vai vivenciar, mas a verdade é que ele é sempre colossal — mesmo sem os olhos de uma nação inteira nos observando a cada passo.

Para saber mais: Crítica: Jackie.

Joan Didion: O Centro Não Vai Aguentar, Griffin Dunne

Por Jazz

Joan Didion sempre teve a voz da Nathalia Timberg para mim, pois foi assim que conheci a escritora norte-americana: através do audiobook de O Ano do Pensamento Mágico. De lá para cá, li trocentos livros e descobri a existência de um projeto de um documentário sobre a autora, idealizado por seu sobrinho, Griffin Dunne. Queria assisti-lo naquele momento, pois estava apaixonada pela obra de Didion, mas tive que esperar: não havia dinheiro para financiá-lo. Para minha surpresa, o projeto finalmente saiu do papel e a Netflix trouxe para seu catálogo Joan Didion: O Centro Não Vai Aguentar. Se você espera um documentário sobre a vida de uma das maiores escritoras dos anos 70 até hoje, você irá se frustrar.

Dunne centra-se no momento mais delicado da vida de Joan, quando ela perdeu o marido e a filha quase ao mesmo tempo e de como ela colocou para fora toda essa dor através dos livros O Ano do Pensamento Mágico e Blue Nights. Ninguém soube escrever sobre a dor da perda quanto Didion e foi maravilhoso (e doloroso) poder acompanhar de perto o processo pelo qual a autora passou para expurgar sua dor. Qualquer escritora que se preze deve assistir a esse documentário. Que surpresa fantástica — ainda estou no chão.

Mãe!, Darren Aronofsky

Por Tany

Definitivamente, Mãe! não é o meu filme preferido, mas se algo te faz ficar tão em choque, tão pensativa, com vontade assistir novamente no instante que termina a sessão e de discutir o filme com diversas pessoas é porque, para mim, é um filme que não será esquecido facilmente. A história, que todos vocês já devem saber, é sobre um casal (Ele e Ela), interpretado por Jennifer Lawrence e Javier Bardem, e o que acontece quando algumas pessoas não convidadas aparecem em sua casa. Honestamente, é bem mais do que isso e existem várias teorias — diga-se de passagem, nem um pouco sutis —, mas quando se fala de arte, principalmente, sobre a forma como o homem usa a mulher para ganho pessoal é sempre interessante debater sobre.

Não considero Mãe! uma obra excelente, longe disso, ela tem bastante falhas e é bem difícil de se assistir em certas cenas — principalmente a violência desnecessária contra mulher —, mas ele ainda é um filme que te desperta algo. Em um mundo onde todos querem viver a prova de tudo, inclusive de sentimentos e sensações, é bom lembrar que estamos vivos seja por algo que nos provoque ou que nos faça sentir mesmo que seja raiva.

Para saber mais: Crítica: Mãe! e o mundo criado por homens.

Me Chame Pelo Seu Nome, Luca Guadagnino

Por Sofia

Me Chame Pelo Seu Nome (Call Me by Your Name) merece seu status atual de queridinho da crítica (e provável queridinho das premiações). Dirigido por Luca Guadagnino, a adaptação do livro de André Aciman é uma exploração delicada, potente e visualmente arrebatadora do amor e do desejo. Uma história romântica e de coming of age, o filme nos envolve na paixão de Elio (Timothée Chalamet) e Oliver (Armie Hammer), iniciada e culminada ao longo do verão de 1983 em uma casa de campo italiana. Assim como o romance que deu origem ao filme, a versão cinematográfica transporta o espectador para um estado de emoção pura e sincera, com igual peso e leveza. Desde que vi o filme, no Festival do Rio, ouvi a trilha sonora (espetacular, com destaque para as duas faixas originais de Sufjan Stevens) quase compulsivamente, aguardando ansiosamente a estreia oficial brasileira (prevista para janeiro) para que eu possa reviver esse verão italiano de 83 como se tivesse ocorrido comigo.

Moonlight, Barry Jenkins

Por Anna Vitória

Moonlight é como uma página de diário em que coexiste a notícia de uma declaração de guerra com as minúcias sobre aulas de natação à tarde. Existe uma história sendo contada sobre lares quebrados, crianças abandonadas, violência, solidão, ao mesmo tempo em que há descoberta, curiosidade, dúvida, ternura, tudo isso na esfera íntima da conexão de um homem com o outro. A câmera de Barry Jenkins nos coloca como observadores privilegiados de uma intimidade que beira o desconfortável, em contato direto com a vulnerabilidade, com a humanidade de personagens que não estamos acostumados a ver tão de perto, em nossa cultura que ainda falha em oferecer narrativas sobre personagens negros que não sejam histórias de violência, crime e pobreza.

Em entrevista ao The Guardian, Tarell Alvin McCraney, autor da peça que inspirou o filme, conta que escreveu o roteiro original da peça motivado pelo pânico de ter sua história e suas experiências apagadas depois da morte de sua mãe. Não sabemos muito sobre com o que o crescer de um garoto negro pobre e gay se parece. Nosso repertório cultural racista e excludente pode nos levar a cair com facilidade no erro de dizer que a delicadeza das descobertas, as silenciosas histórias de amor, a banalidade encantadora de Moonlight existe apesar da violência, do abandono, mas isso é negar a complexidade dessas vidas, é confiná-las àquela mesma narrativa única, e o filme é bem melhor e maior que isso.

Para saber mais: Moonlight: Sob a luz do luar

Mulher-Maravilha, Patty Jenkins

Por Thay

Não é novidade dizer o quanto esperamos por um filme como Mulher-Maravilha. Após 75 anos da existência da personagem, apenas esse ano, 2017, pudemos ver a super-heroína em um filme solo, estrelando uma história a respeito da esperança, verdade e o poder do amor. Dirigido por Patty Jenkins e protagonizado por Gal Gadot, Mulher-Maravilha nos transporta de Themyscira para a Terra de Ninguém da Primeira Guerra Mundial em cena belíssimas e sequências que, só de lembrar, me deixam arrepiada novamente.

Ver Diana, a Mulher-Maravilha, enfrentando um exército e libertando a Terra de Ninguém fala muito sobre o que é ser uma super-heroína, um símbolo de esperança e amor. A importância do filme reside também no fato de ser um marco no cinema de super-heróis visto que, finalmente, tivemos um filme protagonizado por uma guerreira que não sexualiza a personagem, não dá margem para closes absurdos e desnecessário e é fiel a essência da personagem, mostrando Diana como uma guerreira com um objetivo muito claro em mente: salvar o mundo e não contribuir com o male gaze.

Para saber mais: Mulher-Maravilha: os 75 anos do ícone, Crítica: Mulher-Maravilha, o filme que estávamos esperando, O poder do amor em Mulher-Maravilha, Mulher-Maravilha: entre a representatividade e o queerbaiting

Nossas Noites, Ritesh Batra

Por Jazz

Se Jane Fonda existe, graças a Deus, por que existe? Tivemos um presentão neste ano que foi poder ver Fonda além de Grace and Frankie. Our Souls at Night, filme para a Netflix, traz de volta um ship de aquecer o coração de qualquer fã de cinema: Jane Fonda e Robert Redford. Ao contrário de seus personagens de Descalços no Parque, aqui eles enfrentam o amor com uma serenidade que só a idade pode trazer. O filme retrata a descoberta do amor entre os vizinhos Addie e Louis, depois que ela vai visitá-lo em sua casa e pede para que ela durma com ele. Mas dormir mesmo, não transar. Ver dois atores tão talentosos juntos novamente foi fantástico, especialmente porque sabemos como Hollywood trata suas estrelas mais velhas. Addie é tão diferente de Grace e isso é especialmente bom, porque Jane sempre esteve associada aos papéis de socialite. Aqui seus longos cabelos grisalhos balançam contra o vento, e você pensa: puxa, eu quero ser igual a essa mulher. Um filme inspirador, finalmente com histórias realmente interessantes, e não sexualizadas, sobre mulheres mais velhas.

O Filme da Minha Vida, Selton Mello

Por: Ana Luíza

Embora nunca tenha assistido Mad Men, existe uma citação bastante famosa de Don Draper (Jon Hamm) sobre nostalgia em que ele diz que ela é delicada, mas ao mesmo tempo potente, e que é infinitamente mais forte do que a memória sozinha. O Filme da Minha Vida é, ao seu próprio modo, uma grande sessão movida pela nostalgia — não é preciso ter vivido em 1963, tampouco em alguma cidadezinha no interior do Rio Grande do Sul para se sentir abraçado pela história de Tony Terranova (Johnny Massaro) e sua incessante busca pelo pai, que desapareceu sem deixar rastros ou explicações. Sua narrativa jamais se torna a única, no entanto: à medida que a história avança, somos apresentadas às mulheres que, momentaneamente ou permanentemente, cruzam o caminho do personagem.

Da prostituta que gostava de geografia até a jovem que se pergunta se algum dia irá se casar, se irá constituir uma família, todas ganham narrativas bastante únicas, sempre exploradas de forma delicada em tons sépia que não tornam um clichê incômodo, mas um artifício que faz todo o sentido. São todos personagens extremamente humanos, que de forma literal ou metafórica embarcam num trem na esperança de que o destino seja o melhor, mas sem qualquer garantia. É um filme lindo, às vezes doloroso, mas delicado e gostoso como um abraço apertado, um pão quentinho com manteiga derretida ou um leite quente num dia frio; adorável e poético, e com grandes chances de se tornar um pouco sobre as nossas vidas também.

Star Wars: Os Últimos Jedi, Rian Johnson

Por: Ana Luíza

É difícil resumir um filme que parece ter chegado para literalmente salvar nossas vidas depois de um ano tão intenso quanto foi 2017. Marcando também a última participação de Carrie Fisher em vida como Princesa Leia, Star Wars: Os Últimos Jedi é, ao mesmo tempo, próximo e distante de seus antecessores: todas as características que fizeram da saga o sucesso que é estão lá, mas há algo de novo, que deixa de lado as noções concretas de bem e mal para pensar no que existe no meio, quando também a história se permite crescer em importância e impacto. Os fãs mais antigos reconhecerão referências a um passado que olhamos com certo saudosismo, mas é preciso encarar o futuro, e assim Rian Johnson faz, sem desrespeitar o legado de seus personagens ou ignorar o passado daquelas pessoas.

Ao mesmo tempo, o diretor é corajoso o suficiente para trazer à tona questões realmente relevantes e incômodas, como o mercado de armas e a guerra, que literalmente alimenta os lucros de um seleto grupo de comerciantes enquanto tantos outros sofrem às suas custas, e não é por acaso que o filme, em contrapartida, tem causado revolta em tanta gente — ainda bem. Nada é preto no branco, e o que Star Wars: Os Últimos Jedi prova é que ainda existe muito mais sobre esse universo, sobre seus personagens e sobre a Força e seu Lado Negro do que acreditamos. Se o futuro é incerto, a jornada de Star Wars certamente, tem valido a pena.

Para saber mais: Star Wars

1 comentário

  1. De toda esta selecção, só consegui ver Wonder Woman, mas para mim já basta! Vou seguir as outras recomendações, acredito piamente na vossa opinião! Bom trabalho Valkírias!

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