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Sofia Coppola e nossa vulnerabilidade

Sofia Coppola pode ser um clichê, mas é também uma figura importante em Hollywood — especialmente se pensarmos na falta de mulheres em destaque na direção. De acordo com o Women’s Media Center, apenas 9 dos 250 filmes com maior bilheteria nos EUA teve diretoras mulheres em 2013. E, em pleno 2016, os Emmys contaram com apenas 9% de nominações femininas para prêmios de direção na TV. Desnecessário dizer que a disparidade de gênero em posições de destaque também é um problema na indústria do entretenimento.

Então temos Coppola. A cineasta, com mais de uma dezena de créditos em seu nome, é uma exceção no meio. Não só pelo seu trabalho em si, mas também pelo foco em histórias femininas. Após desistir da atuação — pela qual recebia muitas críticas — Coppola começou a investir em roteiro, produção e direção.

Em As Virgens Suicidas, adaptação do romance homônimo, as protagonistas são as irmãs Lisbon. Esse filme é a estreia em longa-metragens de Coppola, que até então só tinha trabalho com atuação e dirigido um curta, e também fez o papel de roteirista. Como adaptação, o filme é perfeito ao trazer a personalidade e o tom da melancolia das irmãs Lisbon às telas. No aspecto visual também: o quarto bagunçado representa a cabeça delas e a aparência etérea demonstra a idealização feita das meninas por outros personagens. É muito raro que uma adaptação de livro seja tão fiel e tão agregadora à obra, mas esse é o caso aqui.

Já em Encontros e Desencontros, a mulher se encontra em uma situação mais problemática. Scarlett Johansson faz o papel de Charlotte, a jovem esposa que se sente abandonada pelo marido e inicia um relacionamento com Bob, um ator mais velho interpretado por Bill Murray. É questionável o quanto esse filme não reforça papéis de gênero e diferença de idade (na vida real, Scarlett tinha 18 anos e Bill Murray 52, mas no filme ela está na casa dos 20) já impostos por Hollywood, mas a estética de Coppola é visível na produção. Os diálogos lentos e os personagens que devidamente possuem um misto de tédio e melancolia fizeram com que o filme se tornasse um sucesso, Coppola ganhasse um Oscar pelo roteiro e Charlotte e Bob entrassem no cânone cinematográfico.

Em Maria Antonieta, Kirsten Dunst está de volta. A atriz, que havia interpretado Lux Lisbon em As Virgens Suicidas, agora dá vida à rainha francesa. A história acompanha a vida da jovem protagonista até a Revolução Francesa e, mais uma vez, coloca os dramas de uma mulher em primeiro lugar. Não é sobre a situação política ou assuntos de interesse público: é sobre os jogos da rainha com as regras em sua juventude, é sobre ser uma mulher em uma situação de vulnerabilidade, é sobre solidão.

Um Lugar Qualquer muda de figura: dessa vez, o protagonista é um homem: um ator, Johnny Marco (Stephen Dorff), que alcança o sucesso profissional, mas está desconectado de sua vida particular e sofrendo crises existenciais. Quem traz mudanças é a estadia inesperada de sua filha de onze anos, Cleo (Elle Fanning), que o faz refletir sobre a cultura de Hollywood, sucesso e maturidade. Apesar da mudança de tom (e de cenário, para o ensolarado Chateau Marmont, hotel em Los Angeles), as questões não deixam de ser as mesmas: solidão, desconexão e empatia. É, de fato, uma história consciente de si mesma.

No embalo das questões de Hollywood e auto-consciência, surge Bling Ring: A Gangue de Hollywood. Aqui, as protagonistas voltam a ser garotas e a história é baseada em fatos reais. A temática de futilidade é constante ao apresentar uma gangue adolescente que invadia e roubava casas de celebridades em Los Angeles. O crime real já havia sido reportado no livro homônimo de Nancy Jo Sales, mas Coppola não cai na mesma armadilha da repórter. Ao invés de simplificar e estereotipar os adolescentes que fizeram parte da gangue — sete, sendo três meninas e quatro meninos — o filme dimensiona a cultura de celebridade em que os crimes estavam inseridos. Assim como a riqueza e o sentimento de propriedade e de falta de responsabilidade que as jovens sentiam em suas vidas a ponto de invadir o closet de Paris Hilton para tirar fotos e postar nas redes sociais. A cultura de consumo e seu ápice tragicômico.

O filme mais recente da cineasta é o especial de natal de Bill Murray para a Netflix. Ainda que bem diferente do resto de seu conteúdo, o filme não deixa de explorar a dimensão de personagens — mesmo que este seja uma pessoa real —, a necessidade de conexão das pessoas e efeitos da cultura de celebridade nos EUA.

Por isso mesmo, Sofia Coppola é um clichê importante. Em uma indústria com tão poucas mulheres em destaque, ter uma diretora, roteirista e produtora de importância é de grande valor. Sem contar que as temáticas recorrentes em seu filme são temáticas de todos nós: a busca pelo autoconhecimento, as relações interpessoais, a adaptação às circunstâncias, enfrentar dificuldades, solidão. Não são histórias sobre grandes acontecimentos, são histórias sobre nós mesmos e nossa vulnerabilidade.

2 comentários

  1. Amei! Sofia é uma mulher maravilhosa. Admiro tudo dessa mulher: dos seus delicados filmes á sua personalidade forte.

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